Crônica

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Por Luiz Felipe Jerônimo

Era uma vez uma menina chamada Maria Cecília, que vivia no interior de Minas Gerais, numa cidade tão pequena que tinha mais galinhas do que seres humanos. Desde pequena, Cissa – apelido de Maria Cecília – sonhava em ser jornalista, para levar as notícias do mundo para sua cidadezinha.

Maria Cecília. Foto: Ingrid Vidotti.

Com o passar dos anos, o sonho de Cissa se tornava cada vez mais forte. Ela sabia que precisava ir além das notícias do jornal local e ir em rumo à capital, Belo Horizonte, onde a magia das grandes reportagens acontecia. Empacotou seus sonhos em uma mala e partiu em busca de seu futuro promissor.

Chegando à capital, ela se encantou com a imensidão dos prédios e a agitação das ruas. Tudo era novo e empolgante. Ela se matriculou em uma universidade e mergulhou de cabeça nos estudos, louca para aprender tudo sobre seu amado jornalismo.

Mas, como nem tudo são flores, Cissa logo descobriu que a vida na capital tinha seus desafios. O sotaque carregado do interior atraía olhares curiosos e, às vezes,  comentários cômicos. Cissa decidiu levar tudo na esportiva e passou a usar seu jeito “mineirês” para arrancar risadas dos colegas.

Logo no primeiro dia de aula, ela chamou atenção ao responder uma pergunta do professor. “Uai, sô, eu sô de lá do interior, uai. Aqui é tudo muito grande e corrido demais pra nóis. Mas tamo aqui pra aprendê, né!?” As risadas se fizeram presentes na sala de aula, e Cissa percebeu que seu jeito divertido poderia conquistar as pessoas. Ela se tornou a “mineirinha do jornalismo”, com suas expressões engraçadas e histórias divertidas da vida no interior.

Durante os anos de faculdade, Cissa se dedicou ao máximo, estudando, fazendo estágios e escrevendo matérias que chamavam atenção. Ela se destacou, não apenas por sua personalidade contagiante, mas também por sua habilidade de contar histórias com paixão.

Quando chegou o tão esperado dia da formatura, ela estava radiante. Ela tinha conquistado seu diploma e estava pronta para encarar o mundo jornalístico. Com seu sotaque e suas histórias mirabolantes, Cissa se tornou uma personalidade querida por todos os lugares onde passava.

E assim, a menina do interior de Minas Gerais, com seu jeito peculiar e engraçado, conquistou o coração de todos, realizando seu sonho de ser jornalista. Cissa mostrou que não importa de onde você vem, o importante é acreditar em si e levar um pouquinho de alegria para o mundo.

Maria Cecília conseguiu um emprego como repórter na maior emissora de Minas Gerais, mesmo com sua personalidade formada no interior. Cissa agora subiu mais um degrau na escada de seu sonho, provando que não é necessário deixar de lado os ensinamentos absorvidos em São Gonçalo do Rio Abaixo.

Foto: Maria Cecília Nepomuceno.

E assim, encerro essa crônica com a certeza de que Cissa, a “mineirinha do jornalismo”, continuará espalhando seu jeito divertido e encantador, trazendo sorrisos por onde passa, e nos lembrando que a vida pode ser muito mais leve quando temos um toque de humor nas nossas histórias.

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Por Júlia Garcia

Era um domingo de Páscoa. A menina esperava ganhar muitos ovos e chocolates. Além das guloseimas, um almoço especial era desejado por ela. Mas, ao contrário de seus desejos, a garota recebeu bolas. Isso mesmo, bolas! Mas, como assim? Bolas de chocolate como aquelas que ela adorava na infância? Não! Bolas em que os jogadores chutavam nos estádios espalhados pelo mundo. 

Primeiro jogo era um clássico de seu estado. Ela torcia por algum time? Não. Mas decidiu assistir para secar seu rival. Infelizmente seu secador estava com defeito e por isso, trocou de canal e foi assistir outro clássico, este que era de seu estado favorito. FlaxFlu, um clássico digno de pipoca e cerveja. Até mesmo chocolate, que poderia casar com o domingo pascoal. Mas, não havia restado nem a casquinha da barra em que tinha comido logo cedo.

Opa, e o clássico carioca? Voltando nele! Primeiro tempo, dois gols do Fluminense. Aguardava ansiosamente o segundo para saber se dessa vez, um time querido iria ganhar. E não é que deu certo? Fluminense bicampeão carioca. Venceu por 4×1! Mas e o chocolate, será que ela ganhou mais algum?

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Por Eduarda Boaventura

Aos 7 a menina ficava na frente da televisão vendo o DVD do show da sua ícone. Enquanto Shakira performava hips don’t lie, a menina dançava sonhando em ser ela. Aos 10, viu uma reportagem sobre uma garota que fez várias cirurgias plásticas para ficar igual a Barbie e contou para a família inteira que ia tirar uma costela para ficar com a cintura fina igual a boneca e a cantora. 

Cantora Shakira. Foto: ADN Rádio/divulgação.

Ainda aos 10, sua mãe levou ao cabeleireiro e as duas foram persuadidas a fazer progressiva e assim ter o cabelo liso, sendo mais fácil de cuidar, de acordo com a profissional. Nesta mesma época, o cabelo estava estranho, vivia com ele preso e se comparando às meninas da sala. Mas continuava ouvindo a cabeleireira e de 3 em 3 meses passa no cabelo um produto que fazia seus olhos arderem. Sua tia elogiou o cabelo, disse que o outro dava a impressão de mal cuidado, selvagem, agora a menina ficava linda e delicada. Essa mesma tia começou a fazer comentários sempre que visitava a sobrinha. “Está engordando” disse uma vez “se cuida enquanto ainda é nova porque depois fica mais difícil perder essa barriga”. 

No seu aniversário de 13 anos, a tia perguntou para sua mãe, na sua frente, se não ia olhar uma academia. A menina começou a fazer natação na semana seguinte. Um dia qualquer, uma amiga da escola, que tinha o cabelo claro e liso até a cintura, levou uma revista mostrando uma modelo parecida com ela. A menina começou a reparar, não via o seu tipo em lugar nenhum.

Neste mesmo ano foi para outra cidade, e por conta da mudança e sem conhecer nenhum salão, ficou um tempo sem alisar o cabelo. A menina que estava se transformando em adolecente não estava se importando com o cabelo diferente que crescia, até na escola nova chegar um menino e a chamar de Simba. Comparada com um leão, ela odiou o volume do cabelo novo, chegou chorando e marcou um horário o mais rápido possível. Até chegar o dia teve que aguentar os novos apelidos, Simba foi o mais usado, às vezes era chamada de cabelo ruim, duro. Quando voltou ao liso tradicional, foi uma surpresa quando pararam de falar do seu cabelo e começaram a falar do seu corpo. Afinal, se ela tinha resolvido o problema anterior para que achar outro? 

Ficou um ano ouvindo o que todos os colegas de sala tinham a dizer e fazendo o melhor para melhorar. Ela “tinha barriga” então toda manhã fazia abdominal antes das aulas, ela tinha “bunda grande” então usava calça larga para disfarçar, era “muito alta” e não usava nada além de tênis e chinelo, “sobrancelha muito fina” e antes de sair de casa passava um lápis para engrossar.

Com 14 anos, pediu à mãe para fazer descolorir os cabelos escuros em loiros para parecer as mulheres que admiravam. Neste mesmo ano, de presente, a tia deu um sutiã com espuma, que dá a impressão que tinha mais seios e a jovem adorou, usava sempre que ia sair. Ela e a tia ficaram mais próximas, faziam algumas dietas que via na internet e a tia perguntava se ela não ia colocar silicone igual as mulheres da família tinha mania de fazer. A jovem tinha medo de fazer qualquer procedimento, então dizia que iria olhar só para a outra não ficar perguntando. 

Até meus 22, a adolecente que virou mulher, ia rigorosamente ao salão para manter a cor clara e as mechas lisas. Acordava mais cedo para ir na academia antes do trabalho, montava o cardápio da semana, não ia em festinha porque sabia que ia furar a dieta, não saia com os amigos para não ficar na tentação de beber uma cerveja.

Perdida tanto tempo, tanto sono, tanta coisa, se perdia, e mesmo sendo igual as mulheres das propagandas se sentia diferente. Perdeu a vida, a emoção, e depois de muita terapia viu que teria que perder a voz da tia na sua cabeça. Decidiu se encontrar, sem se forçar além do necessário, sem se procurar em outras pessoas, sem ouvir o que os outros tinham a dizer. 

Procurou ajuda de médicos e especialistas, conversaram e ela tirou uma pressão de viver todos os segundos do dia sendo “saudável”. Comeu pizza em uma terça, saiu do com os colegas de trabalho na sexta e bebeu, passou o sábado chorando, no domingo recordou que o progresso é trabalhoso e se vive um dia de cada vez. 

Demorou a tomar coragem, olhou salões, marcava e desmarcava horários, só de pensar chegava a chorar. Um dia qualquer mexendo no Instagram, apareceu uma postagem da Shakira, em que a cantora ainda era adolescente, antes da fama. Os cachos eram diferentes mas a cor era tão escura quanto a sua. A mulher voltou a sentir uma menina, que não sabia o que fazer com o cabelo. 

Ela, sozinha em casa, decidiu ser livre. Se livrou da progressiva, das mechas claras, da pressão, do medo. Sentiu o vento na nuca e riu. Finalmente ouvindo sua voz.

Buscou na internet inspirações, produtos para cuidar, pessoas que pareciam com ela. E aos 26, comemorando seu aniversário, a mulher cantava em um karaokê, e imitava a Shakira sabendo que era tão única quanto ela

Encontrou a sua voz depois de tanto tempo, de tanto ouvir as vozes dos outros. 

A mulher que se encontrou em uma confusão de cachos cacheados e nas curvas de seu corpo.

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Por Guilherme Guimarães

Ser um gay padrão é uma expressão que tem sido usada por algumas pessoas para se referir a indivíduos que se encaixam nos estereótipos tradicionais associados à homossexualidade, como comportamentos e interesses tidos como “femininos”. Esse termo, no entanto, é considerado problemático por muitas pessoas LGBT+ por reforçar ideias limitadas e estereotipadas de como as pessoas gays “devem ser”.

De maneira geral, as pessoas gays enfrentam desafios em relação à sua orientação sexual, independentemente de se encaixarem ou não nos estereótipos. Esses desafios incluem a discriminação e o preconceito em várias áreas da vida, como no ambiente de trabalho, em espaços públicos e na vida familiar e social. Além disso, a violência contra pessoas LGBT+ é um problema sério e preocupante em muitos países.

No entanto, é possível que pessoas gays que se encaixam nos estereótipos tradicionais possam enfrentar desafios adicionais em relação a outras pessoas LGBT+. Por exemplo, elas podem ter dificuldade em serem levadas a sério ou respeitadas em ambientes masculinos, como em esportes ou trabalhos em que é esperado um comportamento mais “macho”. Elas também podem enfrentar o preconceito dentro da própria comunidade LGBT+ devido à percepção de que elas reforçam estereótipos negativos sobre pessoas gays.

Em resumo, ser gay padrão pode levar a desafios adicionais em relação à discriminação e preconceito, bem como à pressão para se encaixar em certos estereótipos. No entanto, é importante lembrar que cada pessoa LGBT+ é única e enfrenta desafios específicos em relação à sua orientação sexual. A diversidade dentro da comunidade LGBT+ é uma de suas maiores forças e deve ser celebrada e respeitada.

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Por Júlia Garcia

Férias de janeiro, primeira vez que ela ia ver o mar. A garota não imaginava que iria pisar onde os atores e atrizes da novela pisaram. Ela tinha o sonho de estar ali. A cada capítulo exibido das telenovelas, o sonho aumentava. Sabe quando o padeiro coloca fermento na receita, enquanto prepara o sonho? Então, o sonho dela e a vontade de estar em solo carioca, aumentava da mesma forma. 

Pegou seu celular e tirou uma foto no espelho, para registrar o momento em que ia para a rodoviária pegar o ônibus, para chegar no seu tão sonhado destino. Malas no carro, o pai girou a chave e lá ia ela em busca do calçadão de Copacabana. Primeira parada na cidade maravilhosa: rodoviária! Ela sentiu que estava vestindo uma capa em seu corpo, pois a temperatura era bem diferente da cidade onde morava. Caminhou para o próximo destino: sua hospedagem! Um local amplo e arborizado. Mas ela só queria que chegasse o grande dia, onde iria ver o mar.

Ela ansiava por colocar seus pés no calçadão, na areia da praia. Desejava sentir a água do mar bater em seu corpo. E ela chegou, depois de uma longa caminhada. Três ônibus! Mas isso tudo para realizar um simples sonho? Sim! Era o sonho dela. Quando ela pisou no passeio, e pôde observar o mar, a emoção tomou conta dela.. Ela queria correr, mas não conseguia sair do lugar. Mas uma hora ela se tocou que havia ficado para trás e foi atrás de suas companhias. E ela viu o mar. Sentiu o mar. Sentiu a brisa e a maresia.

Até hoje, quando vai ao mar, a garota sente as mesmas sensações. Ela entendeu que todo sonho é válido e eterno. Entendeu que às vezes, mesmo que sejam poucas vezes, os sonhos se realizam. E coincidentemente, ela vai voltar ao mar em poucos dias. Com a certeza de que sentirá tudo de novo, como se fosse a primeira vez.

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Por Adria Oliveira 

O nascimento, a meninice, a meninez… quem nunca teve saudade do tempo da infância que
atire a primeira pedra…  Às vezes a saudade pode ser de um cheiro, um gosto, uma memória afetiva ou um sorriso, mas do que eu mais sinto saudade é de não pensar mal dos outros. Parece estranho, mas me diga, qual a última vez que você fez qualquer coisa sem desconfiar de alguém? Quando eu era criança certa vez um vendedor de uma rede de supermercados me perguntou, garotinha, você trocaria seu bico por aquela linda bicicleta rosa? E eu aceitei, é claro, pelo menos foi isso que a minha mãe disse. O fato é que eu nem por um segundo pensei em contestar o porquê daquele vendedor ter aleatoriamente feito aquilo?

Ai que saudade de uma brincadeira tranquila, um desenho animado, de chorar fácil, sorrir fácil, sentir raiva fácil, parar de sentir raiva fácil e não me preocupar se o meu “coleguinha” vai errar comigo de novo. E aí está o paradoxo, porque quase toda a parte da minha infância, tudo o que eu queria era ser adulta.

Você já parou para pensar por que o vendedor me fez aquela proposta? É porque meu pai pagou 50 reais por algo que eu não queria abrir mão: meu bico. Naquela época, eu tinha quase 3 anos e não queria desistir daquela pequena fonte de conforto. É engraçado pensar que, se essa história acontecesse hoje, eu provavelmente estaria procurando uma câmera, pensando que era uma brincadeira ou pegadinha de algum programa de TV divertido, sabe? Às vezes, eu até gosto de ser adulta… Não é tanto a saudade da infância que me bate, mas sim a falta de preocupação em lidar com contas para pagar… ou talvez nem lidar com elas.

Ah, como sinto falta dos tempos da infância! O nascimento, a fase de ser criança, aquela época cheia de pureza… Quem nunca sentiu saudade desses momentos, não é mesmo? Às vezes, basta um cheiro, um gosto, uma lembrança afetiva ou um sorriso para trazer tudo de volta. Mas sabe do que sinto mais falta? De não ter uma mente desconfiada, de não pensar mal das pessoas. Parece estranho, mas me diga, quando foi a última vez que você fez algo sem desconfiar das intenções de alguém? Lembro-me de uma ocasião em que era apenas uma garotinha. Um vendedor de um supermercado se aproximou de mim e perguntou: “Você trocaria seu bico por aquela linda bicicleta rosa?”. E eu aceitei, é claro. Pelo menos foi isso que minha mãe me disse. Naquela época, nem por um segundo passou pela minha cabeça questionar o porquê daquela proposta repentina.

Ah, como sinto falta de brincadeiras tranquilas, de desenhos animados, de rir e chorar facilmente, de sentir raiva intensamente e, em seguida, deixá-la ir embora sem rancor. Sinto falta de não me preocupar se meus amigos vão me machucar novamente. É engraçado como tudo isso é contraditório, porque na maior parte da minha infância, eu só queria crescer logo.

Adria Oliveira na fase adulta. Foto: arquivo pessoal.

Você já parou para pensar por que o vendedor me fez aquela proposta? É porque meu pai pagou 50 reais para me tirar o bico, algo que eu não queria abrir mão. Eu tinha quase 3 anos naquela época, e aquela chupeta era meu pequeno refúgio. É curioso pensar que, se essa história acontecesse hoje, eu estaria procurando uma câmera, pensando que era uma brincadeira ou pegadinha de algum programa de TV divertido, sabe? Às vezes, até consigo apreciar a vida adulta… Não é tanto a saudade da infância que me consome, mas sim a falta de preocupações com contas a pagar… ou, quem sabe, nem precisar lidar com elas.