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Henri Lefebvre

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Crédito: Tuca Vieira

Existência, sobrevivência, respeito e dignidade são alguns aspectos que pautam o dia a dia de várias comunidades taxadas como minorias, em especial a população LGTBQIAP+

Por Italo Charles

A trajetória pela conquista dos direitos LGBTQIAP+ é longa e repleta de adversidades, e ainda continua assim. Segundo dados revelados na pesquisa “Homofobia de Estado”, desenvolvida pela International Lesbian, Gay, Bisexual, Trans and Intersex Association (ILGA) em 2020, cerca de 69 países, dos 193 membros da ONU, criminalizam práticas relacionadas à orientação afetivo-sexual.

Esses dados afetam diretamente a população LGTBQIAP+ ao redor do mundo. No caso do Brasil, a homossexualidade não é criminalizada. Entretanto, os grupos que formam a população LGBTQIAP+, no país, sofrem diariamente pela falta de direitos que constituem uma vida digna.

Por mais que o Artigo 5º da Constituição Brasileira (BRASIL, 1988) garanta que “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”, é visto que as minorias são tratadas de forma distinta do que se estabelece a lei e, para além, existe a pressão social e a perda de direitos que inferioriza esses grupos.

A falta de amparo, muitas vezes legal, inviabiliza a prospecção de vida das pessoas LGBTQIAP+ resultando em violência, segregação e até homicídios contra essas pessoas. Os dados da Associação Nacional de Transexuais e Travestis (Antra), no seu último boletim, mostraram que o Brasil continua no ranking de assassinatos contra pessoas LGBTQIAP+, sobretudo transexuais e travestis.

A resposta, que fica clara, para essa situação é que ainda vivemos em um país dominado pelos preceitos e estereótipos brancos, heteronormativos e com poder aquisitivo elevado, o que fomenta a construção de uma sociedade pautada pelo machismo estrutural, misoginia, racismo e homofobia.

Direito à cidade

O conceito de “Direito à Cidade” foi desenvolvido pelo filósofo francês, Henri Lefebvre, em  seu livro de 1968 “Le droit à la ville”. Lefebvre define como o direito à não exclusão da sociedade urbana das qualidade e benefícios da vida. No texto é destacado a segregação socioeconômica e seu fenômeno de afastamento. 

A referência se dá à “Tragédia dos Banlieusards” que obrigava pessoas a viver em espaços residenciais distantes das cidades. Devido ao cenário, Lefevre institui o direito à cidade como recuperação coletiva do espaço urbano por grupos marginalizados que vivem nos distritos periféricos da cidade. 

Em meados da década de 1990, as ideias de Lefebvre sobre direito à cidade foram aderidas no planejamento urbano em várias partes do mundo suscitando uma explosão de movimentos sociais.

Para a arquiteta urbanista e líder do Núcleo de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário Una, Ana Karolina Oliveira, o direito à cidade vai além dos aspectos de moradia e infraestrutura.  “Poder andar na rua em qualquer horário, dar a mão para o seu companheiro ou companheira sem ofender ninguém e ter a possibilidade de transitar livremente e com segurança, isso é direito à cidade”.

População LGBTQIAP+

O direito de ir e vir serve para todos. Mas, os grupos denominados como minoria sofrem, diariamente, com a falta de liberdade de poder frequentar espaços e se habitar livremente. Pois, se tratando de uma sociedade que visa a padronização de corpos, classe e orientação sexual, é, quase que, inviável viver de maneira igualitária.

Andar na rua de mãos dadas, transitar em qualquer horário do dia para a maior parte da população – hétero e branca-, pode ser normal, mas para os demais grupos isso surge como estigma, insegurança e medo.

“Projetar ambientes de convívio público que permitam que as pessoas transitem de forma segura sem se sentirem julgados e com o mínimo de estrutura é papel do urbanista para promover o direito à cidade”, comenta Ana Karolina. 

A população LGBTQIAP+ até hoje é vista como um grupo marginalizado que percorre em meios às margens da sociedade em busca de existência e resistência, sofrendo violências, negações e muitas vezes a falta de estrutura para uma vida justa.

O direito à cidade pauta, também, a garantia de segurança, saneamento, moradia e espaços de convivência para todos os públicos. Entretanto, na maioria das vezes esses direitos são negados e as ditas minorias sofrem com essa situação

Papel da arquitetura 

A arquitetura e urbanismo, neste contexto, tem como função primordial promover meios para melhoria da infraestrutura urbana, de forma inclusiva projetando espaços de convívio e acolhimento, não somente para a população LGBTQIAP+, mas também para todas as pessoas.

Pensar no papel do Arquiteto Urbanista na construção de direito à cidade, é pensar não apenas no alcance e conquista à moradia, educação, saúde e segurança é, mais do que isso, pensar em profissionais que exerçam a capacidade básica de socialização do habitar, se fazendo indivíduos ativos na apropriação do espaço urbano e garantindo o direito à cidade para todos.

“Nós, enquanto arquitetos e urbanistas temos o dever de desenvolver  projetos urbanísticos que tenham como base a infraestrutura  para garantir os direitos básicos da população”, comenta Ana Karolina Oliveira.

Neste cenário, existe outro papel fundamental que não cabe somente aos urbanistas, mas também à população. Trata-se da verba distribuída para manutenção de infraestrutura das regiões da cidade.

Ana Karolina explica que muitas vezes as regiões que ficam com a maior parte da verba são as que já tem mais infraestrutura, com isso, as localidades periféricas continuam distantes do processo de melhoria.

“O problema está na distribuição de verba para infraestrutura das regiões, por se tratar de bairros mais próximos aos centros, esses locais acabam recebendo mais verba e as periferias continuam da mesma forma ”, completa Ana.

 

*Edição: Bianca Morais

**Revisão: Daniela Reis