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O debate sobre sustentabilidade e consumo consciente de moda são fatores essenciais para a construção de uma cadeia produtiva mais justa

Por Italo Charles

Nos últimos anos a globalização e o crescimento exacerbado das mídias publicitárias têm impulsionado transformações em diversos âmbitos e no campo da moda não é diferente. Muito se fala em sustentabilidade e consumo consciente, mas poucas pessoas sabem realmente o significado desses conceitos.

Compreender o que se diverge entre moda sustentável e consumo consciente é o primeiro passo para desmistificar os processos que abraçam uma cadeia produtiva enorme como a da moda.

A indústria mundial de moda é responsável pela promoção de empregos, maior rentabilidade e produção de produtos com custos acessíveis, entretanto, não existem apenas pontos positivos nesse grande meio.

Por trás de tamanha produção estão ocultos os malefícios que o setor carrega. O uso de mão de obra barata e insalubre, insumos químicos usados no processo, descarte de resíduos e poluição do meio ambiente são alguns fatores.

A produção sustentável é pautada pelo processo de fabricação que tem como base o uso de insumos não poluentes ou que causem o mínimo impacto ambiental, uso de fibras orgânicas, reciclagem, reaproveitamento de materiais e a responsabilidade social que está atrelada à condições de trabalho dignas.

Mudanças 

Até o século 18, confeccionar roupas fazia parte de um processo longo ocasionado pela dificuldade de acesso a tecidos e materiais, além da mão de obra para produção, o que tornavam as peças mais caras.

Devido a tais condições as roupas tinham mais qualidade e eram feitas para durar, dessa forma, o consumo, na época, era menor e mais consciente, uma vez que se sabia a origem das peças.

Com a chegada da Revolução Industrial em 1970 e com a criação da máquina de costura, os processos para fabricação começaram a se otimizar e com isso o aumento da produção. Mas, foi em 1990 com os avanços tecnológicos que o termo “fast-fashion” foi criado.

Classificado como o padrão de produção, consumo e descarte acelerado, o fast-fashion ganhou espaço no mercado tanto pela mão de obra barata, facilidade e agilidade na produção quanto no custo de matéria prima.

E, com o tempo, o ramo foi tomando maiores proporções sendo que a cada semana eram lançadas novas tendências que imitavam a alta costura, mas com baixa qualidade, custo e durabilidade.

A partir disso, nos últimos anos, debates sobre sustentabilidade e consumo consciente tiveram mais espaço devido ao volume excessivo produzidos pelas indústrias de fast fashion, questões ambientais e principalmente após o desabamento do Rana Plaza em 2013 – prédio de uma fábrica têxtil em Blangadesh.

Dado o acontecido, surgiu o movimento “quem faz minhas roupas?”, difundido pela Fashion Revolution, organização que luta pela transparência e melhoria na cadeia de moda. As manifestações a respeito da causa suscitaram uma análise sobre os processos e padrões da moda.

Consumo Consciente

Por outro lado, enquanto a moda sustentável, de certa forma, está relacionada aos métodos de produção da indústria têxtil e aos fabricantes, a moda consciente faz com que o consumidor esteja presente e manifeste suas preocupações com os meios de produção e com os impactos ambientais.

Consumir moda conscientemente não é apenas usar peças de origem sustentável ou eco-friendly, para além disso, é ter o autoconhecimento e entender os motivos pelos quais nos leva a adquirir determinado produto.

Para se tornar um consumidor consciente é necessário observar como tem sido seu comportamento nos últimos tempos. Abrir o guarda-roupas é o primeiro passo a ser tomado, só assim, será possível identificar o que realmente é usado e o que não é.

Entender que a peça tem um ciclo e analisar a qualidade de insumos, de trabalho dos prestadores envolvidos e principalmente a forma como será usado e descartado a peça é parte principal do consumo consciente.

Ser um consumidor consciente é avaliar que  “velhos hábitos podem ser melhores”.

 

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*Por Ana Carolina Nunes Abreu

Por muito tempo – e principalmente antes da Segunda Guerra Mundial – a ideia de moda se concentrou na Europa, oriunda de maisons luxuosas na elite europeia, com tecidos raros, vindo das melhores grifes e produção feita à mão pelos estilistas, para os nomes da mais alta sociedade. Até hoje, por exemplo, a rainha Maria Antonieta é vista como o símbolo do pioneirismo da moda.

Com as guerras, os estilistas precisaram migrar para regiões pouco afetadas economicamente, como os Estados Unidos. Por esse motivo, foi necessária a criação de um modelo de compra e venda de peças que facilitasse tanto a produção, quanto a recepção dos artigos de moda. Assim, surgiu o prêt-à-porter. Pierre Cardin, estilista francês, criou este termo para denominar sua primeira coleção para uma loja de departamento. Ou seja, a primeira ideia de peças de roupas feitas de forma idêntica, apenas com tamanhos diferentes para a clientela. Foi o primeiro passo para o Fast Fashion e, também, para a democratização da moda.

O termo Fast Fashion foi criado em 1990, para denominar a produção massiva e industrial de artigos de moda, em grande escala, grande margem de lucro e baixa qualidade. Lembra das calças e jaquetas jeans que sua mãe usava e se gabava dizendo que duravam 10, 20 anos? Pode esquecer.

A ideia é criar lançamentos frequentes, sazonais e que buscam suprir o mercado com as tendências atuais e que, com a mesma velocidade que é feita, pode ser descartada. A cada segundo no mundo, o equivalente a um caminhão de lixo de roupas é descartado ou queimado em aterros sanitários no mundo inteiro. Em 2014, um consumidor médio comprou 60% mais artigos de moda do que em 2000.

A revista Environmental Health realizou, em 2018, uma pesquisa apontando que aproximadamente 85% das peças de roupa consumidas pelos norte-americanos são enviadas para o aterro sanitário como resíduo sólido.

Você consegue imaginar o impacto ambiental de tudo isso? Apenas para ilustrar: para fabricar uma camisa de algodão, são necessários 2.700 litros de água. O bastante para uma pessoa beber por 2,5 anos. Toda produção de roupa enquadrada no modelo de “moda rápida” exige gastos em água, emissão de poluentes e desmatamento, para a plantação de algodão, por exemplo.

A luta para conscientizar e diminuir o consumo do Fast Fashion começou há pouco tempo. Para amenizar os danos, foi criado um movimento, em 2004, que vai de encontro com o modelo anteriormente citado: O Slow Fashion.

Promovendo uma consciência socioambiental, valorizando e priorizando comércios e recursos locais,  essa produção visa a prática de confiança entre os produtores e seus respectivos consumidores, praticando preços reais, muitas vezes com os custos sociais, estimulando uma criação de pequena e média escala. De acordo com a professora Valesca Sperb Lubnon do curso de Design de Moda do Unipê, “Assim como houve na primeira Revolução Industrial, quando saímos do artesanal e fomos para a produção em escala, agora estamos em um início de uma nova era, na qual voltamos nossa atenção à qualidade do produto, à valorização do profissional e do conhecimento”. 

Este novo cenário fez as gerações mais atuais repensarem o conceito de moda, principalmente a facilmente descartada. E bem antes desse movimento ser considerado, já havia um modo de consumo que partia da sustentabilidade, baixo preço e apreciação do comércio local, os brechós e bazares.

Existentes desde o final do século XIX, esses comércios visavam atender a população mais carente, que não tinha condições financeiras de ostentar produtos de departamentos, mesmo aqueles com preços mais baixos. Com peças e artigos usados e de segunda mão, os brechós eram, antes de tudo, a única forma de consumo de roupas que muitas pessoas tinham.

Vislumbrando as décadas mais antigas, os comércios de segunda mão passaram a ser vistos como espaços retrôs e vintages, usado por jovens para reconstruir o estilo de gerações anteriores. Isso mesmo, roupas de cós alto, alfaiataria, oxfords, blusas estampadas de botões, jaquetas jeans e outros acessórios que compõem looks conhecidos como “anos 80”, já faziam parte do vestuário de quem não podia consumir em lojas conhecidas em shoppings e demais malls, mas não com a visão crítica da moda, e sim por necessidade.

Uma reflexão acerca desse estilo de vida se baseia nas estruturas excludentes das lojas de departamento aliadas ao Fast Fashion. E por mais informal que a loja seja, ainda tem, em si, atributos capazes de afastar a população de classes mais baixas. Desde a modernização das lojas aos acontecimentos cotidianos e estruturais, como pré conceitos estabelecidos de acordo com o padrão de consumidor que a loja espera. Frequentemente você pode ouvir um atendente falando para outra pessoa “é pra parcelar de quantas vezes?”, mesmo diante de uma compra com o valor baixo. Já parou pra pensar nisso?

Com a ascensão do brechó, muitas vertentes da discussão acerca da moda surgiram. “Por que eu compraria uma peça por R$100,00, se eu posso comprar por R$10,00 em um brechó?”, questionam os novos consumidores. Esse comportamento, apesar de contribuir para os pequenos comerciantes e donos de brechós, traz consigo a problemática de outro consumo massivo e vazio, aquele no qual você usa de pretexto a sustentabilidade, mas consome o dobro de peças por ser mais acessível, por ser mais “cool” e por ser pauta de elogio dos seus amigos em bares.

Esse tipo de consumo pode, consequentemente, encarecer os brechós, que entendem que seus consumidores atuais são, na verdade, pessoas mais preocupadas com a estética do que realmente um público que tenha a necessidade de comprar ali.

As vendas diretas no mercado de peças usadas passa por um momento de aumento expressivo no Brasil. Nestes últimos 10 anos, o consumo cresceu de forma quase exponencial. O mercado dos brechós, conhecido também como second hand, deve dobrar até 2025. De acordo com a pesquisa do GlobalData, o valor desse segmento deve ir de US$ 24 bilhões para US$ 51 bilhões.

Você, consumidor de brechó ou apenas um curioso, já entrou em uma loja com essa denominação, mas ao conferir os produtos e os preços percebe que, além de terem em sua maioria peças de primeira mão, precificam as roupas de forma a beirar o absurdo com o pretexto de “curadoria e garimpo bem feitos”? É o reflexo do consumo acelerado, que dita aos proprietários dos brechós a glamourização daquele ambiente, já que atualmente é tendência.

Entenda: não é para você parar de consumir em brechós e bazares. Mas esses dados aqui servem para abrir seus olhos diante do seu consumo. Ele é consciente, ou você só compra usando o conceito e a tendência como seus aliados?

Outra forma de mudar seus hábitos de consumo é, também, conhecer lojas e comércios que buscam a produção desacelerada e sustentável dentro do Slow Fashion. Não só roupas, mas também produtos de beleza, sapatos, acessórios etc. Esses ambientes podem, muitas vezes, apresentar um preço maior, mas em troca oferecem um produto eco consciente, sem grandes danos ao meio ambiente e, muitas vezes, não testados em animais.

Como dica para se inserir nesse movimento e conhecer ainda mais sobre essa proposta, listamos algumas lojas com a política Slow Fashion.

Confere aí:

Gioconda Clothing 

Comas

Pântano de Manga

Nuu Shoes 

 

*A matéria foi produzida sob a supervisão da jornalista Daniela Reis