Una

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Por Flávio Figueiredo, Patrick Ferreira, Tales Ciel e Tawany Santos

A atual pandemia da Covid-19 tem gerado muitos debates sobre a gestão dos governos diante do controle da doença. Hoje o Contramão traz uma matéria especial para outras crises sanitárias em nosso país.

O mundo já passou por inúmeras crises sanitárias globais e a Covid-19 tem se mostrado a mais grave que as gerações atuais já viram. No século XX, os governos precisaram enfrentar desafios em quatro graves doenças que assustaram as pessoas: a gripe espanhola, a AIDS, a gripe suína e agora, a Covid-19. Relembre como foram as gestões dos governos diante das crises.

Pandemia da gripe espanhola – 1918/1920

Gripe Espanhola também foi tratada com negligência no Brasil

De origem misteriosa, a Gripe Espanhola foi uma pandemia que ocorreu entre os anos de 1918 e 1919 atingindo todos os continentes deixando uma marca de no mínimo 50 milhões de mortos. Não se sabe ao certo em qual país a doença surgiu, mas existem suspeitas que tenha sido na China ou mesmo nos Estados Unidos, onde se tem os relatos dos primeiros casos.

Pesquisas da época identificaram que o vírus da gripe espanhola era uma mutação do vírus Influenza (H1N1), que se espalhou das aves para os humanos fazendo suas primeiras vítimas em uma instalação militar no Kansas (USA) em meio às movimentações das tropas no período da 1ª Guerra Mundial, impactando de maneira direta países que participaram desse conflito.

Naquele tempo, assim como recentemente com o Coronavírus, houve negligência por parte de autoridades, Woodrow Wilson presidente americano da época (1856-1924) além de não notificar os demais países da existência do problema, censurou a imprensa para que as mortes não fossem noticiadas, bem como as demais autoridades participantes do conflito não divulgaram as informações em seu país, ficando assim a Espanha que não estava diretamente ligada ao conflito incumbida de trazer as notícias sobre a doença e por isso ela ficou conhecida como Gripe “Espanhola”.

No Brasil, a Gripe Espanhola fez números catastróficos, os dados mais exatos vinham do Rio de Janeiro, a capital da República na época. Estima-se que a doença fez cerca de 15 mil óbitos entre os meses de setembro a novembro de 1918, devido aos recursos escassos e à falta de conhecimento sobre a doença, autoridades da época demoram muito a tomar as primeiras atitudes e ajustar ações e criar medidas efetivas contra a enfermidade.

Naquele tempo, assim como atualmente, algumas das medidas que foram tomadas consistiam no distanciamento físico, uso de máscaras e restrição às aglomerações. No início, a doença foi tratada como piada pela mídia da época, quando Carlos Seidl, então diretor-geral de Saúde Pública, cargo hoje competente ao ministério da saúde, falou sobre a doença e não foi ouvido por muitos. A situação ficou insustentável após ataques da mídia que fizeram Seidl renunciar ao cargo.

Após o acontecido, coube ao médico carioca Theóphilo Torres assumir o posto de diretor-geral de Saúde Pública convidando o também médico e pesquisador Carlos Chagas para assumir as ações de combate à gripe espanhola junto a ele. Em diferença aos tempos de hoje os governantes da época, não foram contra as ações tomadas pelo diretor-geral de Saúde Pública e quanto menos fizeram propagandas de medicamentos ineficazes a doenças.

A pandemia do HIV/Aids – 1981/atualmente

Governos começaram a criar campanhas de conscientização e prevenção ao HIV

Em anos anteriores à década de 1980, uma doença acometia muitos jovens, causando sintomas que não eram uniformes. Alguns tinham complicações como uma pneumonia, uma tuberculose, ou um sarcoma, uma doença de pele, que de forma avassaladora os levava até à morte. Mas foi em 1981 em que foi catalogada, a AIDS (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida) causada pelo vírus HIV. Ele ataca matando as células de defesa (CD4) deixando a pessoa sem imunidade para vários tipos de doença.

Mesmo 40 anos depois, ainda é uma pandemia ativa, porém com tratamentos muito eficazes em que a pessoa vive de forma plena, sem nenhum comprometimento na saúde caso siga corretamente tomando as medicações devidas. O Brasil é referência mundial no tratamento à pessoa vivendo com HIV. Porém, o mundo nos anos 1980, fez vista grossa a essas pessoas, por conta dos infectados e mortos serem principalmente homossexuais. O preconceito fez com que a AIDS se tornasse também uma doença social.

O Brasil não tinha nenhum tratamento no início de tudo. A partir de 1987 que surgiram os primeiros recursos, onde em 1996 deu-se um passo maior, onde a ciência descobriu que uma combinação de medicamentos antirretrovirais, conhecida popularmente como “coquetel”, que era capaz de controlar a multiplicação do vírus, em média eram até oito comprimidos. A partir de 2017, entre um e três comprimidos apenas já são capazes de controlar. Também há como prevenção a PREP (Profilaxia Pré-exposição), onde a pessoa toma regularmente um medicamento que impede a infecção pelo HIV e a PEP (Profilaxia Pós-exposição) que após uma situação de risco, a pessoa pode tomar um medicamento para impedir que o vírus infecte o organismo.

O papel dos governos brasileiros na prevenção e tratamento da AIDS sempre foi satisfatório, apesar das dificuldades biológicas e preconceitos. A partir de 1987, o governo de José Sarney se voltou ao incentivo do uso de preservativos e os “perigos” que as práticas sexuais e uso de drogas guardavam, até que em 1990, no governo de Fernando Collor, intensificou as campanhas educativas muito polêmicas. Em determinado comercial, quatro pessoas deram um depoimento, sendo três de outras doenças e um de AIDS, onde este dizia que a doença dele era incurável e vinha um slogan: “Se você não se cuidar, a AIDS vai te pegar!”. Isso causou muita revolta de grupos ativistas da época por discriminar e estigmatizar a pessoa que estava com a doença. O governo de Collor foi marcado pela indiferença com a epidemia que com a crise fiscal, congelou preços e salários, porém autorizou o aumento em todos os medicamentos de tratamento à doença.

A abordagem do governo de Fernando Henrique Cardoso foi de mais leveza. Deram atenção mais devida às pesquisas e descobertas e passaram a fazer uma campanha mais leve onde incentivava o sexo seguro, para proteção de quem ama, tirando o teor terrorista de anos anteriores. Foi nesta época onde surgiram os primeiros tratamentos mais eficazes e mais pessoas puderam se tratar.

O governo Lula seguiu a favor do tratamento à AIDS, chegando a cometer um ato histórico. A primeira quebra de patente de um medicamento no Brasil. O então presidente Lula decretou a quebra do Efavirenz, do laboratório americano Merck Sharp&Dohme, usado no tratamento da AIDS -e ameaçou repetir a medida com outros fabricantes se considerar que os preços praticados são injustos. O governo Dilma seguiu com medidas semelhantes, acompanhando as evoluções da ciência.

O HIV/AIDS ainda persiste nos dias de hoje. Várias evoluções ocorreram, incluindo testes de uma vacina no Brasil e até mesmo um tratamento de cura desenvolvido pela Universidade do Estado de São Paulo (Unesp), onde um paciente vivendo com HIV, com a junção de várias drogas ficou por 17 meses sem replicar o vírus no organismo. Porém, o governo Bolsonaro segue indiferente com as conquistas. Não há investimento para a pesquisa e Ciência, já manifestou preconceitos em falas como “A pessoa que vive com HIV, além de ser um problema para ela, é um gasto para o país”. Se mostra contrário a tudo que favorece a população LGBTQIA +, que embora não seja mais a maioria que é infectada (58% dos infectados hoje se declaram heterossexuais) segundo dados do Ministério da Saúde). Apesar disso, as pessoas que vivem com HIV recebem um acolhimento adequado pelo SUS. Os medicamentos, exames são gratuitos e recebem até mesmo assistência social e psicológica para manter a vida mais plena possível.

Pandemia H1N1 – Gripe Suína -2009/2010

Em 2008, o ex-presidente Lula (PT) e o então governador de São Paulo, José Serra (PSDB), se uniram para divulgar campanha de vacinação em massa contra a gripe.  Foto: Ricardo Stuckert

A Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou o estado de pandemia moderada para a Influenza A (H1N1) em 11 de junho de 2009, após os casos se espalharem por países da América, Europa e Ásia. Contudo, os primeiros casos de gripe suína já haviam sido registrados um ano antes, no México. Dados da Organização mostram que  foram diagnosticados 504 mil casos da doença e cerca de 6.300 mortes. No Brasil, o Ministério da Saúde registrou entre os anos de 2009 e 2010, 44.544 casos e 2.051 mortes. O estado de pandemia foi encerrado em agosto de 2010 após estudos reconhecerem que a doença estaria sob controle e passaria a se comportar como outras enfermidades localizadas.

Na época, o país apresentou um comportamento ativo no combate à pandemia e se consolidou como a nação que mais vacinou cidadãos pelo sistema público no mundo. A imunização contra o vírus H1N1 começou em março de 2010. O plano de vacinação definido pelo Ministério da Saúde contemplou cinco grupos prioritários para a vacinação: indígena, gestantes, portadores de doenças crônicas, crianças entre seis meses e dois anos de idade e jovens com idade entre 20 e 39 anos. Diferentemente da Covid-19, os idosos não eram considerados grupo de risco.

Sob o governo de Lula foram mais de 100 milhões de pessoas vacinadas. Destas, 88 milhões em apenas três meses. A ideia do Governo Federal era conter uma “segunda onda” de casos da doença no outono e no inverno. A fim de combater os boatos que colocavam em dúvida a eficácia e a segurança dos imunizantes, o governo também lançou uma campanha contra essas fake news. Como resultado, mais de 45% das pessoas foram vacinadas. Nenhum lugar do mundo imunizou tanto quanto o Brasil.

Pandemia COVID-19 – 2020/atualmente

Manaus 06/05/2020 – Cenas dos leitos semi intensivos do hospital Platão Araujo sob responsabilidade do Governo de Manaus. Foto Jonne Roriz/Veja

O surto de vírus do Covid-19, nem precisa de introduções, completando agora quase um ano e quatro meses de crise infectológica no país. E de acordo com um estudo australiano, o Brasil é o país que pior lidou com a pandemia. Esse levantamento foi feito com base em análises com mais de 100 nações sob critérios como casos confirmados, mortes e capacidade de detecção da doença. Segundo dados, adicionalmente, do consórcio de imprensa, o país possuía, até janeiro de 2021, quase 9 milhões de infecções confirmadas e 220 mil mortes, para uma população de 209,5 milhões de habitantes.

Esses números são ainda mais indignantes quando olhamos para os países que sofreram intensamente nos primeiros meses de pandemia, como a própria China, onde tudo começou, a Itália e Espanha, têm visto suas infecções despencaram, as do Brasil continuam a subir. De acordo com a maior pesquisa feita sobre o surto em terras tupiniquins, de Darlan Candido, da Universidade de Oxford, no Reino Unido, é possível que as infecções tenha vindo de muitas mais fontes internacionais, o que indica que a movimentação dentro do país pode ter sido um contribuinte para a disseminação do vírus.

“Quando as diminuições de mobilidade foram impostas, houve uma queda importante do R0, que chegou a menos de 1 em São Paulo entre 21 e 31 de março, no início do isolamento social. Só que, depois dessa redução, o número subiu de novo, estimulado pela diminuição na adesão à quarentena. ”sumariza a jornalista Chloé Pinheiro, em reportagem da revista Saúde Abril.

Na análise australiana, elaborado pelo Lowy Institute, na Nova Zelândia, aponta que, por exemplo, nos países europeus, um comportamento similar ocorreu. “Isolamentos sincrônicos (…) conseguiram parar a primeira onda [de infecção], mas as bordas abertas deixaram os países vulneráveis para renovação de surtos em países vizinhos [tradução nossa].”. Ou seja, o primeiro passo para o controle da pandemia seria o isolamento social e fechamento das fronteiras e aeroportos, coisas que não aconteceram no Brasil. Aqui, cada estado foi deixado, por abandono do supremo, a si próprio, muito como os Estados Unidos no início de seus contágios.

Segundo dados da Universidade Johns Hopkins, os Estados Unidos registraram 33.478.513 casos e 600.935 óbitos, até junho de 2021. Assim como aqui, um governo negacionista, deixou os estados por conta própria e minimizou a gravidade da doença e a importância de medidas de prevenção – como o uso de máscara e o distanciamento social. O ex-presidente, Donal Trump.

Porém, após a troca de presidentes e um plano de vacinação, a média semanal de mortes pela Covid-19 nos EUA caiu em quase 90% do pico em janeiro. O país, que ocupa, por enquanto, o maior número de mortalidade pelo vírus do planeta, fechou suas fronteiras oficialmente em 2020 e começou a reabertura gradual já em setembro do mesmo ano. De acordo com a Hopkins, a campanha de vacinação em massa teve um grande impacto na redução das mortes. Em dezembro de 2020, o país começou a vacinar seus cidadãos e, desde então, de acordo com a universidade, cerca de 44% da população americana já recebeu as duas doses e, por consequência, o número de mortes caiu 18% e o número de internações por infecção pelo coronavírus também baixou 28%.

Já no Brasil, as mesmas campanhas anti-ciência continuam e os casos só aumentam. Em entrevista para a revista Saúde Abril, o pneumologista Fred Fernandes faz uma análise das relações humanas e como foram afetadas pelo Coronavírus. Quando questionado sobre a situação no Brasil, Fernandes destacou a falta de coerência no discurso sobre a doença, citando como exemplo a situação em que o presidente falava uma coisa e os médicos outra. Isso fez com que a população ficasse perdida e diminuindo a eficácia das orientações médicas.

“Quando falamos do uso da cloroquina, por exemplo, isso não está baseado em evidência científica.”, ele cita. “Tem muita gente advogando a favor da cloroquina logo na fase inicial e em indivíduos de baixo risco. Mas trata-se de uma medicação que traz efeitos colaterais conhecidos. E isso pode fazer mais mal que bem.”

 

Edição: Daniela Reis

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Por Bianca Morais

O Centro Universitário Una, muito além de instituição de ensino superior, tem como um de seus pilares a inclusão. A série de reportagens sobre 60 anos da Una, mostra diversos projetos de extensão que promovem essa rede de apoio e troca. 

Dando continuidade a série, o Contramão traz hoje uma iniciativa muito importante da instituição que, desde 2016, estimula o diálogo e combate ao racismo. Batizado de Pretança, o projeto mostra mais uma vez como, além de educar e preparar alunos para o mercado de trabalho, a Una quer formar cidadãos conscientes de seu papel na sociedade oferecendo a eles uma formação humanista.

Racismo é um assunto extremamente delicado, principalmente dentro de instituições de ensino. Não é de agora que estudantes negros sofrem discriminação dentro de faculdades, muitas vezes, já foram noticiados na grande mídia vários episódios de preconceito, piadas de mal gosto, trotes polêmicos. 

O Pretança traz para o Centro Universitário Una e para a comunidade em geral, por ser um projeto aberto ao público, um espaço de discussão sobre questões raciais, o reconhecimento da cultura negra, demonstra como o racismo é configurado na sociedade e como deve ser combatido, isso tudo através de debates, rodas de conversas, entrevistas, entre outros. Pretança é um espaço de acolhimento, diversidade, onde o aluno pode compartilhar suas dores e lutas, é um local de resistência em cima de um sistema que por anos os excluiu.

O começo

O Projeto de Extensão Pretança, idealizado pela professora e coordenadora do programa, Tatiana Carvalho Costa, na realidade, partiu de alguns movimentos anteriores realizados pelos alunos do campus Liberdade. Por volta dos anos de 2013 e 2014, devido a políticas federais, como o Fies, Prouni e as cotas, houve um aumento significativo de estudantes negros e de periferia nas faculdades particulares.

“Sobretudo no campus Liberdade, localizado em um lugar super elitizado, zona sul de Belo Horizonte, houve um estranhamento por parte de estudantes e professores brancos, daquela quantidade de pessoas negras ali, o aumento de pessoas não brancas em ambientes acadêmicos que historicamente são embranquecidos”, esclarece a coordenadora.

Devido a dois episódios específicos de racismo dentro da faculdade, as reclamações de atitudes preconceituosas cresceram, por isso, coordenadores e diretores do campus se uniram e tiveram a iniciativa de um evento para discussões de questões raciais.

 

“Foi incrível, a gente aprendeu muito coletivamente, e os alunos que organizaram esse evento, ainda criaram um coletivo de estudantes chamado ABUNA, Afro Brasileiros da Una, mas aí eles se formaram, algumas pessoas saíram da instituição e essa coisa acabou. Isso em 2015”, conta Tatiana.

Em 2016, depois de um semestre sem novas iniciativas sobre discussões raciais, na época, Tatiana, uma das poucas professoras negras do campus, se viu cobrada pelos alunos. Ela que sempre esteve engajada em outras ações fora da escola, próxima ao movimento negro no geral, resolveu tomar a frente e propor um projeto, que inicialmente seria somente para o curso de jornalismo.

“Basicamente, era um projeto de extensão para produção de conteúdo audiovisual, fotográfico e textual. Além disso, a ideia era promover rodas de conversas para que as pessoas participantes entrassem em contato com os principais conceitos e dessem conta de compreender a questão racial que se dava naquele momento”, relembra ela.

A ideia inicial era algo pequeno, no entanto, logo na primeira roda de conversa chegaram pessoas de vários cursos, inclusive colaboradores, e foi quando a instituição começou a entender a necessidade de se ter um espaço mais amplo de acolhimento para além do seu propósito inicial. Inspirados pelo Una-se contra a LGBTfobia (veja a matéria sobre o projeto), passaram a atuar em um tripé de acolhimento, incentivo e diálogo, com a verba do projeto adquiriram livros de discussão racial para a biblioteca e também passaram a promover eventos e participar de outros.

A evolução

Ao longo dos anos, o projeto Pretança cresceu e passou a ter reconhecimento externo, como as ações em parceria com o EDUCAFRO, o curso preparatório para Enem que discute questões de cidadania e direitos humanos e com a Comissão para a Promoção da Igualdade Racial, da OAB.

O projeto também se desdobrou em grupos de estudos, e realizam atividades em parceria com outros programas ligados ao Ânima Plurais, política de diversidade da Ânima Educação, como o Antirracismo na Rede que é a produção de material de referência para as redes sociais e promoção de discussão entre intelectuais e profissionais negros em diversas áreas do conhecimento, e o Cineclube que visa promover sessões comentadas com debates abertos de produções cinematográficas africanas.

“Com a presença forte do Ânima Plurais e desse marcador institucional de discutir questões raciais de maneira mais profunda, o Pretança se desdobrou, então segue o projeto a partir da Cidade Universitária, e levamos o Cineclube para o nível Ânima, já tivemos 240  pessoas inscritas de diversas escolas do grupo”, explica Tatiana.

Além das parcerias, o Pretança tem uma bagagem de muitas realizações, já estiveram presentes em comunidades quilombolas, participaram de eventos como a Taça da Favela, o Festival de Arte Negra, durante a pandemia promoveu palestras com profissionais negros, sobre empreendedorismo, mulheres negras. No último semestre o projeto desenvolveu um podcast que irá estrear em breve e abordará diversos temas, como lugar de fala, violência policial, entre outros.

“Quando a gente fazia cobertura de eventos, amplificávamos esses eventos, como Prêmio Lei Leda Martins, Mostra de Cinema que tratavam especificamente de filmes negros, nós demos uma pequena contribuição ali, e ao mesmo tempo, também tivemos um retorno interno muito importante que foi trazer para dentro da escola, principalmente para as pessoas que participaram do projeto, um contato maior com essas questões, foi muito bonito, em questão de afirmação da identidade, do desenvolvimento de autoestima dos alunos e dessas percepções mais ampliadas das possibilidades de atuação”, completa Tatiana.

Durante uma cobertura do evento Festival de Arte Negra, uma aluna do curso de Jornalismo entrevistou Djamila Ribeiro, durante a conversa a ativista feminista negra, comentou como queria ter tido a oportunidade de ter um programa como o Pretança na sua época de faculdade. Ela gostou tanto do projeto que até hoje segue de longe com uma parceria.

“Ela lançou uma plataforma, Feminismos Plurais, a gente participou de uma ação dela Junto pela Transformação, acabamos ganhando algumas bolsas de estudo para alguns estudantes ligados ao Pretança fazerem os cursos de formação na plataforma, foi bem massa”, lembra ela.

A importância do Pretança

O Pretança sempre foi um espaço de acolhimento e compartilhamento de experiências, aberto à participação de todos aqueles dispostos a aprender sobre pautas de questões étnico raciais. São pessoas negras e não negras motivadas a encarar essa discussão, aprendendo mais e agindo em diversas frentes. 

Com um perfil de sempre propor ações, o projeto muitas vezes lida com assuntos delicados, situações pessoais de violência, camadas complexas do racismo institucional e estrutural, colorismo, feminismo negro, e com isso, ele se torna um espaço de compartilhamento, onde todos entendem que não estão sozinhos.

“São pessoas que se sentem absolutamente à vontade para abrir o coração e falar de problemas de autoestima que sempre enfrentaram e a maneira como o projeto foi acolhedor para a pessoa dar conta. Tem gente que acaba mudando, se compreendendo como negra, pessoas que entram ‘ah sou parda’, por ter ouvido a vida inteira que ser negro é algo ruim e acabou negando isso e acaba mudando de opinião sobre si mesma assim, aceitando mais sua identidade, tendo orgulho assim”, diz Tatiana.

O projeto cria um ambiente para que as pessoas possam se ver como propositivas, e coletivamente também propõe temáticas para contribuir no combate contra o racismo, a luta antirracismo e para estudantes que não são negros colaborarem com a luta antiracista, entender um pouco as dimensões do racismo na sociedade e se entender como pessoas aliadas, poder contribuir, primeiro para a descontrução do racismo em si e ainda como pensar de maneira mais ampla na atuação, no seu entorno imediato.

“Ele tem uma importância grande para os estudantes, sobretudo os negros, nesse lugar de se ver ali, de se ver em outras pessoas, de terem suas demandas acolhidas, de ter gente que entende quando essa pessoa fala ‘eu sofri racismo’, ‘eu passei por essas situações’, ‘é difícil estar aqui como uma pessoa negra’,’é difícil ter chegado aqui’, comenta a idealizadora do projeto.

A luta contra o racismo

Segundo a professora Tatiana, os sistemas econômico e político, e a maneira como a sociedade funciona depende do racismo, são necessários marcadores hierárquicos e um deles é a raça.

“É muito cruel a maneira como a sociedade brasileira foi construída numa ideia de progresso que é racista, porque o progresso brasileiro é o genocídio indígena, é a escravização de pessoas negras e depois a subalternização sucessiva delas ao longo do tempo, não à toa a maior parte das pessoas pobres, 75% das pessoas que estão perto da linha da miséria no Brasil são pessoas negras, de acordo com os dados do IBGE. Então não tem jeito de ser eliminado de vez nessa geração quiçá na outra”, desabafa a professora.

Acabar com o racismo é algo complicado, mas é necessário diminuir a violência, e começar pelo entorno. Em uma instituição de ensino, responsável por educar pessoas para o mundo, é primordial a discussão desse assunto, e o Pretança é fundamental nessa batalha. No sentido institucional, a faculdade Una, vem buscando diversas maneiras para minimizar as situações de racismo, mesmo sabendo que é uma situação difícil.

“Por isso que eu gosto de olhar para o Pretança como lugar de acolhimento, porque combater essa violência é quase impossível do ponto de vista da tentativa de eliminá-lo, então a gente se acolhe, se fortalece mutuamente, traz pessoas aliadas para ajudar nessa luta, porque é uma luta e é preciso entender a dimensão dessa luta, cotidianamente as pessoas brancas desconstruindo o racismo dentro de si mesmas, as pessoas que estão à frente da gestão da instituição entendendo a dimensão do racismo institucional, as pessoas à frente de lugares de liderança, e poder em qualquer local entender como podem fazer diferença para diminuir as desigualdades”, conclui Tatiana.

O Pretança está sempre de portas abertas a todos, visite as redes sociais do projeto, no Facebook, Instagram e Youtube.

https://www.facebook.com/projetopretancauna

https://www.instagram.com/projetopretanca/

https://www.youtube.com/channel/UCOZraLVoSABf8NWSICwbYsg

 

Edição: Daniela Reis 

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Por Keven Souza

É com a postura vibrante e contente que o Contramão, celebra hoje, em dose dupla o sexagésimo aniversário do Centro Universitário Una, ao lado da aluna recém-formada que acredita, assim como a instituição, que o conhecimento é um instrumento poderoso na transformação do mundo.

Shirley Benedete de Figueiredo, que coincidentemente também comemora os seus sessenta anos, é uma mulher de trajetória edificante que radia superação e finalizou neste semestre a graduação de Gastronomia. Essa nova etapa em sua vida, significa que a determinação é o substantivo que realça seu caminho a não se limitar à idade, ela representa todos aqueles que compreendem a idade apenas como uma contagem biológica e não ligada à velhice.

Shirley Benedete

Em sua história de vida, desde muito nova, Shirley percebia o sentimento de felicidade que agitava em seu coração através de sua afinidade com a cozinha. O seu carinho pelo ambiente é uma relação pura e admirável, que permite salientar que o amor pelo universo gastronômico não é algo atual.

Para ela, a grande inspiração para adentrar na arte culinária veio de sua tia-avó Cecília, que percebia o gosto da sobrinha pela cozinha desde pequena e lhe ensinou conhecimentos incomuns e difíceis de se encontrar nos livros hoje em dia. Ao perceber sua paixão por receitas, a tia lhe deu o seu primeiro livro de culinária “Sei Cozinhar” de Maria Rosalina, que naquela época era o principal contato que estimulava seu dom pela elaboração de alimentos.

Com o passar do tempo, as experiências, as técnicas e o ato de cozinhar da Shirley foram sendo moldados conforme frequentava diferentes cursos e palestras gratuitas que saciavam o desejo de se especializar em Gastronomia.

Embora ardia em seu peito a paixão pela culinária, Shirley possui uma história de vida que foi conduzida por uma luta árdua entre suas escolhas pessoais e a de sua família. Por muito tempo, ingressar na graduação era sonho distante, já que aos 33 anos de idade se tornou mãe solo após o falecimento de seu marido.

“Minha vontade de fazer Gastronomia ficou guardada por muito tempo, em uma “gaveta”, eu que tinha quatro anos de casada em 1994, perdi meu marido, que faleceu me deixando com dois filhos pequenos”, explica.

Naquela época a falta do esposo, trouxe para sua família uma situação complicada e a opção mais viável era trabalhar e cuidar dos filhos. Os estudos se tornaram uma de suas últimas prioridades naquele momento.

Sua relação com a Una

Prato desenvolvido por Shirley em uma aula prática do curso de Gastronomia

Em 2017, quando estava decidida a dar seguimento em seus estudos, um longo período de pesquisa e indecisões para escolher qual escola de ensino superior se matricular, atordoou Shirley, que após dois anos, em 2019 iniciou o curso de Gastronomia na Una. Um dos critérios decisivos foi o índice de qualidade e o ambiente inspirador da instituição.

Na época, a visita da então estudante na Cidade Universitária, no campus Liberdade, foi um momento encantador para reforçar ainda mais o amor que sente pela culinária e compreendeu que aquela era a ocasião de retirar o seu sonho do papel. “Fiquei mais encantada e não tive dúvidas, já fiquei ansiosa para ter aula, mas tive que esperar até iniciar o período para vivenciar essa experiência e com isso reforçar o amor que eu sempre senti pela Gastronomia”, explica.

O vínculo da Shirley com a Una, amplifica os seus ideais e sua paixão pela cozinha, existe uma relação de carinho com a instituição, que segundo ela se aproxima da extensão de sua casa, e oportuniza o sentido em sua vida.

Sua conexão com os professores, docentes e colegas é formada por uma excepcional comunicação e uma ativa participação nos eventos institucionais, que desde o início obteve uma experiência formidável em relação ao curso e construiu laços amizade, capazes de auxiliar o seu crescimento pessoal e ampliar o network de sua área.

Além disso, no ambiente escolar, pratica a “cozinhaterapia” e incentiva alunos e professores a promoverem desafios gastronômicos, sendo exemplo de jovialidade que transparece apreço pela profissão até nos pratos e nas receitas, uma sonhadora pronta para novos horizontes e novos ciclos.

Rosilene Campolina, que é professora de Gastronomia e idealizadora do projeto Gastrouna, afirma que, é uma honra ser professora da Shirley e tê-la na turma é uma maneira de mostrar o quanto a Una navega em vários tipos de idade, classe social e poder econômico, que torna a sala de aula um ambiente inclusivo e plural.

Para ela, alunos como a estudante obtêm a oportunidade de fazer parte de turmas ecléticas que trocam sabedorias e conhecimentos únicos, essenciais para a formação, mas também para a vida toda.

“É um prazer dar aula para alguém tão engajada, comprometida e disciplinada. Às vezes lançamos ideias ou damos um trabalho, e você acaba tendo um retorno daquele aluno engajado que se interessa, e ela é assim. É um prazer dar aula pra ela” explica a professora.

Shirley e a professora Rosilene Campolina

Shirley completar sessenta anos finalizando a graduação, é relevante para desmistificar os limites impostos pela sociedade em relação a idade, demonstra que chegar ao sexagésimo aniversário é completar mais um ciclo de vida e que em qualquer idade, as pessoas são livres a seguirem seus sonhos e objetivos, sem ser dependentes.

Sua energia e seu empenho, a torna um exemplo plausível de força de vontade que muitas pessoas se identificam e se orgulham através de sua trajetória, e rompe com o tabu social de que um indivíduo chegar a uma idade avançada, significa ser uma pessoa incapaz e inválida na sociedade.

Por conseguinte, Shirley afirma que, a conclusão do curso de Gastronomia neste semestre, ficará marcada na sua história para além do currículo, o seu carinho e amor pelos colegas e professores da Una, permaneceram dando sentido a sua vida e que a partir de agora pretende seguir a carreira de Personal Chef, nos afazeres de almoços ou jantares esporádicos para conseguir otimizar o seu tempo e aproveitar a vida e sua aposentadoria.

“Sigam em frente, invistam nos talentos natos, promovam desafios gastronômicos para incentivar cada vez mais os Alunos e Professores”, diz a estudante para a instituição.

Receita

Ratatouille do Cerrado

Rendimento: 6 porções

Ingredientes:

225 g de cebola

150 g de batata-doce polpa roxa

350 g de batata-doce casca roxa

350 g de abóbora de pescoço

350 g de abóbora menina

120 g de maxixe

500 g de mandioca

400 g de carne seca

45 g de queijo coalho ralado

45 g de manteiga de garrafa

100 ml de creme de leite

sal a gosto

18 g de licuri picado grosseiramente

30 g de melado de cana

20 g de sementes das abóboras

Farinha de mandioca QB (quanto baste)

Azeite QB (quanto baste)

Modo de Preparo:

Picar a carne seca em cubos e deixar de molho em água no dia anterior, no dia seguinte cozinhar por 20 min, posteriormente desfiar. Refogar em 2 colheres (sopa) de manteiga de garrafa.

Cortar os legumes: em rodelas de 1 cm, cozinhar (separadamente) por uns 10 minutos, o ponto do cozimento deve ser al dente. Selar todas as rodelas em frigideira aberta com um fio de azeite.

Cortar o maxixe em rodelas de 0,5 cm, passar levemente na farinha de mandioca e selar em um fio de azeite para ficar crocante.

Cortar a mandioca em cubos e cozinhar em água com sal, até a mesma ficar bem macia. Em seguida escorrer e espremer ainda quente.

Fazer um purê, colocando numa panela aquecida 3 colheres (sopa) de manteiga de garrafa, a mandioca, o creme de leite, 2 colheres (sopa) de queijo coalho ralado grosso, sal à gosto.

Cortar a cebola Ciseler, refogar numa panela com um fio de azeite, mexer para não queimar, até ficar translúcida, acrescentar 2 colheres (sopa) do melado de cana.

Picar grosseiramente o licuri, as sementes de abóboras devem estar secas, juntá-las com o licuri e levar para uma frigideira aquecida para dourar e ficar tipo uma farofinha crocante.

Ralar o queijo em ralo grosso e reservar.

Iniciar a montagem na travessa, fazendo uma cama com a cebola caramelizada.

Colocar por cima a carne seca e em seguida o purê de mandioca. Após ir distribuindo alternadamente os legumes.

Finalizar colocando o queijo ralado e a farofinha (mistura do Licuri e as sementes de abóboras crocantes).

Levar ao forno para gratinar por 20 a 25 minutos à 200º C.

Servir ainda quente.

 

Edição: Daniela Reis 

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Por Tales Ciel 

Todo grande cineasta tem que começar de algum lugar, e o audiovisual, como toda forma de arte, consegue aproveitar bastante a universidade para iniciar suas experimentações e produções. Guilherme Jardim é co-diretor e roteirista do curta-metragem “Dois”, junto com Vinícius Fockiss. Jardim também é aluno do Centro Universitário Una e integrante da agência Una 360.

O curta conta a história de Bernardo e Luix, que buscam aproximação afetiva durante o período de distanciamento social e, em meio ao caos, tentam descobrir outras formas de amar. Foi contemplado pela 6ª Edição do Prêmio BDMG Cultural, nomeado Melhor Filme pelo Júri do Festival Kinolab Tela Digital 2021, e mais. Guilherme Jardim conta um pouco sobre o seu processo de criação de um filme independente e as algumas das dificuldades de produção em meio ao isolamento social.

Em parceria com o Contramão, o Núcleo de Relações Públicas e Cultura traz o Palco 360: onde os estudantes que integram a equipe podem exibir suas produções e trabalhos. Guilherme concedeu uma entrevista sobre seu filme e nos contou sobre sua vida profissional e a produção de “Dois”.

Como é o processo de produção de um filme?

Esse processo de elaboração de filme, pra mim a princípio é um processo muito aberto. Porque, normalmente, pode ser uma frase que me motiva a escrever um roteiro, pode ser uma imagem que eu vi e que tive vontade de fazer uma história baseada nela, pode ser de alguma história que já escutei. Então depende do caso.

O filme “Dois”, por exemplo, que é o filme que eu faço roteiro e direção, surgiu a partir de uma frase que tinha anotado num tipo de bloco de notas do celular. E a partir dali, fui moldando essa história junto com o Vinicius Fox, que é meu amigo e fez esse filme junto comigo. E a gente chegou onde o “Dois” é hoje.

 

Quais as dificuldades que mais te testaram durante o projeto de “Dois”?

As maiores dificuldades que eu enfrentei durante o processo de criação do “Dois” foram, primeiro: o filme foi idealizado e desenvolvido durante a pandemia do coronavírus; o início da pandemia. Então a gente já tinha a primeira dificuldade de produção que seria fazer um filme em dupla à distância. Não podendo nos encontrar e tudo mais.

E aí, depois, também de direção à distância. Porque é um filme que envolve dois atores, o Bernardo Rocha e o Luis Gabriel, e que se fala muito sobre amor em meio ao caos. Então tinha também essa diferença entre a realidade que estávamos vivendo e o que queríamos propor junto ao filme.

Fazer esse direcionamento, tentar se aproximar dos atores e criar essa relação mais íntima mesmo à distância, acho que foi a maior dificuldade. Mas ao mesmo tempo, também, foi a maior alegria, assim, dentro do filme. Porque, eu acho que todo esse processo acabou fortalecendo a mensagem que a gente queria passar com o “Dois” e o queremos propor com essa história. Então, até no meio dessas dificuldades, a gente acabou conseguindo criar novos caminhos, para que as coisas fossem possíveis mesmo de acontecer.

E eu acho que se fazendo cinema universitário independente, precisa ter muita dessa força; de tipo, tem que querer um pouquinho mais do que o normal. Porque qualquer coisa desanima e, enfim, a gente precisa ter essa consistência e acreditar nas coisas que a gente faz.

 

Como é conseguir/ter o apoio da instituição?

É, ter a universidade como apoio no processo facilita alguns passos, principalmente quando a gente tá desenvolvendo a escrita do projeto. Nas aulas a gente tem as orientações dos professores, que têm experiências diversas. Então, isso acaba agregando muito nesse processo de criação e eu acho que é um facilitador também. Muitas vezes nós ficamos em dúvida, inseguros com o que estamos propondo e é bom ter esse apoio junto aos professores, de mostrar a sua ideia e compartilhar e ir construindo juntos.

Acho que um ótimo exemplo no processo do “Dois” foi a nossa relação com a Mariana Mól, que era professora na época da disciplina de P.I. de ficção, e a gente tinha um diálogo muito aberto, muito horizontal. Muitas vezes nós chegávamos com uma ideia e – uma ideia embrionária, que seja – e conversava, e acabavam surgindo novas ideias no meio disso.

Também tem muito haver com o se questionar, sabe? Acho que a universidade dá também essa oportunidade para sermos mais críticos com os trabalhos que fazemos. Colocam a gente pra pensar: ‘Que história é essa?’; ‘Onde que a gente quer chegar com essa história?’; ‘Por que que a gente tá contando ela?’. E ter argumentos plausíveis e profundos. Ao meu ver, acho que cada caso é um caso, e pro “Dois” foi muito importante se questionar várias coisas, acessar memórias afetivas e ter essa troca mesmo; essa relação coletiva e horizontal com todo mundo que estava, de alguma forma, desenvolvendo esse projeto.

Até teve um caso muito marcante, que eu amo, que foi quando estávamos tendo uma das orientações com a Mariana e ela lembrou de um livro da Ana Maria Martins – Como Se Fosse A Casa. Ela lembrou de um poema específico e falou: “Olha, pelo que vocês estão me falando, me lembrei disso aqui!”. E nós estávamos numa reunião ao vivo e ela meio que abriu o guarda roupa, pegou o livro na hora e leu pra gente. Depois mandou as fotos, para termos o acesso, também, digitalmente, caso fosse interessante usar. Enfim, [usar] como uma inspiração e acabou virando, sim, uma das coisas que usamos de referência. E acho que, também, essa construção afetiva, sabe? Do filme, junto aos professores; acaba criando um corpo que [vai] além do que a gente consegue imaginar e querer. É muito natural e muito bonito.

 

Se pudesse citar um dos seus projetos favoritos, qual seria?

O “Dois” foi um processo muito íntimo pra mim. Tanto pela troca com o Vinicius, de pensar nisso juntos, sabe? Tanto [quanto] fazer um filme para que eu acreditasse no meu potencial. Eu estava vindo, antes do Dois, de um processo que eu me desacreditava muito. Das coisas que eu poderia propor. Eu não me via muito nesse lugar, principalmente de roteiro; tinha muita dificuldade de me enxergar ali. Acho que o “Dois” veio como esse “clareamento das retinas”, “uma correção da miopia”, onde era tudo embaçado pra mim. Acabou ficando mais claro, mais amplo; consegui enxergar mais longe. Eu consegui criar possibilidades a partir do que eu tinha.

O “Dois” também vem muito junto com o meu entendimento com o cinema, que tipo de cinema eu quero fazer. E tem muito haver com um termo que eu gosto de usar, que se chama: auto-ficção. Que é o compartilhamento das coisas que eu vivi e que vivo, e ao mesmo tempo, das coisas que eu invento. Como eu consigo pegar da experiência e transformá-las, também, a partir das coisas que eu queria viver.

 

Qual dica você daria pra si mesmo e os outros?

A dica que eu daria, tanto pra mim e pra outras pessoas seria de ficar sempre atento. Eu acho que o cinema se dá muito ao olhar. Pra quem curte esse tipo de produção hereditária, uma produção que fala sobre nós (eu com um realizador, não-binário, lgbtqia+), é da minha vontade criar imagens pensado nesses corpos e como que eu posso representá-los. É mais sobre a representação do que a representatividade. E como que, a partir da minha vivência e das coisas que eu acredito, posso propor novos imaginários e fazer esse processo de abrir caminhos; abrir mentes.

Enfim, para quem gosta desse tipo de cinema, a dica é estar atento às suas memórias, as coisas que você está vivendo no agora. Eu acho que tem muita coisa que a vida acaba trazendo e a partir [disso], talvez, igual o “Dois”, uma frase que se escreve num bloco de notas, acabe virando filme.

 

Edição: Daniela Reis

Revisão: Keven Souza

 

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Por Bianca Morais 

Com a proposta de sempre buscar inserir o aluno no mercado de trabalho,o Una Trendsetters é um projeto do curso de Moda do Centro Universitário Una e é uma grande vitrine para estudantes apresentarem suas coleções como trabalho de conclusão de curso.

Criado em 2010, inspirado pelo formato de outras escolas de moda do país, o então professor Aldo Clécius e o coordenador Júlio Pessoa. O projeto nasceu com o principal objetivo de apresentar os formandos de Moda da Una para o mercado de trabalho. Os alunos, assistidos pelos professores em todo o processo de produção, escolhiam um tema, trabalhavam em cima dele e depois materializavam aquilo em produtos de moda, toda a coleção era desenvolvida, desde roupas até acessórios, e exibidos em um grande desfile para importantes nomes do meio, de influenciadores na área da moda, a empresários e jornalistas.

Como a grande maioria dos eventos da instituição, o Una Trendsetters apresenta uma proposta multidisciplinar, que permite aos estudantes de outros cursos colaborarem com a sua participação. Cinema registrando as edições através de vídeos, a Estética ajuda no preparo dos modelos que irão desfilar no dia, a Gastronomia fica a cargo do coquetel de entrada,o Jornalismo faz a cobertura,  Publicidade e Propaganda e Relações Públicas ajudam na divulgação e a Arquitetura pensa no espaço, todos trabalham em união para conceber e realizar a parte executiva. 

O evento é destinado aos alunos concluintes do semestre de cada edição, na maioria das vezes todos eles eram agraciados com a participação, no entanto, quando a turma tinha um alto número de pessoas, eles eram submetidos a uma banca de avaliação e, em seguida, os melhores selecionados para participarem como forma de premiação.

Sempre de maneira muito profissional, o Una Trendsetters mostrava a qualidade dos trabalhos produzidos por aqueles estudantes, os apresentando a grandes nomes e marcas da moda mineira. Desde sua primeira edição, ele evoluiu tanto que passou a contar com apoio de voluntários, aprendizes de outras escolas de nível técnico, parcerias com o SENAC, entre outros, o que fez ele ser lembrado por todos.

“O Una Trendsetters ganhou essa vida própria, essa autonomia ao longo dos anos por ter se mostrado um evento do ponto de vista interno, capaz de trazer oportunidade para o aluno de experimentar algumas atividades profissionais, em suas respectivas áreas, um celeiro de chances e de aprendizados para eles”, comenta a professora e co-criadora Renata Canabrava.

A evolução do Una Trendsetters

Marca: Madô – A Estética de Erté – Por Amanda Barbosa

Sua primeira edição aconteceu na Casa Una, com clima de aconchego, o prédio histórico foi o palco daquele evento que ao longo dos anos se revelaria gigante. O Una Trendsetters já passou pelo Iate Tênis Clube, Ilustríssimo, CentoeQuatro e se tornou tão gigante que não tinha outro espaço para ocupar a não ser o Mineirão. Para aquela cerimônia que começou de forma tímida dentro do campus, migrar algumas de suas edições para o Salão Panorâmico do maior estádio de futebol da capital, foi uma grande conquista.

Marcante e grandioso, são as palavras usadas pela professora Renata, que viu o projeto crescer com os anos, para descrever aquele momento.

“Ele ganhou atenção institucional, reforço e recebeu aporte, desde a seleção de equipamentos, a gente conseguiu melhorar a qualidade da iluminação, do som, das locações onde ele vinha sendo realizado, ampliar o público presente no evento, e com isso,  envolver mais áreas do conhecimento na concepção e outras características ao longo de sua realização”, completa ela.

Dentro do mercado da moda, o Una Trendsetters passou a ganhar projeção e ser notado, se tornou algo esperado pelos jurados e as pessoas que o avaliavam. A cada ano eles eram surpreendidos por uma apresentação repleta de surpresas e performances pouco convencionais. 

“Tentamos trazer um olhar diferente para esse evento, fazer as coisas não apenas do modo tradicional, o desfile não era só como a gente tinha concebido em mente, mas ele sempre vinha meio performático, com elementos surpreendentes e isso chamava muito a atenção do público”, relembra Renata Canabrava.

“O Una Trendsetters é um marco na história do curso de Moda da Una, pessoas dentro e fora da área aguardam por ele, conseguimos nos colocar em um lugar, onde somos responsáveis por proporcionar a experiência e emoção de estar presente em um desfile com toda a pompa e estrutura que um grande desfile de marcas reconhecidas oferecem, mas agora acessível a toda a comunidade” acrescenta Letícia Dias.

O curso de Moda 

Fruto de muito trabalho, o curso de Moda da Una, foi o primeiro bacharelado a conquistar a nota 5 do MEC no estado, resultado construído de forma coletiva pelos alunos, professores, colaboradores, coordenação e direção. Essa nota teve um sentido muito além do mercadológico, mas foi o reconhecimento acadêmico da qualidade que todos os profissionais envolvidos investiram para que o curso formasse tantos talentos. 

Referência em Minas Gerais na qualidade de ensino, acolhimento, inclusão, diversidade e na estrutura oferecida para a realização das atividades práticas acadêmicas, extracurriculares e desenvolvimento pessoal, o curso tem três laboratórios com equipamentos novos, de alta qualidade e performance e abertos para utilização dos estudantes. 

Desde 2004 o curso de Moda tem o seu próprio Laboratório de Moda, Têxtil e Fotografia. Ele começou dentro do Núcleo Laboratorial da Una, situado no Campus Liberdade, com a necessidade de mais espaço foi remanejado para o ICBEU, e em 2018 transferido para o Campus João Pinheiro 2, onde está até hoje.

Atualmente nomeado Numo, Núcleo de Moda, faz parte da Fábrica, coletivo dos laboratórioa de Economia Criativa.

“A missão do Numo é acolher os nossos alunos e complementar o processo de formação acadêmica com práticas relacionadas a todo o universo que envolve a Moda. O objetivo é oferecer um espaço colaborativo para práticas, brainstorm, conexões, network e que os nossos estudantes sintam-se à vontade para pertencer e compartilhar”, explica Letícia, líder do laboratório.

O Numo trabalha ativamente nas edições do Una Trendsetters, e enquanto nas passarelas apenas podem subir os formandos, o laboratório dá a oportunidade a todos os aprendizes do curso de moda, independente da experiência, a emergirem no processo de produção do evento, como na criação e confecção de bolsas para o PressKit , destinado a Imprensa Brasileira, influencers e empresários, e nos backstage, envolvendo-os nas etapas necessárias para que o desfile da marca aconteça. 

Abrindo portas para o mercado

Marca: OSZ Eduardo Oldzelweski

Todos os alunos que já passaram pelas passarelas do Una Trendsetters se mostraram profissionais de grande excelência para o mercado, é ali que eles dão seus primeiros passos, que idealizam, concebem e executam todo o desfile, é onde o mercado vai enxergá-los pela primeira vez, o projeto gera conexões e é uma verdadeira vitrine de talentos. Muitos são os formandos que saíram do desfile com convites para trabalhar em empresas, desfilar em semanas de Moda renomadas no exterior.

Trabalhos de vários estudantes saíram do papel e se tornaram profissionais, um exemplo deles é o da aluna Maria Cepellos. A garota apaixonada pela moda, costurava e sempre teve a vontade de se envolver mais em todo o processo, da criação até a produção, por isso, ingressou na faculdade de moda da Una. 

Modelo desfila look da Maria Cepellos

No segundo semestre de 2019, a jovem participou do UnaTrend, com sua coleção de tema “Grafitte”, o desfile foi um sucesso, mas o que ela jamais poderia imaginar era o que estava por vir. Primeira ela recebeu um convite para se apresentar no Vancouver Fashion Week, a maior semana de moda do Canadá e segunda maior da América do Norte. 

No ano passado, veio o convite para se apresentar em Nova Iorque, na Curate, e fazer parte do showroom como a primeira brasileira no evento. Em 2021, o convite para participar do New York Fashion Week em 09/2021 ou 02/22.

“Una Trendsetters está em meu currículo, participar dele foi sensacional, me abriu portas e possibilidades que eu jamais imaginei que aconteceria, embora desejasse. A quem está começando o curso agora eu digo, se dediquem, aproveitem ao máximo o conhecimento desses grandes mestres que aí estão porque as oportunidades virão”, diz a designer de moda.

Vitrine de talentos

Rene Benjamin sempre sonhou com o Una Trendsetters. Antes de desfilar com sua coleção, o rapaz foi voluntário durante três anos consecutivos como camareiro e para ele aquele dia marcou sua vida.

Rene comemora o sucesso da sua coleção nas passarela

“ O Una Trendsetters representa muito pra mim, foi como o dia do meu casamento , eu lembro que eu vivi para aquele momento, meu pai conseguiu ir, minha prima-irmã, algumas das minhas melhores amigas, todas as professoras e colegas estavam ali, formei do lado de pessoas maravilhosas, e com aquele gosto de dever cumprido, foi emocionante”, compartilha Rene. 

ANUM foi a marca de roupas criada por ele, voltada para o público masculino NightWear/Urbano.“Criei o conceito de urbano rural e fui construindo as bases para a minha marca em cima da minha história. Nasci no interior de Minas e depois fui para grandes centros urbanos, a minha marca é urban/streetwear, mas com temas de folclore regional. O símbolo da minha logo é o Anú, um pássaro muito comum no interior onde cresci admirando-o ele. Na minha coleção e na minha marca eu abordei temas como o Folclore e o Cyberpunk”, explica o designer que é apenas um dos exemplos de como o UnaTrend permite ao estudante explorar toda sua criatividade.

“O Una Trendsetters me deu muita bagagem como criador, também como camareiro, fotógrafo e etc. O Network de pessoas é muito bom, e gostaria que depois que essa pandemia acabasse pudessemos nos reunir em BH e dar continuidade a isso”, completa o jovem. 

Vanessa Araújo passou pelo Una Trendsetters e deixou seu estilo romântico registrado no evento. Voltada para noivas da classe C, com o nome de Afetiva Dress, a designer desenvolveu uma marca onde as noivas pudessem contar sua história através da roupa com um preço acessível e boa qualidade no acabamento.  

Modelo desfila com vestido criado por Vanessa

Com o tema “Deusa nos contos”, faz um paralelo entre as deusas da Grécia Antiga e as princesas dos contos clássicos, sua coleção veio com bordados artesanais em flores, silhuetas em A, tecidos fluidos e com releituras do véu clássico da noiva. 

“No desfile foi um turbilhão de emoções. Quem vê todo o glamour não imagina como nos bastidores tem todo um trabalho árduo mas prazeroso. O UnaTrend é muito bem organizado, cada um na sua função ajudando uns aos outros. O desfile foi muito importante para nós alunos formandos, tivemos a oportunidade de mostrar nosso trabalho para pessoas importantes e influencers locais”. 

Segundo Vanessa, a chance que teve de realizar um desfile logo no início de sua carreira foi incrível, afinal, os novos designers geralmente demoram um tempo para serem vistos no mercado da moda, e para se fazer um desfile, deve haver um investimento que quem está começando no mercado, ainda não tem condições.

“Com o UnaTrend, tivemos essa oportunidade oferecida pela Una, hoje seguimos na luta de realizar nossos sonhos e colocar nossa criatividade para agregar na moda mineira”, diz ela.

Samile Fernandes é dona da marca que recebe seu nome, e teve a coleção inspirada em suas memórias afetivas. O tema escolhido pela designer foi “De Açucena para o mundo: Memórias Afetivas do Café”, onde falou sobre as memórias que carrega consigo de seu pai Nelito e seu avô Sebastião.

“O elemento que os dois tinham em comum era o cultivo do café para consumo próprio e o gosto que ambos carregaram por toda a vida pelo produto, o que virou matéria prima para a coleção. Além dos dois serem de Açucena, uma cidade no leste de Minas , outro símbolo que usei foi a flor de Açucena, que além de linda, retrata nobreza e simboliza a dor da perda de um grande amor, no meu caso os dois falecidos”, conta Samile.

Sua coleção retrata a casa de pau a pique, local onde o avô morou por toda a vida e criou os filhos, as memórias que eles deixaram, as raízes que simbolizavam seu sentimento foram retratadas em bordados e pedrarias. Pai e avô usavam muito blazer, por isso, ela decidiu usar a alfaiataria como norte, e no dia do desfile usou o blazer do casamento de seu pai. 

“Abrir o desfile foi desafiador, emocionante e uma grande responsabilidade. Marcou a minha vida, porque ali eu tive a oportunidade de falar de dois heróis, de mostrar a importância deles na minha formação como pessoa e profissional. Eu tinha propriedade para citar o quanto tem pessoas que nos inspiram, nos dão força de seguir, nos dão o ar e na coleção, eu quis que ficasse claro o quão precioso foi trazer a memória deles para todos, o meu sentimento foi passado para cada peça”, conclui.

O UnaTrend traz ao Centro Universitário Una um reforço de imagem e reputação muito grande, é mais uma vez a instituição colocando a cara no mercado, mostrando ao mundo o que os alunos da faculdade são capazes, de produzir, criar, educando da maneira certa os estudantes e os transformando em profissionais de excelência que levam o nome Una ao redor do mundo.

 

Edição: Daniela Reis

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Por Bianca Morais 

O curso de Gastronomia do Centro Universitário Una é referência não apenas em Minas Gerais, como em todo o Brasil e muito se deve à postura que a faculdade e seu corpo docente assumem em buscar maneiras diferenciadas de conectar o aluno com o mercado. 

Dentro dessa proposta de empregabilidade ao aluno, nasceu o GastroUna, o principal evento de Gastronomia da instituição. Com dez edições bem-sucedidas, o projeto propõe aos estudantes do último período do curso a elaborar um projeto técnico científico, que consiste na criação de um negócio, que envolve desde nome, logomarca, plano de negócio, planejamento estratégico, ações de marketing, construção de cardápio, definição do público-alvo e execução. A mostra acadêmica é uma proposta com visão empreendedora que tem a função apresentar e inserir os participantes no mercado de trabalho, sua realização acontece sobre três eixos temáticos, sendo eles: visão empreendedora, sustentabilidade e a inovação.

Todo semestre, os estudantes se reúnem em grupos e trabalham em seus projetos, no dia do evento, eles se apresentam à bancada de jurados, que é sempre composta por grandes nomes da Gastronomia, o que proporciona a eles além da experiência, a possibilidade de estabelecer uma rede de contatos, uma verdadeira vitrine para quem está ingressando na área.

O GastroUna sempre foi um trabalho interdisciplinar, que permite aos alunos fazerem essa ligação com os vários campos que a academia oferece, e para isso, eles contam com o auxílio não só dos professores, mas com toda uma rede de colaboradores da Una. O curso de Cinema, por exemplo, é muito ativo no evento, sempre produz vídeos que são divulgados antes, durante e após o evento. Já no dia, o Cinema une-se ao Jornalismo para realizar a cobertura, entrevistando alunos, júri e convidados. Atendendo as demandas dos alunos eles também recorrem a cursos como Publicidade e Propaganda e Design Gráfico para construção dos negócios e o que for necessário para o sucesso de suas apresentações.

O início de tudo

Rosilene Campolina é chef de cozinha e professora do curso de Gastronomia, além disso é idealizadora do projeto GastroUna. Em 2016, ela ministrava a matéria de Projeto Interdisciplinar e foi quando teve a ideia de renovar aquela disciplina que trazia em sua ementa a inovação. “Já que trabalhávamos nesses projetos com foco no empreendedorismo, nada mais interessante do que fazer essa conexão, estabelecer essa ponte entre o aluno e o mercado de trabalho, com profissionais da área todos envolvidos”,  explica Rosilene.

No começo, o GastroUna era um evento apenas com barraquinhas distribuídas no pátio da instituição, onde cada grupo preparava sua receita e vendia para o público. Rosilene guarda boas lembranças da época e da “Gastrourna”, uma urna onde o público depositava seu voto de melhor prato. “Os alunos vendiam, as pessoas compravam e existia uma disputa entre os grupos, era uma adrenalina danada, porque todo mundo queria vender muito para ganhar”, conta a idealizadora.

O projeto cresceu, saiu daquele modelo mais tímido e tomou conta do auditório da unidade João Pinheiro, ganhando ali um caráter mais objetivo e focado. “Mudamos o formato de feira para a mostra acadêmica, até porque às vezes o aluno focava muito em vender, queria ser o melhor e esquecia um pouco da gestão, da parte administrativa do negócio”, completa a professora.

O GastroUna é um trabalho científico, com apresentação e conceitos bem definidos, além da prática que acontece no dia do evento, por trás os alunos realizam um denso trabalho de pesquisa e fichas técnicas de todos os produtos, obedecendo as ordens da ABNT, com o principal objetivo de tornar aquele estudante um profissional capaz e proativo. 

Segundo Rosilene em dez edições, somando-se a participação de forma direta ou indireta, seja de pessoas assistindo, de empresas patrocinadoras, de professores, alunos de gastronomia e até de outros cursos que atuam de outras formas no evento, como os de arquitetura, comunicação, gestão de negócios, marketing, se tem cerca de 9 mil pessoas que passaram por ele. 

Os parceiros

O GastroUna se consagra como uma vitrine de empreendedorismo para o mercado e envolve o cenário gastronômico, hoteleiro e turístico de BH. Desde a sua primeira edição, o júri técnico, responsável por julgar os trabalhos junto com o popular, conta com parceiros renomados e bem eclético. O evento busca trazer o melhor do mercado, dos setores público e privado, com a intenção de dar aos alunos a abertura para diversas áreas. 

Um deles é o chef Eduardo Maya, idealizador do Comida di Buteco e da Feirinha Aproxima, parceiro consagrado do GastroUna, presente desde a primeira edição do projeto, está sempre proporcionando grandes oportunidades, não apenas aos vencedores, mas a todos os alunos que participam.

Em uma das edições, o grupo “Bom Caldin”, foi convidado por ele para participar do “Uaini Night”, na Casa Fiat de Cultura, festa que Eduardo estava planejando para um público de cerca de 500 pessoas. “Ele tinha montado muitos stands no jardim da Casa Fiat para vender os pratos que fossem acompanhar os vinhos, gostou tanto dos caldos que esse grupo fez, que me perguntou se eles dariam conta de participar do evento, todos ficaram muito empolgados de atuarem em um evento grande, fizeram muito bonito e venderam tudo”, relembra Rosilene.

Eduardo Maya também já convidou os vencedores do evento para participarem da feira gastronômica Aproxima, e do festival Django Beer, em todos eles os alunos têm a oportunidade de vender os pratos que fizeram e o lucro fica com a equipe

“É um projeto inovador, muito bem executado e elaborado, ele procura transportar os alunos para o universo real, a vida real, o emprego real, o trabalho real e a empresa real, gosto muito desse projeto”, comenta Eduardo Maya.

Márcia Nunes, do restaurante Dona Lucinha, é outra jurada de peso que sempre marca presença no GastroUna. Marcia seguiu o legado da mãe que dá nome ao estabelecimento, administra o restaurante, é escritora e historiadora. Desde a primeira edição, o conceituado restaurante de Belo Horizonte, proporciona aos vencedores um almoço ou jantar para toda a equipe.

“É surpreendente o envolvimento dos estudantes dentro desse projeto, porque o que traz de experiência para eles do ponto de vista de maturidade, de conhecimento para empreender logo quando estão se formando, é um preparo, um pé no terreno daquilo que será a realidade prática deles. A academia fornece todo suporte teórico, mas eles precisam compreender o mercado, então a Rosilene teve uma sacada muito genial de trazer o mercado para dentro da academia”, reforça Marcia Nunes.

Além dos jurados que sempre apoiam o projeto, ele ainda tem parcerias muito importantes, como da Prefeitura de Belo Horizonte, Belotur, Abrasel, Capim Cheiroso, Sabará e Sabor, Sabarabuçu, Emater-MG, entre outros.

Alunos de sucesso

O Gastrouna já cumpriu seu dever na vida de muitos dos estudantes que passaram por ele, além de terem tido a oportunidade de trabalhar em diversos festivais gastronômicos, como o Festival de Sabará, de Congonhas, Caxambu, e criar um imenso network, muitos alunos conseguiram também se emplacar no mercado.

Carol Silva, é uma dos exemplos de sucesso, hoje a campeã de 2018 do GastroUna administra um buffet, um delivery, além de ser distribuidora de uma marca de utensílios de cozinha, a Royal Prestige, multinacional americana, que conheceu através do evento.

No ano em que venceu, ela e seu grupo foram convidados para participar do Arraial de Belo Horizonte. Na época, estavam selecionando os melhores grupos de cada faculdade de Gastronomia, a seleção da Una foi através do GastroUna, assim eles foram escolhidos para venderem seus pratos juninos na festa, participaram dois finais de semana consecutivos, ganharam ingressos, foram entrevistados pela imprensa, uma grande visibilidade.

“Meu prato foi um dos premiados, através dessa premiação eu tive visibilidade em vários jornais e isso foi muito importante para o meu crescimento como profissional, isso me fez crescer muito”, conta Carol.

A chefe de cozinha garante que o GastroUna foi um divisor de águas em sua vida, é muito grata com tudo, já que para ela foi uma experiência muito importante e que trouxe grandes ensinamentos

“Ele me ajudou muito no quesito de gestão de negócios, me preparou para ser a empreendedora que eu sou hoje, então foi muito importante para mim, abriu muito meus olhos para o negócio, abriu várias portas, me ensinou muito a como me comportar, buscar parcerias. Cresci muito como empresária, como mulher, como chefe de cozinha, e tudo através do GastroUna”, completa ela.

Carol Silva é apenas um dos vários talentos revelados pelo GastroUna.

O formato online

O evento sempre aconteceu de forma presencial, que dava ao júri e plateia a experiência gastronômica de provar todos aqueles pratos incríveis produzidos pelos grupos. No entanto, com o início da pandemia, ele precisou se adequar, e suas últimas duas edições virtuais foram de muito sucesso.

O formato remoto proporcionou novas propostas ao evento, como a participação, por exemplo, do chef Paulo Rodrigues, chefe da embaixada brasileira no México e diretor da federação latina americana de gastronomia, que apenas pode ser pelo padrão online, o evento também foi transmitido pelo youtube com intérprete de libras, e por isso teve um alcance muito grande sendo assistido por pessoas de todo o mundo. 

Nessa última edição online, ainda teve o lançamento do primeiro e-book do GastroUna em comemoração a décima edição, onde foram divulgados as receitas dos grupos e seus empreendimentos.

“Essas iniciativas são muito importantes, porque os alunos já aproveitam seu repertório, aquilo já faz parte do seu sonho, e a gente tá aqui, como mediador, para ajudá-los a realizá-lo, o ajudando a criar portfólio e contatos” acrescenta Rosilene.

O reconhecimento

Em 2017, o GastroUna foi tema do terceiro Congresso Nacional de Metodologias Inovadoras no ensino superior, o GIZ, realizado pela Universidade Federal de Minas Gerais. Rosilene foi representar a Una, com o projeto que nasceu pequeno com a feira e hoje é uma mostra acadêmica que a cada ano se supera em números e participações.

Em sua última edição, o evento recebeu uma honraria concedida pela Prefeitura de Belo Horizonte, através da Secretaria Municipal de Assistência Social, Alimentar e Cidadania, a professora Rosilene Campolina, foi agraciada com o certificado de mérito por colaborar com o desenvolvimento da gastronomia no município, entendendo que o GastroUna contribui para a cadeia produtiva da gastronomia, com formação que potencializa inovação, empreendedorismo, responsabilidade social e o uso sustentável dos alimentos, unindo tradição e modernidade. Com essa trajetória o GastroUna contribui e fortalece o título de cidade criativa da gastronomia de Belo Horizonte. 

“Eu fico com um sentimento de mãe, de realização e satisfação, de um projeto que deu certo, que acreditei nele, começou pequeno mas com as buscas por parcerias de pessoas que eu conhecia de dentro do mercado foi crescendo, motivando alunos. É um evento trabalhoso, mas que é muito gratificante e eu espero que ele possa continuar colhendo bons frutos”, complementa a idealizadora.

O GastroUna é o encerramento do ciclo da aprendizagem do aluno na faculdade e a sua entrada no mercado de trabalho. Dentro de suas principais contribuições, inclui-se destaque dado ao planejamento dessas aulas com tecnologias inovadoras, utilizando visita técnica, conexão com o mercado, promovendo a interlocução entre a produção acadêmica e a prática da gastronomia sustentável, com visão empreendedora, o diálogo interdisciplinar, para atender essa complexidade da formação do aluno, aprofundamento dos conhecimentos acadêmicos e a interface de culturas locais e globais, contemplando a dimensão científica a ética, estética e produtiva no contexto da gastronomia.

O GastroUna é mais um dos projetos Una, que há 60 anos busca envolver o aluno a experimentar sua área de atuação, a inclusão social e o desenvolvimento local transformando o seu redor.

 

Edição: Daniela Reis