#Crônica: Paixão Passageira

#Crônica: Paixão Passageira

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Foto: tumblr

Eu o encontro todos os dias na Avenida Silviano Brandão. No ponto de ônibus. Nunca conversarmos. Mas me chama a atenção seu jeito triste. Sempre com um fone nos ouvidos. Sempre com um cigarro na boca. Sempre com um livro em mãos. Nunca ri. Nunca fala com ninguém. Ele é sozinho. Pelo menos é o que eu percebo nos minutos que ficamos juntos esperando o ônibus. Não posso evitar querer saber mais sobre ele.

Talvez este rapaz não seja triste. Talvez esteja apenas cansado do longo dia trabalho. Talvez não goste de conversar ou de sorrir depois de levar uma bronca de seu chefe por demorar a voltar do horário de almoço. Talvez ele seja feliz, muito feliz. Mas meus olhos o veem daquele jeito, e isso me faz pensar em como a tristeza está presente em nós.

Seus grandes olhos azuis não possuem um brilho, seus cabelos perfeitamente bagunçados ficam escondidos por um boné, sinto-me atraída por todo aquele mistério e solidão que o cerca.

Ele fuma para sentir um pouco de satisfação em algo. Mas isso só denuncia seu vazio, sua solidão. Talvez seja daí que venha sua tristeza: do desamparo, da rejeição por ter um emprego ruim, por fazer um curso no qual não se sente feliz. Talvez.

Meu rapaz solitário não ouve os sons do mundo. Ele está sempre com seus enormes fones nos ouvidos. Talvez ouça músicas alegres para espantar os pensamentos tristes que insistem em lembrá-lo o enfado do dia a dia. Mas talvez goste simplesmente de esquecer que a realidade emite sons desagradáveis. Talvez ele queira apenas fugir no barulho de um rádio ou em uma canção que a faça acreditar que a vida será melhor.

Continuo sentada no banco do ponto de ônibus. Ele entra no ônibus que o levará para casa ou até à faculdade. Não há despedidas, mas ele olha para trás uma ultima vez. Eu sei que o encontrarei no próximo dia e ele talvez saiba que irá me encontrar também.

Por Isabella Silmarovi

 

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