Literatura

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Por: Larissa Ohana – Parceira Contramão HUB

Existem momentos em que vida e o universo nos fazem despertar, de todas as formas possíveis, para o fato de que é preciso voar. Assim mesmo, muitas vezes grosseiramente, para que possamos desvencilhar-nos de atitudes, pessoas e lugares que nos impedem de evoluir. Não que seja necessário se afastar para sempre, mas apenas para alcançar um espaço possível de olhar para dentro, para fora, e para tudo, a fim de perceber suas vontades mais íntimas. Seus desejos totalmente individuais e extraordinários.

Por isso, é preciso agir. Avaliar as relações através de um olhar mais afastado, entendendo qual o seu papel no mundo. Se precisar sair de casa, saia. Se sentir que deve mudar tudo, mude. Seja o emprego, o relacionamento, suas próprias condutas ou até a plantinha de lugar. Dá medo demais, sabemos, causa uma angústia que evitamos olhar, uma ansiedade crônica, ou até uma doença latente, mas a cura para tudo isso é fazer o que o sentimento pede. As coisas se acalmam de uma forma inimaginável, as dores físicas e psicológicas que pareciam gritar ali, cessam (aos poucos) e, isso tudo, torna essa fase louca, uma fase totalmente gratificante.

Não duvide, você é capaz, até de muito mais do que apenas mudar, mas de conquistar tantas coisas quanto queira.

São processos contínuos e que vão tomando cada vez maiores proporções dentro de cada um. Indica direções, na maior parte das vezes, que nem mesmo se havia pensado, porém é caminhando para essas novas aberturas que é possível alcançar novos rumos e claro, realizar os famosos sonhos.

Há situações que por mais que façamos toda força do mundo, aquilo se torna insustentável, não de uma maneira negativa, ou talvez seja, mas porque pura e simplesmente não existe mais a sensação de se estar agregando algo, nem para si e nem aos outros. Lembrar-se de que tudo deve ter um propósito ou uma intenção, é relevante. Afinal, entender que situações onde não se soma, fazem com que se perca o sentido, na questão evolutiva, evitando também grandes chances de amadurecimento.

O ponto principal é perceber a função dos obstáculos, que podem ser apenas obstáculos ou podem ser vistos como degraus, ou até mesmo trampolins. Logo, são enormes as chances de que sejamos lançados à lugares incrivelmente maravilhosos, que não eram enxergados porque a janela estava fechada, ou alta demais.

É possível, inclusive, que durante essa caminhada, pessoas das quais esperamos apoio e incentivo, não ajam dessa maneira. Isso acontece porque todos percebemos os fatos e oportunidades de maneiras distintas e em tempos descompassados, demonstrando que elas provavelmente vejam a janela ainda fechada. Então, basta se desapegar das indicações alheias, sem ignorar as sugestões, que são bem vindas, mas levar em conta que é assim, cada um sente e age como se identifica.

Entenda, precisamos nos tornar profundamente independentes. Tomar as próprias decisões e escolhas, sem esperar que algo venha de fora, seja sentimentalmente, financeiramente, ou qualquer outra forma possível. Para poder finalmente agir de acordo conosco, sem porém, e claro, se lá na frente tudo parecer ter sido um erro, terá sido um “erro” não por falta de entrega, ou por falta de tentativa, mas sim um erro que apenas levou à mais um aprendizado e assim o ciclo recomeça.

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Por Débora Gomes – . as cores dela . – Parceira Contramão HUB

 

[do livro de cartas]

Bisa me ensinou, Salvador, que a gente não deve ter medo. nem fugir do que é nosso por destino. e é por isso que eu continuo aqui. porque se a gente não for dessa coisa de estar pra sempre no caminho um do outro, eu não sei o que a gente é. e é por isso que eu te peço, de todo coração: não tenha medo, querido… de sonhar, de voar mais longe, de retratar o mundo, de sentir o amor. porque toda vez que você teme a vida, Salvador, é como se caísse um mundo de nuvens carregadas de chuvas e trovoadas em cima do meu coração. e tudo nubla aqui dentro. e eu perco a vontade, perco a alegria, perco a coragem, perco a esperança…

{e que pode a vida se tornar, com tantas coisas perdidas assim?}

lembro Guimarães Rosa dizendo em um daqueles contos que tanto gosto, que o que a vida quer da gente é coragem. acho que é bem isso mesmo, sabe? e é por isso que juntei minhas economias e chego aí antes que o verão acabe. não quero que a vida me lembre como alguém sem viço, sem brilho nos olhos, sem força, sem determinação, guardando apenas todo um amor que não deu certo, só porque a gente não teve coragem de amar.

certo, Salvador, é que se continuares com medo, ainda assim lhe perdoarei. porque aprendi a não lhe guardar rancor e a não lhe culpar por um sentimento que precisa dos nossos olhos pra amadurecer. tenho paciência. e me espere chegar antes do pôr do sol.

 
“o meu amor sozinho
é assim como um jardim sem flor
só queria poder ir dizer a ele
como é triste se sentir saudade”
 
e
com um vento fresco desse quase outono,
Alice

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Por Kedria Garcia

Na adolescência ouvia várias e várias histórias de como a presença esfria depois de tanto tempo ao lado da mesma pessoa. O amor dá a desculpa de ir comprar cigarros e deixa o comodismo como responsável pela vida a dois. As brigas se tornam cansativas e os dias vão se desbotando. O segundo passo é negociar com o egoísmo para fugir da maldita rotina. Amantes, traições, compras, distanciamento, individualismo e tentar achar um culpado são alternativas para não encarar a separação, o divórcio.

Todos conhecem, já ouviram falar ou passaram pela crise dos cinco anos de casado.

São vinte estações climáticas, sessenta meses, duzentos e quarenta semanas, mil oitocentos e vinte e cinco dias, quarenta e três mil e oitocentas horas com a mesma companhia.

Quando adolescente esses números não me assustavam, dava até um ar de desafio manter a felicidade aquecida por tantos números. Hoje a solidão já ocupa um canto de cada móvel, de cada cômodo da casa, brinca com o cachorro e adquiriu um lado da cama ao custo de parcelas de desapego. Os beijos são duros, as falas curtas, os olhares práticos e a comunicação oca.

“Tenha um filho, vai ser ótimo para relação de vocês.”

“Viagem! Sim, é disso que vocês precisam.”

“Sexo! Sexo e sexo!”

“Quem não dá assistência perde pra concorrência.”

“Outra casa, é disso que vocês precisam, ocupar a cabeça com outras coisas, outros projetos.”

“Já tentaram trabalhar em casa?”

Lembro de ter lido em algum lugar que as pessoas não te escutam para ajudar, elas escutam para rebater. Não quero soluções mágicas, quero descobrir o que aconteceu de errado. Tapar buracos abrindo buracos maiores nunca foi a minha praia. A casa está bagunçada de incertezas e o calor dos abraços está soterrado sob alguma pilha de jornal. A sintonia ainda está por aqui, debaixo dessas camadas grossas de poeiras do silêncio.

“Sinto saudades de te conhecer!”

Apertei o botão enviar com os olhos fechados e o coração na boca. A mensagem não faria sentido, ficaria sem resposta e seria ignorada assim como todos os quase carinhos oferecidos.

“Você aceita tomar aquele café comigo? Mas tem que ser agora, pois a Rua da Bahia não permite desamores congelados.”

O café da Rua da Bahia com certeza é um lugar de encantos do desconhecido, e agora seria palco de mais um encontro para se reconhecer um ao outro.

“Prefiro chá de hortelã!”

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Por Débora Gomes – . as cores dela . – Parceira Contramão HUB

Salvador,

sinto sua falta, principalmente quando o tempo ameaça ser janeiro o ano todo. e se te escrevo assim, enquanto ainda amanhece, é porque no fundo, ainda espero que cê se recomponha e decida vir antes que o domingo acabe. Bisa me disse, num bilhete em papel manteiga, todo bordado nas beiras com delicadas flores de abril, que devo endireitar o corpo e ir embora, sem olhar pra trás. que esse teu coração de mundo, nunca vai desejar encontrar abrigo. e que do tanto que aguardo passar mais um verão, verei apenas meu coração se tornar quebradiço, como as vidraças das janelas mais antigas.

não sei se acredito… e ainda olho teu retrato como quem se reconhece pelas beiras do tempo e se aconchega ali, sem prazos ou pressa de viver. no entanto, por via das dúvidas, não falo mais teu nome há alguns dias, nem escrevo mais poemas demorados, rimados em canções. tenho tentado, juro! e lhe conto que esquecer é caminho sem volta, e isso também apavora.

a verdade é que, por mal, perco a parte doce do peito sempre que cê me some. e vivo os dias numa amargura, uma tristeza, principalmente nessa época em que tudo evapora com as gotas da chuva. tenho ataques de ansiedade, choro sem motivos, saio pouco de casa, uso bastante alfazema e desaprendo o jeito: de rir, de ouvir, de falar daquelas coisas bonitas que cê (já) tanto se alegrou em ouvir.

eu tenho medo, Salvador. de nunca mais conseguir ser a mesma pessoa, depois de aceitar que a gente virou caminho sem volta. então, peço que repense tua solidão antes que Bisa me escreva de novo, e me convença de que é melhor silenciar meu coração e te deixar partir. eu não saberia mais contar estrelas sem contar com você…

é (sempre!) com amor,
Alice,

 

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Por  Jean Lescano – Poligrafias – Parceiros Contramão HUB

Eu sei que já conversamos sobre isso várias vezes, e eu até pediria desculpas por tudo o que vou falar, imagino sua feição ao ler esse texto. Eu precisava desabafar, já que com você é sempre do teu jeito e no seu tempo. Nós precisamos conversar, mesmo que por textos…

Hey, vem cá. Senta aqui.

Eu também já passei por maus bocados. Eu deixei muita gente partir por conta disso. Você sabe, eu sou fechado e detentor de meus próprios sentimentos e prazeres. No fundo, sei que isso me priva de ser muito feliz. Eu entendo bem que no fundo, talvez, nós dois sabemos:  você só quer me proteger.

E eu nem sei bem do quê. Você abraça seus problemas e os deixa só para ti, como se fosse uma criança controlando seu brinquedo mais legal. Você s[o quer me proteger de coisas que te preocupam e te estraçalham por dentro. Você só quer me proteger da verdade:  você não me quer.

Não como eu imaginei que queria.

E, no fundo mesmo? Eu não posso te segurar comigo.

Você não precisa me contar o motivo pelo qual mergulha em uma agenda lotada de amigos e rolês, como nem por um momento para em casa pra eu te surpreender em um sábado a noite, pois como eu disse, você só quer me proteger e eu só quero teu bem. É que agora é oficial, agora eu me dei conta que quem não quer mais viver assim empurrando as coisas com a barriga sou eu; eu não consigo simplesmente parar de fantasiar as coisas e no final tomar uma dose de realidade. Eu não quero mais acordar com ressaca de sentimentos.

Se você amasse, no fundo, eu saberia. Se você quisesse, eu saberia. Nunca é seu momento, nunca. Hoje é não, amanhã também. E eu me dei conta de uma coisa: quem ama não faz joguinho, apenas deixa fluir, sem medo do passado, apenas se joga.

Quem ama, não vai se ligar ao passado. Quem ama é futuro.

Eu nunca quis ter você como minha namorada pra ser um troféu. Não te queria pra correr o risco de reviver teu passado. Eu queria uma chance pra mostrar o quão sensacional tu é.

E tá sendo muito legal até agora, de verdade, foi tudo especial!

Mas eu não consigo e, pra ser sincero, não sei nem se você vai ler isso. No fundo, torço que leia e entenda o que nunca consegui te falar, mas também queria que não visse. Conhecendo um pouco de você, ví que não gosta de ser confrontada.

E, no fundo mesmo? Eu não posso te segurar comigo.

Eu não vou te cobrar mais ,muito menos privar você de suas vontades. Infelizmente terei de aceitar o fato que, pra sua família, sou só mais um conhecido. Indireta? Nunca mais. Eu vou seguir como já seguia antes de você aparecer.

Mas caso tu volte, sinceramente não saberei reagir. O problema em afastar quem não ama é esse, a gente nunca sabe como superar. Mas supera. Mas numa dessas eu posso estar tão longe que você não conseguirá me alcançar; tão longe que não vou conseguir te atender quando me telefonar. Ou mesmo estarei muito perto, porém vivendo em um mundo que não há espaço para eu ficar.

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Por Débora Gomes – . as cores dela . – Parceira Contramão HUB

… aí o telefone tocou e era ele pra perguntar como as coisas estavam e desejar um bom Natal.
E ela,com tantas coisas que tinha pra dizer, silenciou e apenas ouviu, dando um sorriso de quem não sabia o que fazer.
Estava assustada com aquilo tudo tão de repente e meio boba que é perguntou pela viagem como se isso fosse só.
E ele respondeu daquele jeito calmo e num pulo perguntou quando iria visitá-lo. E ainda mais boba, nem sequer respondeu e num surto invisível, lhe devolveu a mesma pergunta e de janeiro, ele pulou pro carnaval e do carnaval ela sabe que vai pular pra Semana Santa e vai pulando de mês em mês até chegar mais um Natal.
Ele não lhe devolveu a vida dessa vez. Ele só a fez chorar… um choro engasgado vindo de dentro do peito como se algo por dentro tivesse começado a sangrar. E doía ouvir de novo a voz que ela já há algum tempo quase esquecia…
Ele não ouviu ela chorar…
Enquanto ele falava ela engolia lágrima por lágrima enquanto o mundo em volta ia sumindo. Se despediram… um beijo, um abraço, um ‘espero te ver em breve’. Aí ela não teve mais alegria nenhuma no dia, e se teve, nem percebeu qualquer momento feliz. Ninguém viu que ela chorou. Deu um abraço em sua mãe, disse que estava triste e ouviu dizerem que tristeza passa…
No outro dia, nem acordar queria. Sentiu o peso do fim assim que abriu os olhos. Alguma coisa por dentro dizia que acabou e que a vida precisava continuar. Aí ela se perguntou continuar como! E se levantou num suspiro e percebeu que iria demorar pra passar. Vai ligar pra ele no fim do dia e pedir dois favores que ontem se esqueceu. E só. É o fim. Ela já não o reconhece mais.
A moça do sentimento maior do mundo vai pegar as malas que deixou pra trás e seguir a vida. Não sabe ainda pra onde vai, mas espera que lá não exista lugar pra tantas lágrimas nem tanta dor. Mas no momento ela se fechou e parou de acreditar…
Vai ali! Entrar dentro de si e tentar achar um restinho de vida dentro do coração…