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Com dois dias de evento, confira os destaques desta edição de 2023 

Por Keven Souza

Diversos fatores influenciam a credibilidade de um festival: a pluralidade no line-up, a diversidade do público, a qualidade na estrutura física e até a logística. O Festival Sensacional, que foi realizado neste último fim de semana, entre os dias 23 e 24 de junho, conseguiu cumprir todos os requisitos. Foram cerca de 21 atrações e 4 palcos que agitaram Belo Horizonte, nos mais de 30 hectares de área verde do Parque Ecológico da Pampulha. 

Noite de abertura

Em sua décima edição, o festival funcionou em um formato inédito, acontecendo em dois dias seguidos. Na sexta-feira (23), ocorreu a noite o show de abertura com a turnê “Nós, a gente”, de Gilberto Gil e família. 

A apresentação foi de encher os olhos. Transmitiu a defesa da liberdade, da igualdade e da justiça social para um mar de pessoas que ali estavam para prestigiar a carreira de Gil, que ainda homenageou Rita Lee com a clássica “Ovelha Negra”.  Ali, pelos gramados do parque, o show contou com banda formada exclusivamente pelos netos e filhos do artista, como a cantora Preta Gil. 

Arte, cultura e música a céu aberto 

No dia seguinte, sábado (24), o line-up contava com Gloria Groove, Marina Sena, Fundo de Quintal, Flora Matos, Mc Tha, Masterplano, entre outros artistas. 

No palco Chacoalha, Mc Tha trouxe suas raízes e religião para sua apresentação. A cantora, que é de Tiradentes/MG, mostrou que, além das músicas e da performance, um de seus maiores trunfos são seus fãs, que lotaram o espaço e cantaram fervorosamente seus sucessos. 

Ao entardecer, Fundo de Quintal mostrou a força que é o samba brasileiro. O grupo carioca cantou seus maiores hits, como “Trem das Onze” e “Amar é Bom”. Logo após, o clima esquentou no Festival Sensacional. 

Gloria Groove misturou funk, pop e pagode em um único show no palco Sensacional, com participação especial de Valesca Popozuda. Isso com muitas luzes, danças e figurinos. Durante a apresentação, a drag queen ainda relembrou as vezes que visitou a capital mineira e deixou claro: “Amo esta cidade”, disse Glória.  

Mais tarde, foi a vez de Marina Sena subir ao palco para encerrar a edição de 2023 do Sensacional. A mineira de Taiobeiras retornou a Belo Horizonte para apresentar sua turnê e seu novo álbum “Vício Inerente”, e cantou ainda um compilado de sucessos do seu primeiro álbum solo, “De Primeira”. 

Marina Sena durante seu show. Foto: Amanda Serafim.

Seus fãs vibravam, emocionados, lotando o gramado do Parque Ecológico da Pampulha. Lucas Fernandes, que estava presente no festival, afirma que a cantora, apesar de ter poucos anos de carreira, já é um sucesso. “Marina Sena é a nossa diva mineira”, pontua.

Era nítido a entrega de Marina no palco do Festival Sensacional, a felicidade e a qualidade do show nessa volta para a antiga casa, chamada de Belo Horizonte. 

Marina Sena. Foto: Amanda Serafim.
Sensacional é realmente sensacional 

O Sensacional é um festival que se diferencia de outros da cidade por não ter nenhum tipo de setorização. “O Sensa nasceu na rua e foi realizado durante vários anos em um formato sem grades nem ingressos, com todo o público ocupando os mesmos espaços. Faz parte dos nossos valores e vamos seguir lutando para que todes presentes possam ter acesso à mesma experiência”, afirma Mari Campos, diretora do festival.

*divulgação

A banda “Projeto Manacá” está pronta para o lançamento de seu aguardado EP intitulado “Nascente”, em um show exclusivo no Conservatório da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). O evento, acontecerá na quinta-feira, dia 29 de junho, a partir das 19h30, aberto ao público e a entrada é gratuita.

O Projeto Manacá, formado em 2019 por artistas comprometidos com a expressão e conexão de ideias por meio da música, traz em seu repertório referências às raízes da música popular brasileira. O grupo, composto por Thais Godinho, Bê Meireles, Márcio Badu e Calvin Badu, busca explorar ritmos que vão desde o samba e a música mineira até expressões contemporâneas do jazz e da música experimental.

Thais, Márcio, Bernardo e Calvin (da direita para a esquerda). Foto: Gui Guimarães/divulgação

Apesar de terem enfrentado o desafio da pandemia da COVID-19, o Projeto encontrou oportunidades para crescer e aprimorar seu trabalho. Durante o período de isolamento social, dedicaram-se à concepção e gravação do EP “Nascente” no Estúdio Vale Encantado, em Santa Luzia/MG.

Com a flexibilização das restrições, o grupo retomou suas apresentações, participando de eventos como a Feira da Tina, Sarau Multicultural da Academia Luziense de Letras e Artes, Domingo no Campus da UFMG, além de se apresentarem em bares e festas privadas de Belo Horizonte.

“Nascente” representa o início desse fluxo musical e simboliza um encontro de águas. O EP, que será lançado neste mês de junho nas plataformas digitais, apresenta seis faixas que capturam a essência da banda. Cada música leva os ouvintes em uma jornada sonora única, transitando entre arranjos intimistas e momentos de energia e entrega.

 

Venha participar do lançamento e curtir o show!

Mais informações acesse o Instagram da banda.

Serviço 

Show de lançamento do EP na UFMG 

Data: 29 de junho de 2023

Horário: ás 19h30

Local: Conservatório UFMG – Av. Afonso Pena, 1534, Centro – Belo Horizonte, Minas Gerais.

O evento terá programação gratuita com trabalhos artesanais e muita gastronomia feita pelos próprios estudantes da Una

Por Keven Souza

A primeira edição do Mistureba terá início amanhã (01), entre 18h e 21h, no campus Liberdade da Cidade Universitária Una. A feira é organizada por alunos de Relações Públicas, através da Unidade Curricular de Planejamento de Eventos, e tem como objetivo divulgar pequenas marcas e empreendimentos universitários que o próprio campus abriga. 

Tudo isso, acontecerá na charmosa área de convivência do Liberdade, a Laje. O espaço externo promete ser um reduto cultural que reunirá peças de arte, bazar, brechó, vendas no local de comida, além de flash tattoos e muita música com presença de DJs. 

Será o momento ideal para conhecer novas pessoas, trocar networking, compartilhar experiências e, claro, apoiar o empreendimento local. É o que explica Sarah Brás, curadora do evento e aluna de Relações Públicas. “O campus Liberdade une vários estilos de vida e pessoas, e o nosso evento contribuirá para que esta miscigenação cultural seja exaltada e continue existindo em nosso meio. Claro, é um evento novo, mas desde já se faz fundamental, pois os artistas poderão apresentar seus trabalhos e arrecadarem fundos para suas artes. Esperamos que o público se divirta e se misture, de fato, com o que estaremos oferecendo”, pontua.

Cartaz de divulgação. Foto: acervo pessoal.
Serviço 

Mistureba – Feira Universitária 

Data: 1 de junho de 2023

Horário: das 18h às 21h

Local: Una Liberdade – R. da Bahia, 1764, Lourdes, BH.

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Capacitismo no ambiente acadêmico dificulta relacionamentos, aprendizados e vivências de pessoas com deficiência 

Por Milena Vieira

Ativista feminista, mestranda no programa de pós-graduação em Comunicação Social da UFMG e criadora do blog “Disbuga”, Fatine Oliveira tem distrofia muscular e é cadeirante desde os oito anos. Trata-se, hoje, de importante voz sobre a experiência da mulher com deficiência, assim como em relação às atitudes e aos comportamentos preconceituosos dentro e fora do ambiente escolar. Ao longo dos anos, houve momentos em que Fatine foi infantilizada, submetida a olhares curiosos e a excessos de elogios, por fazer atividades normais ou impedida de participar de exercícios coletivos por não serem aptos às suas necessidades. 

À forma de Fatine, milhões de brasileiros lidam, todos os dias, com situações capacitistas. O capacitismo pode ser definido como toda forma de discriminação contra as pessoas com qualquer tipo de necessidade especial, seja ela física, seja auditiva, visual, mental e/ou múltipla. Tal comportamento nasce de um sistema excludente, opressivo e preconceituoso, no qual se enxerga a diferença como tradução de indivíduos incapazes de pensar por si mesmos e de atuar em sociedade. Revela-se no cotidiano, sobretudo nos meios acadêmico e profissional, por vezes inconscientemente, como em falas ou atitudes que expõem sentimentos de pena, proteção excessiva e/ou inferioridade, o que afeta violentamente a vida desses cidadãos.

Em uma sociedade, tudo que está fora ao que é posto como “padrão normal” pode sofrer preconceito e discriminação. Pessoas que não aderem às “normas” costumam ser invisibilizadas, marginalizadas e pouco aceitas nos espaços sociais, seja de maneira óbvia e transparente, seja de forma velada e não explícita.

No ambiente acadêmico, onde muitos indivíduos passam grande parte de seu tempo, as pessoas aprendem, ensinam, trocam experiências, constroem laços e memórias, além de lidar com as diferenças. Para que isso aconteça, é preciso que tal espaço seja inclusivo e acessível a todos. 

Segundo Welder Rodrigo Vicente, líder do Núcleo de Apoio Psicopedagógico e Inclusão (NAPI) do Centro Universitário UNA, é determinado por lei que escolas e universidades tenham adaptações em seus ambientes, o que inclui materiais e metodologias, para que atendam às pessoas com deficiência (PCDs), tanto alunos quanto professores e funcionários.

“O NAPI foi pensado, inicialmente, para atender uma demanda de inclusão, a partir do movimento dos alunos com deficiência, principalmente auditiva, realizado no final de 2010, de forma mais intensa. A partir da necessidade do estudante surdo, viemos a olhar para outras necessidades. Se tenho 50 alunos com algum tipo de deficiência, tenho que atender aos 50; se não, não estarei incluindo”, destaca. 

De acordo com estudo feito pela plataforma QEdu, a partir de dados do Censo Escolar 2016, apenas 26% das escolas públicas e 35% das instituições particulares estão aptas, nas cidades brasileiras, à criação de ferramentas de inclusão e acesso, para que as pessoas possam ter um ensino de boa qualidade. 

Já para falar sobre processos inclusivos nas universidades, é preciso, antes, levar em consideração a desigualdade social, fruto do sistema capitalista e da falta de investimento nas áreas sociais, culturais, de saúde e educação. 

Fatine Oliveira, por exemplo, foi uma jovem estudante de baixa renda, e ressalta a importância de discutir o assunto: “Não posso, simplesmente, virar e falar que tive acesso, ou não tive. Quero que entendam que a deficiência não é o pior. Vários outros tópicos da questão social também são ruins. Não consegui entrar na faculdade por falta de acesso. A maioria das pessoas com deficiência pertence a classes baixas, o que interfere mais ainda em sua vivência. Muitas pessoas não conseguem ver a dificuldade estruturada na sociedade. É muito complicado não ter esse apoio político do governo” 

Além de todas as complicações para ingressar no meio escolar, as pessoas com deficiência são, por vezes, expostas a expressões capacitistas de todos os tipos, dos velados aos ostensivos. Uma das vertentes do capacitismo no ambiente escolar diz respeito ao momento em que as pessoas olham para aquelas com algum tipo de deficiência, enxergando-as como “coitadas”, “vulneráveis” ou “inocentes”.

No caso de crianças, aliás, todas são inocentes, e não só quando têm deficiência; no caso de jovens e adultos, eles acabam infantilizados. Deve-se pontuar que o capacitismo não acontece somente em situações ligadas ao corpo físico. Pessoas com deficiências não visíveis também são questionadas quanto à capacidade e à inteligência.

“Em minha vida acadêmica, só me incomodavam as pessoas que olhavam para mim fixamente. Às vezes, riam de mim e tiravam sarro, criticavam. A gente tem que passar por cima, mas havia coisas de que não gostava, mesmo. Eu ignorava, deixava para lá, pois tem coisas que precisamos superar”, conta Letícia Diniz, 22 anos, que tem Síndrome de Down e é estudante de Jornalismo no Centro Universitário UNA.

É possível que, em algum momento, qualquer um tenha presenciado ou feito declarações capacitistas. Frases do tipo “Dar uma de João sem braço”, “Você só pode ser retardado!”, “Está mais perdido do que cego em tiroteio”, dentre outras, são naturalmente usadas no dia a dia, sem que se considere o quanto reforçam a imagem da pessoa com deficiência como incapaz.

Outro gesto capacitista é tomar como superação os feitos de sucesso, esforços e conquistas realizadas por PCDs, a exemplo de frases como “Eu reclamando da vida e olha você aí, vivendo, apesar de tudo”, “Ela é tão inteligente, nem parece ser especial”, “Te acho tão guerreira por chegar até aqui”. A deficiência, porém, não impede a pessoa de alcançar seus objetivos. Exemplo disso são os Jogos Paraolímpicos, um dos maiores eventos esportivos do mundo a envolver PCDs, que mostram que qualquer indivíduo é capaz de descobrir (e superar) novos limites.

Em palestra sobre capacitismo, realizada na plataforma do YouTube, no canal TV FEC SC, Federação Espírita Catarinense, o pedagogo Eduardo Torto Meneghelli, mestre em educação, conta que, na Antiguidade, acreditava-se que os indivíduos que nasciam com alguma necessidade não agradavam aos deuses e não tinham alma. A deficiência era vista como castigo, e muitos acabavam abandonados, ou mortos, pelas próprias famílias.

Tal violência não acabou com o passar do tempo. No Brasil, em meio à pandemia, registrou-se crescimento de ataques contra pessoas com deficiência, sendo a maior parte vítima de familiares e conhecidos. Segundo Cleyton Borges, supervisor do Centro de Apoio Técnico da Delegacia de Polícia da Pessoa com Deficiência em São Paulo, o isolamento fez com que tais pessoas ficassem mais expostas. Ele reforça a necessidade de conscientização da população quanto às denúncias, que podem ser feitas, de qualquer parte do país, pelo Disque 100.

Discutir o capacitismo não é somente um dever das pessoas especiais. A conscientização é popular. Para cortar as raízes estruturais do preconceito, é necessário que todos estejam dispostos a se pôr em posição de escuta e aprendizado. Além disso, é vital cobrar do Estado a garantia dos direitos humanos, para que, então, seja construída uma sociedade em que todas as pessoas consigam viver dignamente. “Um caminho para aprender mais sobre as diferenças seria assumir uma postura de abertura, em que o olhar superasse os limites do conhecido e alcançasse a potência de novos aprendizados, que só o outro pode oferecer”, destaca Fatine Oliveira. 

Manifestação pelo direito das pessoas com deficiência em 2013, na cidade de São Paulo (foto: Danilo Verpa/Folha S.Paulo)

 

 

 

 

 

 

 

Conscientização nas redes

Desde o início da pandemia, nota-se crescimento de conteúdos produzidos nas redes sociais, em apps como TikTok e Instagram. Em consequência do isolamento social, o número de visualizações e engajamento tem tido aumento relevante, se comparado aos anos anteriores. Mais do que apenas conteúdos, alguns influenciadores têm conseguido abordar assuntos delicados e importantes por meio do humor.

É o caso da influenciadora digital e psicóloga Lorrane Silva, mais conhecida como “Pequena Lô”, diagnosticada com displasia óssea. Ela tem quase 10 milhões de seguidores em suas redes sociais, e, em vídeos humorísticos, aponta os problemas sociais enfrentados por pessoas com deficiência. Além de se divertirem, as pessoas acabam conscientizadas com o conteúdo. 

“O preconceito ainda está longe de acabar. Muitas pessoas têm um pensamento muito fechado. Estou na internet para mudar essa visão em relação a nós, pessoas com deficiência. Quando comecei, impactou muito. Uma pessoa com deficiência, que dança, faz humor, formada em psicologia, não é todo dia que a gente vê. As pessoas com deficiência não ficam reunidas em um só lugar, mas, hoje, conheço muitas que estão na internet, pondo a cara à tapa para apresentar essas informações”. 

Origem do “capacitismo”

A palavra capacitismo é a tradução do inglês “ableism”, que, em português, significa “capaz”. Segundo a BBC, o termo foi usado, pela primeira vez, nos Estados Unidos, na década de 1980, e era mais conhecido dentro de organizações políticas pelo direito à igualdade. No Brasil, apesar de também existirem movimentos ativistas de pessoas com deficiência pela reivindicação de seus direitos, desde os anos 1980, o termo se popularizou em 2016, quando um grupo de jovens com deficiência se reuniu nas redes sociais e criou a hashtag #ÉCapacitismoQuando, com o objetivo de ampliar a discussão sobre a discriminação contra pessoas com deficiência. É importante que exista a denominação do preconceito, para que ele seja exposto e confrontado. 

Nas telas

Confira dicas de filmes e seriados que retratam a vivência de pessoas com deficiência e os efeitos de uma sociedade capacitista 

The Good Doctor (O bom doutor)

A série tem como protagonista Shaun Murphy, jovem autista formado em medicina, que sonha em ser cirurgião e tem suas habilidades questionadas e postas à prova o tempo todo, por colegas e superiores, após começar a trabalhar em um hospital famoso.

Extraordinário
O filme narra a história de Auggie Pullman, garoto de 10 anos, que nasceu com uma deformidade genética no rosto e precisou passar por 27 cirurgias plásticas. Com o apoio da família, Auggie começa a frequentar a escola pela primeira vez. 

Hoje eu quero voltar sozinho

Um romance brasileiro. Conta a vida de Leonardo, jovem estudante do ensino médio com deficiência visual. Aborda os desafios para a inclusão e os questionamentos sobre a própria sexualidade, após o protagonista conhecer Gabriel, novo aluno da escola. 

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Por Keven Souza

A dança sempre esteve presente em todos os momentos da história da humanidade, como amiga do ser humano, desempenha papel importante na construção de várias culturas. Essa arte carrega a liberdade de se expressar, o poder de imaginar e a vontade de transformar o mundo. 

Essa responsabilidade conduzida pela dança tem sido precursora no desenvolvimento em todas as esferas da sociedade. Na Cultura Ballroom, esse princípio não é diferente. Em meio a resistência, glamour e movimentos, nasce uma comunidade que gira em torno de arte, um lugar onde ser diferente é permitido e se torna refúgio para aqueles que precisam de acolhimento.

Em conversa com o jornalista, dançarino e participante assíduo da Cultura Ballroom, Dante Alves, 26 anos, o Contramão abordou os aspectos e a importância que fazem desse movimento um ato social, político e histórico. Além disso, trazemos em detalhes como tem sido a cena ballroom no panorama de Belo Horizonte. Confira a entrevista! 

Dante Alves – Arquivo pessoal

Dante, o que seria a Cultura Ballroom para quem não conhece? 

A Ballroom é uma cultura que nasceu nos EUA em meados dos anos 70, ela surge em paralelo aos bailes drag daquela época e em um contexto social em que a população LGBTQIA+ sofria uma repressão horrivel, mas principalmente o recorte de travestis negras e latinas, que dentro da comunidade sofria com o racismo. Ela nasce a partir de suas próprias competições nos bailes, evoluindo e se criando em categorias que variam entre estética, dança, realidade, entre outras diversas. 

A Ballroom é extremamente importante, porque ela é feita por e para as travestis negras e latinas e acima de qualquer coisa, ela celebra os corpos marginalizados que estão dentro da comunidade LGBTQIA+, que por muito tempo, e até hoje, sofre de uma higienização e embranquecimento quando é representada no mainstream. Essa cultura é muito mais do que um baile e uma festa, é sobre resistência.

Qual é o estilo de dança dentro dessa cultura? 

A dança dentro da Ballroom é muito forte e diz muito sobre a liberdade. Ela é bem específica, pegando elementos de vários outros tipos de dança e, literalmente, não é necessário você ser o padrão de dançarino para se divertir dançando vogue. Essa autonomia que a ballroom permite é sensacional, pois abre um espaço de liberdade para você ser quem você realmente é.

Particularmente, eu sempre fui uma pessoa que ama dançar, desde criança nos churrascos de família ou fazendo as coreografias no meu quarto assistindo clipes na TV. A dança sempre foi um momento de diversão, de me conectar com a música e de me sentir bem com meu corpo.

Lembro que comecei a dançar na ballroom em 2017, mas já participava da comunidade como espectador desde 2014, neste ambiente me sinto confortável para dançar e me expressar. Como uma pessoa gorda, dançar pra mim é isso, liberdade! 

Normalmente, as pessoas tendem a confundir a Ballroom com a Dança Vogue, por serem estilos de danças marcados por poses e movimentos expressivos. Há diferença entre as duas? Por que as pessoas as confundem?

O Vogue é apenas uma parte da Ballroom, um estilo que nasce da dança de rua inspirada nas poses das modelos da revista Vogue. As pessoas se confundem principalmente pelo vogue ter saído da ‘bolha’ e isso se deve muito a Madonna nos anos 90 que levou a dança ao mainstream, onde as músicas são feitas para a massa. 

Há uma problemática com essa questão, é muito visto a apropriação da dança sem respeitar e ao menos saber da história da comunidade que há por trás, principalmente por pessoas brancas e não lgbts. O Vogue é muito mais que uma dança pra quem faz parte da ballroom e a ballroom é, definitivamente, muito mais do que o Vogue. 

Você é bastante atuante no cenário Ballroom aqui de BH, como funciona este estilo de dança aqui na capital? Possuem espaço ou ainda existe preconceito? 

Geralmente ocupamos espaços públicos, como o CRJ por exemplo, e acho que por mais que tenham pessoas preconceituosas e que não entendem o que está acontecendo ali, a gente se protege bem e sabemos onde vamos ser bem recebidos.

A cidade tem abraçado projetos, ideias e os eventos desse nicho?

Não acho que o governo de Belo Horizonte seja o maior exemplo de apoiar projetos desse tipo, mas a comunidade se movimenta bastante para conseguir alguns projetos e coisas desse nicho. Falando em questão de público, as balls estão sendo sempre muito bem recebidas, principalmente com o sucesso que a ballroom voltou a fazer com os programas de tv e etc. Então depende do ponto de vista.

Dentro da Ballroom existem as Houses, que são espaços que representam o acolhimento e vão além de um local físico. Qual a importância delas para a comunidade LGBTQIA +?

As houses são como nossas famílias dentro da ballroom, como se fossem nosso “time” nas competições. Mas para além disso, são grupos que se apoiam e que têm um sentimento familiar, tem toda uma estrutura de mother, father, princess e etc, e são criadas através das conexões de seus membros. 

Antigamente as houses poderiam até serem físicas, onde as mães e pais acolhiam aqueles que não tinham onde morar, especialmente aqueles em que os pais não aceitavam ser da comunidade e colocavam para fora de casa. Mas, no contexto atual da ballroom é algo mais abstrato do que físico, são “espaços” que representam o acolhimento. 

É a partir das houses que acontecem as competições, as disputas de danças, os desfiles. De que modo são organizados esses eventos?  

Os eventos são chamados de balls, que em tradução significa bailes, esses balls são organizados geralmente por uma house ou pessoas de maior movimentação. Normalmente, existe um painel de jurados que são pessoas influentes e importantes na ballroom, um MC que organiza as batalhas e se comunicam com o público, um chanter que é uma pessoa que faz o chant – que é como se fosse uma ‘letra’ que dita a batalha –  e claro um DJ para soltar os beats. 

Cada categoria é aberta e todos que querem competir ganham os tens (aprovação) ou o chop (eliminação). Essa etapa acontece antes de começar as batalhas, onde você se apresenta para os jurados e a partir disso, se eles acham que você está apto a participar dessa categoria, você ganha os tens, mas se algum deles acharem que você não está e te dá um chop, você está fora, não passa para a fase das batalhas. Isso tudo faz parte dos eventos.  

Hoje, você faz parte de uma dessas casas, o que ela representa para você? 

Sou membro da House of Barracuda, uma casa que foi e é muito importante para meu crescimento dentro da ballroom, além do meu desenvolvimento pessoal. Estou na Barracuda desde a sua fundação, onde surgiu a partir de um sentimento das mother’s, o Trio Lipstick, de transformar aquele grupo que estava muito unido em uma família. Elas reuniram todos nós e expuseram a vontade de construir uma house, e de uma forma bem colaborativa a Barracuda surgiu.

Hoje, temos diferentes membros, onde cada um compartilha suas experiências e apoia um ao outro. É como uma família mesmo! Quando estamos juntos, seja em um almoço, treino ou na ball gritando e apoiando, me sinto livre para ser eu mesmo. 

Por fim, qual dica você daria para quem não conhece o cenário de dança LGBTQIA + de BH, especificamente a Ballroom, mas tem curiosidade de participar dos eventos? Qual seria o lugar ideal de procurar para quem se interessa?

Uma frase muito dita na Ballroom é “procurem saber”. Procurem saber da história, da importância, da necessidade dessa comunidade. Busque entender quem começou, de como surgiu. A história é muito importante para a Ballroom, então antes de começar a se jogar na dança, minha dica seria estudar sobre. Tem ‘Paris is Burning’ para ver na internet, além de diversas páginas no instagram que se propõem a serem didáticos para quem está interessado. 

Hoje, as lideranças da ballroom também estão dispostas a ensinar e acolher, então se aproxime das pessoas e estude! Isso é legal para um primeiro passo. E para quem tem vontade de frequentar, o CRJ é um lugar onde a gente sempre está se encontrando e tendo treinos abertos, que estão voltando aos poucos devido a pandemia, mas na pagina @mgballroom é dito todas as movimentações da cena mineira, balls, treinos e etc, então ao seguir a página você vai saber onde estamos. 

 

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Por Keven Souza

Nas redes sociais é quase improvável você rolar o feed do Instagram ou visualizar os vídeos do Tik Tok sem ao menos perceber que tanto as mulheres, quanto os homens estão usando a nova tendência do momento. A nail art é uma técnica que prioriza pintar as unhas de forma elaborada e criativa, e que podemos encontrá-la desde os salões de beleza no gueto ou até mesmo nos espaços da alta sociedade. A moda, que é queridinha de muitas pessoas, alcançou seu pico de sucesso na era digital e veio com o objetivo de apostar em unhas divertidas que possam ser usadas para agregar valor ao look. 

No Met Gala de 2019, evento tradicional que reúne diversos famosos internacionais, a nail art foi consagrada e apresentada ao mundo como uma nova tendência do universo masculino, e naquela noite, concedeu holofotes no red carpet a diversas celebridades. O ex- One Direction, Harry Styles, foi um dos anfitriões do evento que se tornou o assunto mais comentado entre as revistas de moda pelo sucesso das unhas pintadas em preto e verde. Entretanto, não darei o prazer, novamente, aos homens héteros de levarem os créditos de serem pioneiros em uma prática que não é de hoje que existe.

O ego masculino faz com que, até hoje, os homens sejam como uma “estrela” inapagável do centro da sociedade, com o reflexo hipócrita de que mesmo com a evolução de debates sobre apropriação cultural, identidade de gênero e igualdade social, a liberdade de se expressar sem ao menos serem julgados é um privilégio restrito somente à eles. 

Talvez seja doloroso aceitar que quando um homem branco e heteronormativo, se apropria de algo, seja uma tendência ou uma causa social, logo em seguida ela se torna relevante e é pautada em diversos veículos de comunicação. 

E, por incrível que pareça, a moda vai muito além do que dispor de uma tendência, é por si só um sistema que acompanha o comportamento humano e que ao longo do tempo desempenha um papel imprescindível na vida das pessoas. É em torno dela que as roupas e as tendências carregam significados sociais, econômicos e culturais, que nos dizem quem somos e de onde viemos, sendo significativa no que se refere a nos comunicarmos, e a nos expressarmos mediante ao que usamos.  

Para nós da comunidade lgbtqia +, usar esmalte não é só mais uma tendência passageira que grandes celebridades usam e usufrui quando querem. É uma vivência, uma prática cotidiana que faz parte da construção da identidade de diversas pessoas e que existe muito antes da nail art chegar ao red carpet como um momento estético e eufórico.  

Um dos exemplos de que pintar as unhas não é uma pauta atual, temos o ator, cantor e supermodelo, RuPaul Andre Charles, que desde os anos 90 nos EUA comanda o seu programa “RuPaul ‘s Drag Race” montada de drag queen com roupas, cabelos e unhas do universo feminino. 

Na comunidade, ele é celebrado como um ícone da arte drag que atua no audiovisual (televisão) sendo homem, gay, e afeminado, que não se compara com o Harry Styles, Bad Bunny ou Zac Efron que se apropriam de uma estética efêmera para estarem em alta na sociedade. RuPaul é a prova de que há muito tempo a nail art existe, e que os LGBTs afeminados lutam para fazerem parte do palco principal e se expressarem como seres humanos livres de rótulos, mas que em suma são ofuscados e esquecidos pela mídia. 

No Brasil, a realidade é pior, celebridades como Gui Araujo, Leo Picon e Lucas Jagger, são alguns dos homens que na maior parte das vezes fazem sucesso nas redes sociais exibindo as unhas coloridas e divertidas, aplaudidos pelo uso da técnica e aceitos por um grande número de  pessoas.

Eu diria que as transexuais e as travestis que pintam as unhas, fazem o cabelo e assumem a sua identidade, não têm a mesma sorte, já que ultrapassam até mesmo os gays em números de mortes violentas no Brasil. Esse dado é do Relatório Anual de Mortes Violentas de LGBT no país, realizado pelo o Grupo Gay da Bahia (GGB), que nos diz que só no ano de 2020, 161 travestis e trans foram vítimas da transfobia e 237 pessoas da comunidade morreram de forma violenta por serem quem são.

O cenário é super cruel e me faz pensar, o que falta para sermos considerados pautas relevantes, e sobretudo, o quanto os holofotes permanecem voltados somente aos homens héteros com estereótipo padrão. Até quando iremos aceitar que, o que os homens heteronormativos fazem é normal, bonito e relevante, e o que produzimos não é plausível suficiente ao ponto de sermos lembrados de um movimento na qual fazemos parte há décadas? Até onde é possível romantizar o ato de usar esmalte em aspecto divertido e bonito, para alguns e para outros que exercem a prática como parte da sua identidade, o resultado ser a morte? 

 

Edição: Daniela Reis