Marielle Franco? Presente!

Marielle Franco? Presente!

Imagem: Reprodução

Por Bruna Valentim

Marielle Francisco da Silva aos 36 anos foi a quinta vereadora mais votada na cidade do Rio de Janeiro na última eleição e tinha alcançado um lugar de fala onde era referência para milhares de mulheres com as mesmas lutas, vivências e ideais. Marielle era mulher negra, bissexual e periférica se fazendo presente em locais comumente negados a seus semelhantes. Se formou em sociologia pela PUC-RIO e defendia as minorias, os direitos humanos e não temia falar o que pensava ou lutar por justiça. Tinha fé em um mundo melhor e foco para fazer acontecer, em pouco mais de um ano integrando a câmara dos vereadores apresentou mais de 20 projetos de leis, que tinha como foco alcançar melhorias para as minorias supracitadas, e teve dois aprovados.

Na última quarta-feira, dia 14, porém, a vereadora teve sua vida interrompida de forma cruel ao ser alvejada com diversos tiros enquanto voltava para a casa, após sua participação no debate “Jovens Negras Movendo as Estruturas”, organizado pelo seu partido PSOL, realizado no espaço Casa das Pretas no bairro da Lapa na capital do Rio de Janeiro. No momento de seu assassinato, a vereadora estava acompanhada de seu motorista, Anderson Pedro Gomes de 39 anos e sua assessora, a única sobrevivente do ataque.

Enquanto Franco era alvo, Gomes, seu motorista, foi vítima do acaso. O condutor do veículo estava em sua última semana como funcionário de Marielle, com quem vinha trabalhando nos últimos dois meses cobrindo a licença de um amigo. Em breve Anderson iria começar um período de teste para mecânico de uma empresa de aviação e demonstrava empolgação pela nova carreira que almejava trilhar. Gomes acabou sendo atingido por 3 balas e não resistiu aos ferimentos, deixando assim a esposa Agatha e um filho, o pequeno Artur.

 Nos últimos dias a internet também tem sido tomada por homenagens a Marielle. Personalidades como Bruno Gagliasso e MV BILL, passando pelo colega de partido e amigo íntimo da vereadora, Marcelo Freixo, chegando a cantora americana Lauren Jauregui e a top model britânica Naomi Campbell, milhares de pessoas tem prestado suas condolências diante do ato de barbárie que vitimou Marielle e Anderson. No último domingo, em passagem pelo Brasil com a turnê “Witness” a cantora americana Katy Perry chamou ao palco a família de Marielle prestando uma emocionada homenagem a socióloga após cantar Unconditionally.

No exterior, países como Estados Unidos, Argentina, Inglaterra, Colômbia, Portugal e França ao também tiveram atos Convocados pelas comunidades brasileiras que moram no exterior, movimento negro e organizações de mulheres.

Por aqui, a indignação, a raiva, a tristeza e o luto fizeram milhares de brasileiros irem às ruas nos últimos dias pedindo justiça para Marielle, Anderson e tantas outras vidas tiradas sem o menor pudor e de maneira tão cruel. O povo clama por justiça com um desespero agudo, uma urgência de paz, uma sede por melhorias. As causas por qual Franco tanto lutava, hoje lutam bravamente por ela. Quem quer que esteja por trás de sua morte pode ter tido o objetivo de silencia-la, mas o senso de justiça do Brasil tem gritado cada vez mais alto desde o último dia 15. O país tem feito coro ao dizer que vidas negras importam e o legado de Marielle ainda vive.

Em Belo Horizonte, ocorreu na última quinta-feira na Praça da Estação, em Belo Horizonte, um ato contra o genocídio negro e em homenagem a Marielle e Anderson. O protesto contava com artistas, ativistas, estudantes e pessoas dos mais diversos movimentos sociais. Os servidores estaduais da Educação Integrantes da Central Única dos Trabalhadores (CUT) também participavam da mobilização.

Durante o ato que durou aproximadamente quatro horas pessoas de múltiplos grupos sociais fizeram discursos nos microfones com palavras de luto, pesar e resistência.  A estudante de jornalismo Laura Gomes de 19 anos, se emocionou ao ouvir declarações emocionadas das pessoas presentes “Foi como se fosse uma parte minha tivesse ido embora com ela. Com a morte dela eu senti medo, perdi alguém que era como eu e que tinha voz, que falava por mim, que me representava. Tenho sentido medo, repressão. Chorei aqui porque apesar de todos os sentimentos ruins eu senti que não estava sozinha. Eu sei que se eu cair vai ter uma irmã me ajudando a levantar. Hoje eu percebi que sentir medo vai ajudar na nossa vontade de lutar”.

A atriz Elisa Lucinda, que está em Belo Horizonte com o espetáculo L, abandonou os ensaios de sua peça para prestar uma homenagem a amiga de longa data Marielle “Vim prestar a minha homenagem a luta que era dela e que agora é nossa. Acredito que a união da esquerda é a nossa única possibilidade, que é no coletivo que a gente vai fazer a mudança no Brasil. Hoje eu estou em choque, estou de luto, estou com medo, mas por outro lado vemos o que essa moça tão jovem já fez, o impacto que a morte dela causou, essa manifestação mostra o quanto ela nos representava e isso não tem como ninguém destruir.” Questionada se acha que agora haverá um outro olhar das autoridades no Brasil para a questão do genocídio do povo negro, ela é sucinta “Bom, eu acho que agora não dá mais para disfarçar, o mundo inteiro, sabe que a gente mata negro. A todo momento minha esperança é posta à prova, mas eu sou danada, eu tenho muita reserva de esperança e acredito que a gente pode virar esse jogo”.

    Aos 71 anos, a pediatra aposentada, Mirtes Beirão também compareceu ao ato e relatou que não tinha como deixar de estar presente “Antigamente eu nunca poderia imaginar que hoje eu estaria aqui presente para lutar por causas como essa, mas é necessário. Estive nas ruas na época da ditadura e embora os motivos sejam diferentes eu sinto que preciso estar aqui. Marielle representava várias coisas que acredito e é por ela e pelo jovem negro, pelo pobre, que vamos continuar”.

O ato que teve início na Praça da Estação seguiu em passeata de forma pacífica e com a supervisão da polícia militar até a Praça Sete com cartazes, rostos pintados muita emoção e clamores. Em dado momento o bloco musical Maracatu deu início a um canto logo interrompido com protestos dos populares presentes afirmando que o movimento não era bloco de carnaval. Aproximadamente às 20:30 horas o trânsito na região já havia sido liberado pela BH trans.

Na próxima quarta-feira, dia 21/03, um novo movimento está sendo organizado por diversos coletivos sociais de Belo Horizonte, o Ato Preto: Nossa Luta Ninguém (a)tira!, novamente contará com o povo na ruas pedindo por dignidade, pelo direito à cidade, pela população negra. O evento acontecerá na Praça Sete de Setembro no centro de Belo Horizonte. A data escolhida é o dia internacional na luta contra discriminação racial, causa que Marielle tanto lutava.

Afinal o que temos visto após a morte de Marielle é uma comoção pouco vista por aqui. Podemos chamar de reciprocidade, podemos chamar de retorno. Ela moveu montanhas, quebrou paradigmas e sempre fez muito por aqueles que atravessaram seu caminho. Em resumo, a solidariedade que vêm recebendo nada mais é do que o amor que ela tinha pelo próximo voltando para ela. Marielle se foi deixando uma esposa, uma filha, muitos sonhos, mas seu legado se manterá presente, hoje e sempre.

  ATENÇÃO

Acusações questionando a integridade da vereadora estão sendo constantemente propagadas na última semana em diversas redes sociais. Como veículo de informação, o Jornal Contramão se sente no direito de informar que publicar e compartilhar conteúdos contendo inverdades e informações sem precedências legitimadas constitui em crime contra a honra de Franco. Dizer que a vereadora “foi eleita pelo Comando Vermelho” é imputação de fato falso e criminoso. O art. 138, #2o do Código Penal tipifica a calúnia contra os mortos. Os familiares podem demandar criminalmente e civilmente. Caberá aos autores das publicações provar o que afirmam. Uma equipe jurídica está a postos rastreando o compartilhamento dessas notícias falsas para tomar medidas jurídicas cabíveis.

 

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