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Alunos do ensino médio e universitários sofrem com a falta de aulas presenciais e práticas de estudos

*Por Bianca Morais

Na semana passada trouxemos o relato de Nathália Fernandes, professora do ensino fundamental, e de Joyce Mariano, mãe do pequeno Bernardo, estudante do 2°ano do fundamental. Através da reportagem foi possível reconhecer como tem sido difícil a educação infantil através da internet.

No Brasil, de fato, foi a primeira vez que nos deparamos com crianças tendo aula online, porém muitos jovens e adultos já eram adeptos a esse método, conhecido como EAD – Ensino à Distância. O EAD sempre foi uma excelente solução para quem não tinha tempo de frequentar as aulas presenciais. E com o tempo, muitas instituições que antes eram predominantemente presenciais, passaram a aderir às aulas híbridas, uma mescla entre online e presencial, isso acontece com muitos cursos que possuem aula teórica e prática, por exemplo.

Com a pandemia, não houveram escolhas e o ensino obrigatoriamente se tornou remoto. No entanto, muitos jovens acabaram se frustrando com esse novo método. A falta de socialização com os colegas, o fato de não poder frequentar laboratórios para disciplinas práticas, não ter o professor presencialmente para tirar dúvidas e por aí vai, são inúmeras insatisfações e incertezas. 

O crescimento profissional

Micheli Cristiane dos Reis Lana, 47 anos, atua como técnica em contabilidade. Micheli iniciou seu curso de Ciências Contábeis em 2016, no Centro Universitário Una, e se formou no ano passado. Por opção, escolheu um curso EAD, para não ficar longe dos filhos, na época com 6 e 13 anos. 

A profissional se formou no técnico em 1990 e trabalhou durante 25 anos em uma construtora e foi responsável pela contabilidade do lugar, mas em 2015 a empresa fechou e ela foi demitida. Ao procurar por um novo emprego percebeu que mesmo com a experiência que tinha o mercado demandava um curso superior. Então, Micheli se deu conta que para conquistar novas oportunidades e crescer no mercado de trabalho deveria voltar a estudar.

Quando o assunto é ensino online, é fato que ele não pode ser comparado ao presencial, afinal são duas metodologias diferentes. Dentro de uma sala de aula existe a constante troca de conhecimento entre aluno e educador, esse talvez seja um dos pontos em que o online mais perde.

“Não tive a oportunidade de ter um professor para tirar as minhas dúvidas no momento em que estava estudando. Em muitos casos, tive que me virar para entender a matéria. Após um dia cansativo de trabalho, nem sempre estava com disposição para estudar” desabafa a técnica.

O aluno que escolhe um curso online, com certeza, tem um elemento a mais em sua trajetória, a dedicação. Não é fácil enfrentar, por exemplo, a falta de suporte, apesar disso quando se tem um objetivo vale a pena. Micheli garante que se tivesse a chance de escolher entre fazer uma graduação presencial ou online, mesmo com as considerações, ela encararia o online novamente.

“Quando era mais nova tive oportunidade de fazer a graduação presencial e não tive interesse. Foi através da online que me senti estimulada. É um desafio enorme, mas com disciplina consegui formar”.

A prática prejudicada pelo online

Há aqueles que não escolheram o ensino online, mas que acabaram sendo inseridos nessa nova realidade forçada. É o caso dos estudantes da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

A UFMG foi uma das que mais sofreu devido ao coronavírus. Diferente de instituições particulares, a universidade pública não conseguiu continuar as aulas após a suspensão do presencial, no dia 18 de março, do ano passado. Os universitários ficaram cinco meses sem aula, perderam o semestre que voltou de forma remota apenas no mês de agosto.

Gabriela Guimarães, 23 anos, é aluna de fisioterapia na instituição. O curso escolhido pela jovem é totalmente presencial. A fisioterapia forma profissionais capazes de atuar na prevenção e na reabilitação da capacidade física e funcional das pessoas, com isso, as aulas práticas são o ponto forte de sua educação e se encontram completamente defasadas.

O fisioterapeuta precisa de muito treino para aprender, e sem dúvidas em cursos como esses, os alunos sentem na pele a falta dos laboratórios. “A fisioterapia exige um contato muito próximo com o paciente, para tratar dele eu preciso saber algumas técnicas manuais, onde pegar, de que forma fazer os exercícios” conta a universitária.

Além disso, a falta do educador ao lado também é uma preocupação. “Não ter alguém para falar se estou fazendo certo, errado, se a quantidade de força que estou usando é suficiente ou não é bem ruim” desabafa a jovem.

Por um lado, se esses alunos da área da saúde sofrem com o ensino a distância, os professores e coordenação se mostram dispostos a tentar diminuir essa defasagem. Os educadores elaboram aulas bem explicativas, utilizam diversos recursos de vídeos e monitorias.

“Eles estão mais abertos a nos ouvir e tirar nossas dúvidas, eles fazem alguns vídeos de práticas também para que a gente consiga acompanhá-los da forma correta”, explica Gabriela.

A tolerância com prazos é outro ponto positivo que a universitária enxerga nesse momento, até porque, segundo ela, o número de atividades aumentou bastante e sua turma têm experimentado uma vivência do ensino online que demanda muita disciplina e esforço.

A cobrança do ensino online

Muito se engana quem acha que pelo fato dos alunos estarem em casa, a vida deles é mais fácil. Ao contrário, o ensino online vem sendo sinônimo de muita cobrança e sobrecarga em cima de grande parte dos estudantes.

Kamilla Antunes, 21 anos, cursa psicologia na PUC-MINAS. Segundo a jovem, estar em casa passa a impressão de que o tempo investido não é válido, em virtude da comodidade apresentada. O fato de poder escolher em qual ambiente da casa quer assistir a aula, ou até mesmo o “fazer lanchinhos” durante ela, não significa que não exista esforço ali.

“Tanto por parte dos familiares, quanto dos professores, já tive essa sensação. Os familiares que agora com mais frequência soltam o famoso, “ah, mas você só está estudando?”, como os professores, que associam o tempo em casa com maior tempo para fazer as coisas da faculdade, passando mais trabalhos e exigindo cada vez mais” desabafa a jovem.

É de comum acordo entre os estudantes, que independente das horas de aulas serem as mesmas, o aproveitamento e rendimento não são. Por mais que no começo os educadores tenham se esforçado ao máximo para se dedicarem às plataformas e ao ensino, com o tempo é possível ver um desânimo sobre suas performances.

“Me sinto prejudicada, não consigo captar tudo através da tela. Na psicologia nosso objeto de estudo é o ser humano, e essa falta de contato com práticas, mesmo com os professores me deixam insegura“, confessa.

As instituições de ensino superior, sempre graduaram alunos através do EAD, e isso não os tornaram trabalhadores menos competentes, o que faz um profissional não é apenas a faculdade, é a própria pessoa. No entanto, pela primeira vez é possível ver determinados cursos, antes com matérias específicas as quais deveriam ser feitas de forma presencial, sendo onlines, cresce, dessa forma, na cabeça do aprendiz a dúvida se ele realmente será capaz.

A faculdade de Kamilla, fez adaptações das práticas do curso, introduziu atendimentos e supervisões para o formato online, fizeram parcerias com algumas instituições e centros de ensino para articular palestras feitas pelos alunos, com o intuito de contribuir e amparar outros que passam dificuldades neste período de adequação.

As instituições de nível superior, as quais oferecem a psicologia em sua grade, sempre buscou prestar serviços à comunidade. Grande parte dos universitários da área, sonham desde que ingressaram na faculdade com esse atendimento, lidar diretamente com as pessoas, ajudar o próximo, isso se quebrou muito durante a pandemia.

Muitas vezes, o online não alcança a todos, muitas das pessoas, principalmente essa camada da sociedade a qual não tem condição, também não possui acesso a internet, o que dificulta bastante. O cenário de incertezas continua e esses estudantes da área da saúde enfrentam diariamente uma dura realidade. 

O esforço de quem ainda sonha com o ensino superior

Para quem ainda está no ensino médio, um dos momentos mais esperados, sem dúvidas, é o famoso terceirão. Ano de conclusão de uma jornada, de se despedir dos amigos, dos professores e de todo ambiente acolhedor que é uma escola. O terceiro ano é de transição, além de todo esse clima de nostalgia, existe também a pressão dos estudos, afinal, é a hora de fazer o Enem, prestar vestibular e tomar a grande decisão do que o jovem será para o resto de sua vida: escolher que profissão seguir. 

Marcela Castro Rincon, tem 18 anos, e concluiu o ensino médio no conflituoso 2020. No começo, era um afastamento de 7 dias, que se tornou 15 e finalmente se deu em tempo indeterminado. A implementação das aulas online na escola particular de Marcela, não aconteceu de forma imediata, pois os professores precisaram passar por um curso a fim de aprofundar seus conhecimentos sobre o funcionamento da nova plataforma de ensino na internet.

Com o recomeço das aulas, o que já era esperado por muitos aconteceu, o rendimento caiu muito. “O abismo entre o rendimento de um aluno no sistema presencial e no remoto é gigantesco”, conta Marcela. O ato de ficar sentado em frente a um computador por horas e tentar manter a concentração é impossível, já era difícil dentro de sala com toda a dinâmica e atmosfera criada pelos educadores, isolado em casa, ficou bem pior.

Todos que já cursaram colegial sabem que o volume de matérias a serem estudadas é enorme, enquanto no superior, o estudante está apenas dentro de uma área e a carga horária é bem menor, no médio, os adolescentes ainda aprendem todas as áreas juntas, as linguagens, exatas, humanas, e ciências da natureza. Para além disso, ainda sofrem o aperto dos vestibulares.

No começo das aulas, Marcela relata que os professores tentaram aliviar o impacto do novo método, as atividades avaliativas e simulados foram suspensos, tudo isso sendo pensado para que os jovens tivessem uma melhor adaptação. Slides explicativos, “quizzes”, os educadores buscaram a melhor maneira de manter os jovens acolhidos.

Com o passar do tempo, as avaliações voltaram, e com elas toda a pressão psicológica. Como se não bastasse o isolamento social, reajuste do aprendizado, distância dos amigos e escola, agora eles seriam cobrados por isso. Marcela descreve que sofreu muito em todo esse processo, passou por crises de ansiedade e teve a saúde mental diretamente prejudicada pela intimidação dessas cobranças.

Além de todas as dificuldades enfrentadas durante a jornada de conhecimento, um dos pontos que mais atingiu Marcela e outros adolescentes foi a falta de contato direto com os educadores. Eles, que são uma das maiores inspirações para os estudantes, principalmente sobre qual área seguir, acabaram tendo essa troca quebrada no momento de isolamento.

“Apesar de ainda vivermos um sistema de ensino monótono, arcaico e tradicional, a relação entre professor e aluno tem sido aprofundada, não é mais apenas uma relação de autoridade e submissão. Os professores não têm mais somente um papel de transferência de conteúdo, de explicação de matéria, eles ajudam no nosso desenvolvimento pessoal, contribuindo para a nossa formação não apenas profissional, como nossa formação humana. As conversas, os puxões de orelha, o apoio que a gente tinha deles em qualquer momento, fez uma falta que ninguém consegue explicar” desabafa a jovem.

Marcela foi uma dos milhares de alunos que sofreram com o ensino remoto em plena pandemia. A jovem reconhece a sorte que teve de estudar em um colégio particular, ter acesso a um computador e internet para acompanhar as aulas, o que não foi a realidade de muitos. Estudantes de classe baixa, matriculados na rede pública de educação resistiram muito mais, as aulas de forma remota não voltaram na mesma rapidez que no privado e também não tiverem o mesmo suporte, mas na hora de serem cobrados pelos vestibulares e pelo Enem, foram avaliados da mesma forma.

O sistema de ensino no Brasil precisa ser seriamente repensado após esse período de pandemia, quando a realidade “voltar ao novo normal”. Seja no primário, no médio ou no superior, os estudantes vêm sendo prejudicados sim, pela falta de apoio, por mais que uma instituição tente os ajudar das melhores maneiras possíveis e incomparável o vácuo de conhecimento que está acontecendo.

 

**Revisão: Italo Charles

***Edição: Daniela Reis