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Especial

Diane Paschoal, produtora visual e publicitária.

Desde a não tão recente crise das gravadoras de discos e com o boom do uso da internet e de sites de download de música, artistas enfrentam problemas para divulgar seu trabalho. Além de precisarem investir ainda mais na qualidade musical, eles precisam recorrer a outros meios para valorização do que produzem.

O Jornal Contramão entrevistou a publicitária e produtora visual, Diane Paschoal. Inserida na música desde cedo, Dihleaall, como prefere ser chamada, acredita que a música autoral precisa de projetos mais complexos que vão além do “produzir música”.

Contramão

Qual a importância do crescimento do número de artistas autorais em Belo Horizonte?

Dihleeall

Por mais que apenas 1/10 dos artistas consigam chegar ao ápice da carreira musical, toda elevação na produção cultural enriquece a cultura local, além de empresas que vivem disso, como estúdios, escolas de música e teatro. Se existem mais bandas e projetos artísticos acontecendo em garagens, colégios e faculdades, mais pessoas estão tendo contato com a arte. Isso é esplêndido: todo país de primeiro mundo tem aulas de música e teatro no high school. Se a cena autoral cresce em BH, é o reflexo que as pessoas estão buscando a arte própria, que querem expressar através da arte seus sentimentos, além de palavras e desabafos no Twitter.

Contramão

Você, como produtora cultural, fotógrafa e cinegrafista, acredita que produções além das gravações musicais, como videoclipes, enriquecem o trabalho de músicos independentes?

Dihleeall

Além de ter um material musical bem produzido, as bandas devem investir na imagem do projeto. Não adianta mais bater o pé falando que música “é som e ponto”. Hoje em dia, uma banda é projeto que pode agregar designers, assessores de imprensa, merchandising de empresas e da própria banda. Então, é importante investir na construção imagética, desde a criação da logo até a interação com o seu público nas redes sociais. Algumas bandas fazem clipe em que fãs aparecem no enredo. A galera adora fazer parte de um propósito, saber que existem mais pessoas que escutam o som da banda X por tal motivo ou ideal. Então se existem mais peixes no mesmo aquário, os mais vistosos serão os escolhidos. Por isso hoje projetos musicais devem transcender o som.

Contramão

Como você enxerga, hoje, o cenário musical autoral de BH? Ele tem ganhado mais espaço? Como?

Dihleeall

Eu tenho 22 anos e, desde os 17, me inseri nos porões como o Matriz, onde eu via bandas de São Paulo virem tocar arrastando 400 pessoas, e os locais abriam para elas. De uns tempos para cá, existe, sim, espaço. Mas sem leis de incentivo, acredito que muita gente boa de serviço estaria apenas tocando o cover para sobreviver. O rap tem se alastrado pelas ruas, viadutos e cada vez estão mais caras as baladas onde MCs duelam. O rock alternativo, indie, por sua vez anda parado, caído. Acredito que a maioria das pessoas ainda olhe para SP e RJ e não valoriza as bandas daqui.

É difícil uma banda daqui conseguir lotar sozinha um show para mais de 100 pessoas. A última que eu vi ter um público bem expressivo foi a banda de hardcore Pense HC e a banda de ska Pequena Morte, salve o show do clipe da banda Engradado. No geral, o que galera de todos os estilos tem feito é promover festivais com 4 até 6 bandas tocando no mesmo dia. Aí sim o caldo engrossa e festas legais acontecem. Algumas pessoas vão pela banda X, outras pela Y e acaba rolando esse “descobrimento” de bandas pelo público.

Contramão

Você acha que BH tem criado espaços para que artistas autorais independentes se apresentem?

Dihleeall

Então, reabriu o Baixo que era o antigo Nelson Bordelo, rola autoral nas quartas se eu não me engano. Remanescentes têm o Matriz e a Obra e de novo no pedaço, A Autentica. Além das casas, alguns centros culturais têm facilitado a produção de pequenos festivais. Então, espaço tem. O problema é que muitas vezes as bandas não sabem organizar e se unir a coletivos para fazer acontecer. Muita banda que acredita que sua qualidade musical é muito superior para tocar em pequenos festivais. O problema é que qualidade musical encalacrada dentro do estúdio não é escutada, muito menos valorizada. Então a receita é essa: se a banda quer conquistar o público, ela tem que colocar a “cara a tapa” e aceitar tocar de graça até chegar ao ponto em que festivais vão pagá-la bem porque tem um público expressivo.

Por Gabriel da Silva

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Da esquerda para a a direita, Tiago Tereza, Luisa Gontijo e Luan Nobat. Foto: Rafael Sandim

Idealizado por Tiago Tereza, Luan Nobat e Luísa Gontijo, o site Retalho Cult, ferramenta para a difusão cultural e apoio a artistas dos mais variados segmentos, foi relançado no dia 1º de junho.

O Jornal Contramão entrevistou Luísa Gontijo, fotógrafa, musicista, videomaker, produtora cultural e historiadora.

Contramão

Quais são os principais objetivos do site Retalho Cult? Agora, sendo relançado, ele traz novidades? Quais?

Luísa Gontijo

O grande objetivo do Retalho Cult é e sempre foi registrar e dar luz às manifestações artísticas, a fim de promovê-las, destacá-las e consequentemente, fomentá-las. Além de registrar, fomentar também sempre foi uma missão. Acreditamos ser um incentivo, uma força que se soma junto ao artista. Isso porque, além de agitadores culturais, somos também artistas. Temos o sonho de expandir, mas a princípio damos foco ao que é produzido e apresentado em Belo Horizonte e em seus arredores. Aqui tem coisas maravilhosas acontecendo e isso precisa chegar às pessoas.

Apesar de, desde 2012, realizarmos um festival que já teve cinco edições, o Cansei de Ser Indie, uma das novidades é que chegamos mais fortes com a mão na massa: o Retalho é relançado como produtora e agora produzimos eventos, realizamos assessoria de imprensa, produzimos videoclipes, fotos de divulgação, dentre outras coisas. Além disso, lançaremos em breve um selo que agenciará carreiras artísticas, o Selo Tangerina, que será lançado com um pedal de guitarra exclusivo da marca.

Contramão

Além de difundir a produção musical de artistas independentes, o Retalho Cult possui projetos paralelos, como o Cansei de ser Indie. Vocês pretendem continuar com esses projetos paralelos? Qual a importância deles para a consolidação de um cenário musical autoral em Belo Horizonte?

Luísa Gontijo

O Cansei de Ser Indie está totalmente vinculado ao Retalho Cult. É um festival idealizado e produzido por ele. Continuaremos, sim, com o festival e pretendemos ampliar sua dimensão. A expectativa é realizá-lo na rua, aberto ao público, com várias bandas compondo a grade de programação. E não só música: pretendemos trazer outras vertentes pra dentro do festival. Estamos trabalhando pra que isso aconteça o quanto antes. A importância de festivais como esse, principalmente quando abertos ao público, é que faz com que as pessoas tenham acesso ao trabalho do artista. Dessa forma o artista constrói, aos poucos, seu público e quanto maior o número de pessoas acompanhando os passos e consumindo suas obras, maiores são as chances dele viver disso, dele viver do que mais ama e do que faz de melhor, sem precisar recorrer a outro emprego, essas coisas.

Hoje em dia as bandas não descem goela abaixo da população como era nos tempos áureos da TV. Atualmente, com a internet, temos o poder de escolher o que queremos ouvir e isso facilita a produção e a publicação da obra, mas o leque imenso de opções acaba dispersando o público. Resumindo, festivais como esse facilitam o intercâmbio entre artista e público e tenho a impressão de que nunca foram tão importantes.

Por Gabriel da Silva

Inaugurado em 1957 o Conjunto Arcangelo Maletta faz parte da história da construção da cidade, da bohemia e da cultura de Belo Horizonte. O edifício abriga apartamentos residenciais, bares, sebos, lojas, escritórios entre outros. Isso faz com que o Maletta, assim conhecido pela maioria, seja um ponto de encontro de diversas tribos da sociedade.

Há cerca de três anos à procura pelo edifício cresceu e voltou a ser frequentado por jovens na média de 25 anos que vai em busca do happy hour mais famoso da capital mineira. Além dos bares na calçada entre a esquina Av. Augusto de Lima e Rua da Bahia, há também os que ficam no interior do prédio e os mais recentes da sacada. O mais famoso é a Cantina do Lucas que foi tombado, em 1997, como patrimônio cultural de Belo Horizonte, já recebeu personalidades como Milton Nascimento e o Clube da Esquina.

Mesmo com tanto tempo de existência e história, o Maletta, não perdeu a sua vivacidade apesar da sua aparência remeter a arquitetura antiga. Por esse motivo escolhemos o Conjunto Arcangelo Maletta para ser o tema dessa reportagem multimídia que irar abrigar, uma galeria de fotos, um infográfico interativo, uma entrevista e um vídeo para entender um pouco do cotidiano dessa parte de Belo Horizonte.

Por: Ana Carolina Nazareno e Cássia Maia
Foto: Internet

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Ideologicamente trabalhado no mesmo conceito do lema da bandeira do estado de Minas Gerais, “Libertas quae sera tamem”, o movimento pela anistia terá um memorial sediado em Belo Horizonte. O Memorial da Anistia será um espaço interativo que contará um período obscuro da história do Brasil.

O memorial está sendo construído com verbas do Ministério da Justiça e vai funcionar na antiga sede do curso de Psicologia, que funcionava na Faculdade de Ciências Humanas da UFMG (Fafich), na rua Carangola, 288. O prédio era chamado de “coleginho”.

A proposta é de que seja um ambiente onde explore a percepção e os sentidos das pessoas, de modo que haja vídeos, fotos, áudios e documentos. Essa é uma tendência de inovação de lugares que guardam a informação de um determinado assunto, algo parecido com o Museu da Língua Portuguesa na Estação da Luz em São Paulo.

Previsto para ser inaugurado em 2012, o memorial tem por objetivo preencher lacunas e resgatar o discurso de parcela da população brasileira, que era contra o regime militar e ficou reprimida durante 21 anos, no intervalo de 1964 a 1985. O material para a composição do memorial constituído por documentos, depoimentos e fotos virá do Arquivo Nacional e de doações de familiares de presos políticos e dos próprios envolvidos.

Para o Brasil, falar desse momento ainda é um desafio. Entidades no mundo que trabalham na defesa aos Direitos Humanos, como a ONU, cobram transparência e investigações de abusos praticados durante a Ditadura Militar. Inserido num contexto de bipolarização política no mundo, outros países da América Latina também sofreram com golpes de governo e a imposição dos governos anti-democráticos.

Na Argentina e no Chile, um dos países em que a ditadura foi mais intensa, a luta contra o autoritarismo e abusos cometidos pelos ditadores é algo existente até os dias de hoje. Por meio de investigações e julgamentos muitos militares estão sendo condenados à prisão, mesmo depois de se ter passado muito tempo. Além de terem memoriais dedicados à preservação da história do período ditatorial.

O Jornal Contramão entrevistou seis pessoas que pertencem à Associação dos Amigos do Memorial da Anistia, entidade que organiza o projeto que pretende resgatar as lutas políticas e sociais do período do regime militar no Brasil (1964-1985), bem como reunir depoimentos, documentos e outros materiais de pessoas que foram presas, torturadas, perseguidas e assassinadas no período. Os entrevistados são Maria Christina Rodrigues, Valéria Ciríaco Carvalho, Carlos Alberto de Freitas, Maria Clara Abrantes Pêgo, Jorge Antônio Pimenta Filho e Alberto Carlos Dias Duarte.

Entrevista:

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Reunião Associação dos Amigos do Memorial da Anistia, Alberto Duarte, Maria Christina Rodrigues, Valéria Ciríaco, Jorge Antônio Pimenta Filho, Maria Clara Abrantes e Carlos Alberto de Freitas

Contramão: Como nasceu a idéia de um memorial dedicado a anistia?

Maria Christina: O memorial vem de uma proposta não só brasileira, mas também mundial no sentido de estar resguardando, guardando e procurando transmitir para as gerações futuras a história. Porque normalmente num período de ditadura você tem a visão da história oficial, a história do poderoso, a do vencedor. Então é necessário que pós-ditadura, depois no processo de redemocratização o outro lado também relate sua versão e os fatos que aconteceram.

Contramão:A Anistia é um recorte do período da ditadura, que por sua vez foi um tempo crítico da história do Brasil. O tema do memorial está ligado à contestação das idéias de um governo ditatorial. Naquela época poucos ousavam discutir sobre a situação, um temor ainda presente na atualidade. Qual foi o respaldo para se reconstituir a memória desse momento que ainda não está livre da censura?

Maria Christina: Há hoje um fortalecimento da democratização no mundo, que está experimentando uma onda de luta contra qualquer tipo de regime intransigente. Na América Latina, nós temos visto há alguns anos que os governos ditatoriais a cada dia estão caindo como caem cartas de baralho. Então essa sustentação, essa veia democrática e dinâmica é a vontade da busca do aprofundamento de ideários políticos justos e livres da intolerância.

Contramão:Belo Horizonte e o conjunto do estado de Minas Gerais tiveram uma participação importante na luta contra a repressão política. Como o senhor vê a importância de grupos de oposição na cidade e a sua atuação? Como o memorial vai abordar Belo Horizonte na história da anistia?

Jorge: A história da luta democrática no Brasil e da esquerda não deixa de passar primeiro por Belo Horizonte. Muitos partidos e organizações políticas começaram aqui na cidade, como por exemplo, alguns grupos ligados a seguimentos que se deslocaram do antigo Partido Comunista Brasileiro (PCB), ou mesmo setores sociais que se deslocaram da igreja e construíram a ação popular.

Maria Christina: Não podemos esquecer a questão das greves e da luta da mineração de Morro Velho, não podemos esquecer historicamente a situação de Raposos, a fábrica de tecido Marzagânia e os movimentos sindicais naquela região, que foram profundos. Tudo isso vai também ser resgatado. Quando se fala muito na formação de um partido operário como o PT, nós não podemos achar que a história começou no ABC, a história das organizações sindicais e das sublevações antecede a isso. Na década de 60 nós tivemos os movimentos na Cidade Industrial e o massacre de Ipatinga. Então Minas Gerais tem uma história que precede a década de 70 dentro dos movimentos sindicais, operários e sociais.

Contramão:Como o memorial vai trabalhar? Como foi feito o recolhimento de documentos?

Carlos Alberto: O recolhimento está sendo e será feito através do arquivo público nacional, através de todos os documentos daquelas pessoas que foram anistiadas e também de documentos públicos que estão no arquivo de Belo Horizonte, além de doações de anistiados e familiares de pessoas implicadas. São 70 mil documentos oriundos da comissão nacional da anistia.

Contramão:A Ditadura Militar está permeada por lacunas, uma vez que a censura e a propaganda do governo propiciaram a alienação da população. Uma parcela do povo não sabia o que estava acontecendo no país, a outra tinha medo de falar, criando assim um quadro de esquecimento e falta de reflexão. Visto isso quais foram as dificuldades enfrentadas na criação do memorial? Como foi montar esse quebra-cabeça?

Maria Christina: Todo memorial é dinâmico. Então o recolhimento do material é constante e contínuo. A idéia inicial foi a de selecionar, guardar e reservar em um só local todos os processos brasileiros que passaram pelo Ministério da Justiça via comissão de anistia. Toda a população brasileira que quiser fazer uma consulta sobre o que aconteceu com Lamarca, por exemplo, deverá consultar o arquivo dele no Memorial da Anistia em Belo Horizonte. Todo arquivo da luta pela redemocratização no Brasil vai estar aqui. Assim todas as informações contidas nos processos da anistia que eram pessoais e foram tornados públicos farão parte desse memorial. Na medida em que é recomposta a história a partir da captação de depoimentos de quem viveu, será possível contar a versão real do que foi a Ditadura no Brasil.

Os uruguaios também perseguidos

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Carmen Aroztegui

A uruguaia Carmen Aroztegui mudou-se para Porto Alegre em função da perseguição política sofrida por sua família em plena Ditadura Militar no Uruguai, em 1973. Hoje é professora na Escola de Arquitetura na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Ela recorda que “no Uruguai sempre houve uma intenção que a ditadura tivesse uma legitimação. A ditadura começa assim, você reprime você expulsa pessoas de esquerda do trabalho e não os permitem sobreviverem”.

Para Aroztegui, “a palavra anistia está recoberta de uma idéia de que existiram dois bandos. O que aconteceu é que existia uma política de estado de repressão, não era uma guerra, onde existiam os nazis e os aliados. Existia um exército e uma política de estado que detinha mecanismos institucionais de repressão e de abusos aos Direitos Humanos de forma sistemática. Isso na verdade é que foi anistiado”.

A censura draconiana

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Alberto Duarte, um dos idealizadores do Memorial da Anistia

Alberto Carlos Dias Duarte, membro da Associação dos Amigos do Memorial da Anistia, foi um militante nas diversas lutas pelos Direitos Humanos durante a Ditadura Militar brasileira. Para ele, “pobre é um país sem história. Nós temos que resgatá-la, mesmo porque o golpe da ditadura foi em 1964, já se passaram muitos anos. Nós estamos hoje batalhando pelo aperfeiçoamento da democracia”.

AlbertoDuarte explica a importância do Memorial da Anistia:

Duarte lembra que durante a ditadura militar havia censura: “Eu mesmo fui diretor de dois jornais alternativos, o Jornal Movimento e o Jornal Em Tempo. A censura era drástica, draconiana nesse país. Então com esse memorial, nossa pretensão é divulgar o máximo, permitindo o acesso de todos aos documentos”.

Por : Felipe Bueno

Fotos: Felipe Bueno