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Por Carlos Fernandes 

Naquele 7 de março de 2020, quanto o árbitro apitou o fim do clássico entre Atlético e Cruzeiro, com mais uma vitória do alvinegro, não imaginávamos o que estava por vir. Até a data de hoje, foi a última vez que vimos as arquibancadas do Mineirão lotadas, e não temos perspectivas de quando voltaremos a prestigiar o show das torcidas mineiras.

Desse modo, o futebol perde parte de seu encanto. Parece outro esporte, não tão apaixonante. Muitos são os que defendem as atividades futebolísticas ativas em meio à pandemia, tendo como argumento que se trata de uma das “alegrias do povo”. De fato, é. O espetáculo, porém, está, hoje, sem seu principal personagem: o torcedor.

Obviamente, o momento pede, e devemos seguir as recomendações da OMS. No momento, é impossível imaginarmos torcida nos jogos de futebol. Entretanto, também é impossível pensar no futebol como um esporte tão apaixonante… sem torcida.

Quer um exemplo? A última final da Libertadores foi protagonizada por duas equipes paulistas, dois rivais, Santos e Palmeiras. Um dos assuntos mais comentados nas redes sociais foi a falta de “clima de final” no jogo, ou, até mesmo, a “falta de graça”. Alguns até disseram ter sido “a pior final de Libertadores que já vi na vida”.

Para desvalorizar o feito histórico de Santos e Palmeiras, os torcedores de outros clubes até alfinetaram: “Final com dois que ninguém liga”.

Sabemos, contudo, que não é nada disso. O Santos, com suas três conquistas da América, e o Palmeiras, com uma conquista até a final, sabiam bem o peso, e tinham uma história do tamanho de final de Libertadores. Mas, não adianta. Sem o personagem principal, sempre teremos a sensação de que faltou algo. E a resposta é uma só: faltou o torcedor. Faltou o grito de “UUUUUUUUH!”, em um lance de quase gol, faltou a vaia quando o time adversário está com a bola, faltou comemoração, faltou alegria.

No futebol mineiro, o Galo, talvez, encare sua temporada de maior desafio. Com altos investimentos, o clube e a torcida esperam grandes conquistas em 2021. O Cruzeiro atravessa a pior crise de sua história, e, mais do que nunca, precisa do torcedor. Por fim, o América, que volta à primeira divisão depois de cinco anos, após uma temporada espetacular. Nenhuma dessas histórias tem sido vista de perto pelo torcedor. É angustiante.

No clássico do dia 11 de abril de 2021, houve o reencontro entre Atlético e Cruzeiro, pouco mais de um ano depois. As situações são parecidas às de 2020: Atlético na Série A, cheio de esperanças; Cruzeiro na Série B, enfrentando crises. O que muda são as arquibancadas do estádio, que, pela primeira vez na história do clássico, estarão vazias. Não sei o que representa tal clássico, para além da sensação de “jogo-treino em estádio”.

 

*Edição: Professor Maurício Guilherme Silva Jr.

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Por Igor Tiago Ribeiro

Você já se perguntou hoje quem está mais exposto a este tiroteio que é a pandemia de covid-19? Conheço quem tenha a coragem de dizer “eu”, ou “todos nós”. Mas, infelizmente, os dados provam que essa não é uma verdade absoluta. A periferia tem sofrido cada vez mais porque o mal que a acomete não é somente a pandemia de covid-19, a distância dos centros de saúde, a falta de acesso ao saneamento básico, a quantidade de pessoas que moram na mesma casa, mas também a falta de acesso à educação, o aumento da presença messiânica da igreja nas comunidades e o quanto isso, infelizmente, a aproxima do discurso negacionista escancarado no mais alto escalão da política brasileira.

Pode soar conspiracionista demais que estes fatores se somem aos péssimos que já existem e resultem em uma chacina da população menos favorecida de um país, mas onde já vimos estes fatores acontecer, a história posterior fez questão de mostrar que nunca é somente só o fato, mas, sim, tudo o que está por trás dele. E eu, como jornalista, seria um irresponsável se não estivesse atrás da origem do fato de o Brasil ter ultrapassado mais de 300 mil mortes por covid-19, e elas estarem, em maioria, na população mais pobre.

Você ainda lembra que a primeira vítima fatal de covid-19 no Brasil foi uma empregada doméstica? Essa cena se repetiu outras milhares de vezes e foi um estudo publicado pelo Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde da PUC-Rio que primeiro confirmou tudo. Levando em conta as primeiras 30 mil notificações de casos de covid-19 disponibilizadas pelo Ministério da Saúde, o estudo concluiu que quanto maior a taxa de escolaridade, menor era a letalidade da doença, ficando em 71,3% entre pessoas sem escolaridade e 22,5% em pessoas com nível superior.

Se aprofundarmos os dados e cruzá-los com as características de raça, vemos que pardos e pretos sem escolaridade representam 80,35% dos dados de frente, com 19,65% dos brancos com nível superior. E esse é apenas o resultado de uma pesquisa no início da pandemia, em maio de 2020. O problema mesmo está no fato de que, com a permanência da pandemia, os dados ficam mais específicos e confirmatórios – por vezes, até mais assombrosos.

Pesquisa do estúdio de inteligência de dados Lagom Data, feita em exclusividade para o jornal El País, comparou os dados de 2020 com os de 2021 e confirmou aumento de até 60% das mortes entre as pessoas com vínculos profissionais comprovados que não puderam ficar em casa. Em especificidade, as profissões que não exigem formação de nível superior e não ganham o suficiente para sair das regiões marginalizadas onde habitam são as mais afetadas.

Mas o que a igreja tem a ver com isso? É meio difícil imaginar como a religião possa impactar numa crise humanitária quando seu papel, na história da sociedade, sempre foi o de passar uma imagem humanizada para a sociedade que a cerca [e a sustenta].

Segundo pesquisa divulgada pelo instituto Datafolha, em janeiro de 2020, pré-pandemia, 60% das pessoas que compõe o perfil do brasileiro evangélico se autodeclaram pretas ou pardas. Isso é resultado do crescimento da presença dessas igrejas nas regiões onde essa população está, em sua maioria, nas regiões mais periféricas. Essa representatividade não existe somente nesta população. Pelo contrário, está, até mesmo, no cenário político brasileiro, no qual compõe 20% do Congresso, em Brasília.

Só nas eleições municipais de 2020, foram, aproximadamente, 13 mil candidatos espalhados pelo Brasil, que usaram a própria religião como bandeira política, segundo o Instituto dos Estudos da Religião. E o maior problema é que a religião faz oposição à ciência, e, quando forma representatividade política, colocamos os estudos científicos em xeque na mão dos representantes do povo. Afinal, a voz do povo é a voz de Deus.

É com esse discurso que o próprio presidente Jair Bolsonaro conseguiu puxar para si a taxada irresponsabilidade social durante a gestão da pandemia. Principalmente, porque representa o combo perfeito entre negacionismo, religião e poder. E, quando esse discurso ecoa entre as pessoas que frequentam os centros religiosos neopentecostais, que é são as mesmas, mas sem acesso à educação, e representam a maioria entre os seus eleitores, temos o resultado catastrófico de um número maior de mortes nesta população.

Infelizmente, ainda estamos numa realidade longe do ideal de conseguir separar política de religião, formar cada vez mais pessoas em ensino superior, e voltar a investir em educação pública para aumentar o acesso da população mais pobre a melhores oportunidades de vida. Em 2021, já não bastava que brasileiro, o que, no geral, já é difícil? Também ser pobre e preto é a certeza de que não há como sobreviver a mais uma pandemia.

 

*Edição: Professor Maurício Guilherme Silva Jr.

 

 

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Por Bianca Morais

“Forever young, I wanna be, forever young. Do you really wanna live forever?”

Essa música foi lançada lá nos anos 80 e ainda é muito reproduzida por vários artistas, sua tradução diz: “Eternamente jovem, eu quero ser eternamente jovem. Você realmente quer viver eternamente?”

Escutei a música esses dias e ela me remeteu a algumas notícias que li ultimamente em alguns jornais, de que pela primeira vez desde que começou a pandemia do coronavirus, os jovens são a maioria dos internados nas UTIs do Brasil. Assustador, e o que mais me chamou atenção é que essas reportagens mostravam um perfil de jovem que se acha imbatível, que não vai pegar a doença nunca, afinal, eles ainda são muito novos para morrer, ainda têm muito o que viver.

A inconsequência desses rapazes e moças que por acreditarem serem eternos e nada pode os atingir, levam eles constantemente a desobedecerem as medidas de isolamento social e saírem para bares, festas clandestinas, aglomerações e pessoas sem máscara. Muitos deles ainda acham bonito expor essa realidade no Instagram, na minha rede social, por exemplo, vejo constantemente postagens e stories dessa galera que não tem medo do Covid, se sbaldando em festas.

Se para mim tais imagens já incomodam tanto, imagine para aqueles médicos da linha de frente  que colocam diariamente em risco trabalhando em hospitais infestados Covid e quando saem de seus plantões e se deparam com ruas e bares lotados de pessoas inconsequentes. 

Do you really wanna live forever? (você realmente quer viver para sempre)? Isso é o que eu tenho vontade de responder nos stories dessas pessoas, porque parece que não. Será que se eles não se importam com a própria vida, pelo menos não se preocupam com os pais, os avós? Mas agora os avós já foram vacinados, então eles não precisam se afligir mais.

Egoísmo ou super poderes? Não pensar no outro ou simplesmente se achar um máximo que não pega a doença? “Somos jovens, temos que viver intensamente, estamos perdendo nossas vidas para um vírus, não quero envelhecer nessa pandemia”. Realmente, vocês estão perdendo suas vidas para esse vírus, pela primeira vez vocês estão morrendo de fato. 

Não sou Deus para julgar, longe de mim, mas a realidade é que a cada final de semana, feriado ou data comemorativa  a galera se aglomera, vacila e depois paga as consequências. 

Conclusão, não são apenas os jovens que saem prejudicados, mas toda a sociedade. Acompanhem o raciocínio: o perfil da Covid-19 mudou, a população idosa está finalmente sendo vacinada, no entanto, os jovens agora têm sofrido complicações mais preocupantes, chegam aos hospitais em condições muito ruins e ficam muito mais tempo internados em uma batalha gigantesca pela vida. Esses jovens lotam os leitos de UTI, e dessa forma não sobram vagas para novos pacientes, o que tem aumentado e muito o número de mortos por dia no país. 

A cada dia um novo recorde de mortos, uma nova cepa do vírus. Não tem leito para todo mundo, se chega um jovem sem comodidade e um idoso ao hospital a procura de um leito, para quem vocês acham que ele vai? Para os forever young com mais chances de sobreviver ou para o idoso com diabetes, hipertensão e asma?

Reflexão forte, texto pesado, mas não vou me desculpar. Sei que tem muitos desses jovens saem de casa não para farrear, mas para trabalhar, são eles que levam sustento ao lar. Com o fim do auxílio emergencial no final do ano passado e com a nova “merreca” do novo, muitos cidadãos foram obrigados a voltar a trabalhar e enfrentar ônibus lotados. Se eles são obrigados a sair de casa e se aglomerar contra sua vontade, por que não podem curtir o final de semana numa festinha?

Cada um faz o que quer da sua vida, o vírus mortal está no ar, ele circula, sofre mutações, e tem se tornado mais perigoso e letal. A pandemia não vai durar para sempre, mais cedo ou mais tarde, tudo indica que mais tarde, ela vai acabar. A sua juventude pode durar para sempre, isso se você estiver vivo para aproveitá-la. Pense em você, pense no próximo, use máscara, evite aglomerações, se cuide. Em breve sairemos dessa, mas é preciso pensar consciente agora. 

 

 

Por Bianca Morais 

Dando continuidade a comemoração ao mês das mães, o Jornal Contramão traz hoje a história de Vanessa. Mostraremos os prazeres e os desafios de conciliar a rotina profissional com a maternidade durante a pandemia.

Vanessa Cristina Lopes Santos, tem 46 anos e é professora do curso de Engenharia Elétrica da Una Cristiano Machado e do Uni-BH. Além de exercer o papel como profissional da educação, também atua em um outra área muito importante, a maternidade. Vanessa é mãe de três crianças, Fernando, o mais velho, e as gêmeas Isabela e Letícia.

Para a professora, ser mãe sempre foi mais que um sonho, foi uma realização como mulher. Casada há 15 anos, ela sempre teve o desejo de ter no mínimo dois filhos. “Na realidade, sempre enxerguei a maternidade como um empréstimo em confiança. É uma missão que Deus nos confia”. E Deus confiou e muito nela, dando-lhe três filhos, pois sabia que ela seria capaz.

 

Começa uma história de amor

Vanessa e o marido fizeram Engenharia na mesma faculdade, porém não se conheceram nessa época. O encontro aconteceu apenas no mestrado, anos depois. Podemos dizer que foi obra do destino, pois logo se apaixonaram e estão juntos até hoje. 

Depois de casados, os dois planejavam o futuro. Queriam dois filhos, para eles o número ideal para ter uma vida tranquila e confortável. Fernando, 11 anos,  é primogênito. Um menino muito calmo e que sonhava com a companhia de um irmão. Para os pais, o cenário perfeito, pois sempre idealizaram um ambiente de partilha, uma criança sendo companheira da outra.

Na época em que descobriu a segunda gravidez e contou ao filho, Fernando já sabia que viriam dois, isso sem ao menos a mãe ter feito o ultrassom. “O mais interessante é que quando soubemos da gravidez, fomos perguntar ao Fê se ele iria ter irmão ou irmã, qual seria o presente que  o Papai do Céu mandou. Para surpresa de todos, ele  nos disse que ganharia dois irmãos e contou na escola, para a família e a todos que ele conhecia. Nós achamos aquela situação engraçada”.

Fernando foi preciso em sua intuição! A mãe realmente estava grávida de dois bebês, só que esperava dois irmãos, porém na realidade eram duas meninas: Isabela e Letícia, atualmente com 7 anos . 

“No dia da ultrassonografia, quando o médico disse que tinha uma surpresa, eu e meu marido nos surpreendemos mais ainda com a sensibilidade do Fernando. Este acontecimento aumentou demais nossa fé e nos uniu muito como família, acreditamos que a sensibilidade dele foi uma forma de Deus nos mostrar o quanto ele estava depositando confiança em nossa fammília”.

O cotidiano antes da pandemia

Passeios em família eram constantes

Antes do isolamento, a família vivia a mesma rotina diariamente. Na parte da manhã, as crianças tinham uma cuidadora, à tarde iam para a escola e à noite ficavam com o pai, pois Vanessa tinha que se dividir em seus empregos, em uma empresa privada e nas faculdades.

“Eu saía para trabalhar cedo,  no horário do almoço levava as crianças para a escola e voltava ao trabalho. Chegava em casa por volta das 23h, a essa altura meus filhos já estavam dormindo. No outro dia, eu saía às 6h30 e eles ainda não tinham se levantado.Assim, nossos encontros eram no horário do almoço e no caminho da escola”, relembra.

Era aos finais de semana que Vanessa de fato conseguia aproveitar e passar um tempo maior com os filhos, e ela fazia questão de aproveitar cada minuto. Ia com os garotos passear em praças, clubes, andar de bicicleta, enfim, tirava o atraso da semana.

Mudança radical

Com o início da quarentena, Vanessa passou a trabalhar em home office, as crianças passaram a ter aula online, foi quando a rotina mudou completamente. Se antes a mãe pouco via os filhos, agora ela acompanhava de perto cada momento.

“Atualmente,  o tempo todo estou a conciliar e encaixar tarefas. Os horários se sobrepõem e a rotina é uma palavra quase em desuso em casa. Me tornei uma mãe mais dedicada em tempo, mas também percebo que às vezes tomo muito controle da situação. Assim, tento deixar as crianças desenvolverem sua autonomia, mas me freio muito”, explica.

Dentro de casa, 24 horas com os filhos, Vanessa consegue acompanhar de perto a alfabetização deles, estar perto nessa fase de construção de conhecimento dos filhos, por ser professora, é capaz de ser mais compreensível e intervir de forma mais assertiva no que diz respeito à rotina escolar.

O ensino remoto dos filhos

No início foi necessário um período de adaptação para toda família, diferenciar os dias das semana dos fins de semana, explicar à eles que mesmo em casa, não era tempo de férias,  foi uma missão desafiadora.

“Passamos por um período de conscientização das responsabilidades e de entendimento da situação. Para ajudar na compreensão das crianças, fomos explicando, juntamente com os professores, que estávamos passando por uma situação crítica e enfrentando uma doença desconhecida e severa. Assim, eles conseguiram se adaptar ao confinamento e se protegerem”. 

As gêmeas estão em fase de alfabetização e em nenhum cenário Vanessa previa viver esse momento tão próxima delas. A mãe consegue muitas vezes assistir  parte das aulas com as pequenas e ajudá-las. Sem contar, que apesar de trabalhar durante as aulas delas, a mãe precisa se transformar em duas, é um olho no trabalho e outro dividido entre as meninas.

“Coloco elas em cômodos diferentes, porque são gêmeas e se ficam juntas vira palhaçada, brincadeira atrás de brincadeira. Fico em um cômodo intermediário, onde eu consigo ver as duas”.

Se já dá trabalho dar conta de uma criança em aula online, imagine duas meninas sendo alfabetizadas. A mãe relata que há  dias tranquilos e outros bem agitados. “Tem dia que o lápis quebra a ponta, aí pega o lápis da outra e se torna motivo de briga”. Vanessa, ao invés de perder a cabeça, enxerga ali a oportunidade de ensinar as duas a partilhar. “Eu consigo ver onde elas estão tendo uma dificuldade, intervir, uma coisa que eu não veria se eu não estivesse participando”.

Diferente das mais novas, o filho mais velho é bem independente e sossegado, porém não gosta muito de estudar e como grande parte dos pré-adolescentes prefere jogar bola e passa um bom tempo no Tik Tok. Para cumprir as tarefas escolares, a mãe precisa ficar no pé, porém vê com bons olhos a chance que tem de estar dentro de casa, acompanhar de perto e poder mostrá-los as consequências das escolhas que ele faz. 

“Sinto que está sendo um período muito difícil para o mundo inteiro, mas me trouxe chances únicas e indispensáveis”, revela.

Em relação ao método de ensino remoto dos filhos, a mãe avalia que apesar de a distância, são aulas muito boas. “Os professores acompanham as atividades, exploram o conteúdo, conversam com as crianças, mantêm os intervalos para levantar e descansar a vista da tela. As aulas que me deixam de cabelo em pé são as de educação física. A casa vira de pernas para o ar”.

A profissional

No horário em que ministra suas aulas, Vanessa conta com o apoio do marido. É ele quem consegue manter as crianças em silêncio, aproveita o momento para dar banho e lanche. A professora tem uma placa de “mamãe em aula”, que deixa na porta e se fecha no quarto de estudos. Nessa hora eles sabem que a mãe está no trabalho, por isso, não interferem muito. Mas foi preciso orientá-los sobre a seriedade do silêncio durante esse período em que ela está com seus alunos. 

“Na hora dos intervalos,  eu abro a porta e todos entram como um furacão. Mãe eu quero pizza, mãe eu quero isso, mãe eu quero aquilo. Aí eu respondo que  daqui uma horinha ou duas a mamãe está fazendo tudo que vocês querem”.

Se surpreende quem pensa que o dia de Vanessa acaba depois de dar sua última aula. Ali, a noite na verdade está apenas no começo. Depois de colocarem as crianças na cama, ela e o marido separam as atividades das meninas e já preparam tudo para o dia seguinte.

“Como são crianças, nem sempre eles conseguem acompanhar e fazer tudo, sempre tem um para casa que passa despercebido. A gente tem que aproveitar para colocar tudo em ordem no sábado ou no domingo. Também é nos finais de semana que fazemos as leituras, treinamos as sílabas, as letras, a pontuação, a acentuação, e prepararmos as tarefas que segunda-feira”.

Diversão em casa

As aulas das crianças terminam por volta do meio-dia, e é a partir daí que inicia-se o momento de brincar. Os três filhos sempre se divertiram muito entre si. Em meio a pandemia e o isolamento social, Vanessa encontrou uma forma de driblar a falta de rotina com outros amigos e trouxe  novo membro para a família: o Flash, um cãozinho. “Flash é um cachorrinho lindo e sapeca, a hora de levá-lo para passear é um dos melhores momentos do dia, é uma algazarra”.

Flash, o amiguinho especial

Outro momento que a família também tira para descontrair é quando Vanessa tem provas para corrigir, ela reúne todos na mesa e é “hora da escola”, cada um faz sua tarefa e aproveitam para passar o tempo juntos. “Logicamente que uma coisinha ou outra sai da linha né. Se é uma tarefa que dava para fazer de manhã, ela gasta de manhã e  à tarde, mas aqui com saúde, fé, boa vontade, às vezes a polêmica a gente contorna”.

Os desafios da pandemia em família

Na rotina da mãe e professora existem dias mais difíceis, em que as tarefas não são concluídas e o cronograma não é cumprido, mas mesmo assim ela  garante que não se deixa abalar e que sua fé a faz acreditar sempre que tudo na vida é um aprendizado. Paciência, confiança e fé são suas palavras de ordem. 

“Daqui um tempo vamos poder parar, olhar para trás e espero que possamos agradecer por ter saúde, por ter o desafio vencido e ter crescido como ser humano, como família e estarmos mais fortes e mais preparados. Acredito que a pandemia me mudou como pessoa em muitos aspectos, principalmente em reconhecer os meus  limites e dos outros, entender que todos estamos sujeitos a problemas e ninguém está livre de mazelas. Assim, a fé aumenta e a gente aprende a confiar mais, confiar na vida, na proteção de Deus”.

Vanessa é uma mãe muito dedicada e grata a família que tem. No momento em que uma doença assola o mundo, ela enxergou a chance de ouro de se aproximar de seus filhos. Em meio a correria do dia a dia ela tenta dar atenção a cada um individualmente e educá-los da melhor forma possível. Ao estar diariamente presente, ela percebe as necessidades de cada um e entende a hora certa de interferir.

“Às vezes no momento em que você não pode intervir numa determinada situação, no momento exato do acontecimento, outra acontece e te dá a oportunidade de fazer uma abordagem mais madura. Nós somos muitos transparentes aqui em casa e fica mais fácil a percepção de como está cada um. Como eu via muito pouco meus filhos, apenas quando íamos para a aula, eu conversava muito com eles e explicava como é importante sermos sinceros e contarmos uns com os outros”, finaliza.

 

*Edição: Daniela Reis

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Crédito: Pixabay

Por Grégory Almeida

Essencial significa aquilo “que constitui o mais básico ou o mais importante em algo; fundamental”. Até aí, ok. Se pesquisarmos uma frase com a palavra, fique certo de que a famosa citação do aviador francês Antoine de Saint-Exupéry saltará aos olhos. No livro, O Pequeno Príncipe, há um diálogo, entre uma raposa e o principezinho, muito relevante sobre a nova palavra de nosso cotidiano. Conhecida por sua astúcia, a raposa se gaba por se deixar guiar pelos sentimentos. Ela acredita que a intuição – no caso dela, o instinto – deve guiar as decisões, e não a razão. E aí vem minha indagação: o que você julga essencial para você próprio deve servir como régua para “o meu essencial”? Pensemos nisso. Ah, leia o livro. O clássico não é só para misses.

Em dias de pandemia, vivemos uma dualidade de sentimentos sobre o certo e o errado. Um conceito cai em minutos, há erratas a todo momento, e, no fim, nos resta contar mortos.  Os dias estão difíceis. Claro que a gente vai ouvir, de alguns super-heróis, que a tal gripezinha não lhes afetou. A estrutura psicológica desses caras foge da realidade. A pandemia reforçou a ideia do ignorar, do desligar da realidade pra não pirar. Ignore esses caras e não pire.

Seguimos. Abre e fecha de comércios, abre e fecha de igrejas. Um abre e fecha disso e daquilo. Protocolos estabelecidos por “grandes nomes”, que regem nossas vidas. Podemos e devemos analisar as decisões pelo caminho da capacidade política de ponderar o cenário, por erro de gestão, por conjurações políticas, pelos tais favores que eles sempre devem, e até pelo seu voto (faça sua autoanálise), mas, talvez, não precisemos analisar seguindo o conselho da raposa do livro: “o essencial é invisível aos olhos”.

Qual o caminho? Talvez ninguém, saiba. A única certeza é que erramos como sociedade. Fecha comércio e empresários vão à falência. Abre comércio e o número de infectados e mortos aumentam. Eu já ouvi: “Se eu não trabalhar, como vou comer?”. Mas não seriam estes que estão levando o vírus para casa? Quem sabe? Já ouvi, também: “As pessoas que querem as igrejas fechadas, evangélicas e católicas, não sabem o poder da fé”.

Mas a bíblia é enfática em dizer: “É melhor ir a uma casa onde há luto
do que a uma casa em festa”. E os versículos seguem nos Eclesiastes. Pois te pergunto: Quem está certo? Pois é, não se sabe. E é claro que temos inúmeros outros serviços essenciais não citados por este que escreve. A intenção, aqui, não é sobre definir certezas, e, sim buscar alternativas para amenizar a dor de todos. Mesmo porque os questionamentos precisam de contexto. E lembre-se; amenizar a dor de todos. Isso mesmo; de todos.

Ao pensar em “todos”, é emergencial implorar aos eleitos que não desprezem a ciência, nem barganhem com ela. Ela, sim, é essencial. Ao seguir as falas do que já ouvi, um engenheiro mecânico me indagou sobre minha decisão por tomar a vacina. Afirmei: “Acredito na ciência!”. Ele respondeu: “Que ciência?”. Ao pensar em todos, teremos de nos preocupar, também, com os “instruídos”. Eles também votam. Alguns deles gostam de contar números de recuperados, e não de óbitos. O que não me parece ser o cenário que mudará a situação. Afinal, os nomes nos obituários estão ficando entre os nossos conhecidos, nos próprios bairros e nas ruas de cima.

Hoje, não teremos respostas e acho que nem precisamos. A gente quer é passar por tudo isso e sobreviver. Quem será aplaudido, não sabemos, mas o alvo de todas as críticas, sim. É preciso pensar que nunca seremos um país sério enquanto estivermos polarizados. Minha barraca de água de coco não é menos importante que sua empresa. Mas, se seu direito de ir e vir me traz um vírus mortal, não é sobre essencialidade que estamos falamos; é sobre você não saber usar seus direitos. Quem pode fica em casa. Quem não pode sai, mas assumindo riscos. E assumir riscos torna a linha tênue sobre “o seu essencial” não ser “o meu essencial”.

Pra fechar: a raposa não é racional, mas o príncipe, sim. E ele decidiu repetir a frase, para guardar na memória.

– Adeus, disse a raposa. Eis o meu segredo. É muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos.

– O essencial é invisível para os olhos, repetiu o principezinho, a fim de se lembrar.

Qual essencial? “O meu ou o seu”?

 

*Edição: Professor Mauricio Guilherme Silva Jr.

Créditos: Freepik

Por Arthur Paccelli

A pandemia da covid-19 trouxe consigo uma das maiores mudanças comportamentais da história. A maior e mais eficaz recomendação das autoridades de saúde é ficar em casa, o que resultou em reviravolta na rotina de trabalho de milhões de pessoas ao redor do mundo. Basicamente, todo serviço possível passa a ser feito em casa.

Home office antes da pandeia, para muitos, era uma realidade distante. Muitos acreditavam ser impossível fazer o trabalho fora do escritório. Diante de um cenário cujo ato de sair de casa se transformou em sinônimo de correr riscos, não houve outra escapatória a não ser aderir.

Historicamente, o ambiente do lar é associado a um refúgio de tudo aquilo que nos desgasta e nos estressa no mundo externo. Ouvimos, desde sempre, que não se deve levar trabalho para casa. A “cultura” de desmembrar, radicalmente, a casa do trabalho gerou resistência e delonga na adaptação ao novo modelo.

Isto é, nosso subconsciente percebe a casa como ambiente de descanso. Logo, o foco no trabalho é afetado, não somente pela mudança do ambiente, claro, mas, também, devido ao clima de incertezas de uma pandemia. Não se pode negar que um local tranquilo propicia uma experiência de trabalho melhor.

Pessoas que moram sozinhas, geralmente, não veem problemas, e até preferem o home office. Por sua vez, aqueles que moram com a família, ou têm crianças em casa, por exemplo, encontram dificuldade de adaptação e preferem ir ao escritório. Isso se reflete na situação daqueles que não detêm espaço silencioso e calmo, separado do restante da casa, para trabalhar.

Inúmeros trabalhadores não têm sequer uma estrutura de mesa e cadeira adequadas para o exercício da função. Assim também ocorre no contexto de regiões de periferia, onde não há rede de internet de boa qualidade.

A jornada de trabalho, talvez, tenha sido a que mais sofreu alterações. Como não é mais considerado o tempo de deslocamento de casa à empresa, o trabalhador “ganhou” horas a mais. Em diversos casos, o expediente começa um pouco mais cedo, e só termina quando as demandas acabam, pois não há mais aquela pressa para ir embora.

Uma vez que o motivo de não sair de casa – nem para trabalhar – seja prevenir-se de uma doença, não há o que questionar. A verdade, contudo, é que trabalhar em casa, como tudo da vida, tem dois lados. Os prós e os contras do home office são bem correlatos: ainda que dispensar o uniforme, o dress code, e poupar o tempo do transporte possam ser agradáveis, não ter interação direta com os colegas, ou com o chefe, pode ser estressante, principalmente, em trabalhos de equipe (situação, aliás, da maioria).

Em tese, o modelo de trabalho em home office exige, acima de tudo, paciência, organização e foco. Não podemos romantizar as atuais circunstâncias, pois os desafios são diários. Em meio à atual crise socioeconômica global, é de grande valia ter um emprego. Voltaremos aos escritórios sabendo valorizar e apreciar o melhor dos dois mundos.

 

*Edição: Professor Mauricio Guilherme Silva Jr.