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cabelos cacheados

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Por Eduarda Boaventura

Aos 7 a menina ficava na frente da televisão vendo o DVD do show da sua ícone. Enquanto Shakira performava hips don’t lie, a menina dançava sonhando em ser ela. Aos 10, viu uma reportagem sobre uma garota que fez várias cirurgias plásticas para ficar igual a Barbie e contou para a família inteira que ia tirar uma costela para ficar com a cintura fina igual a boneca e a cantora. 

Cantora Shakira. Foto: ADN Rádio/divulgação.

Ainda aos 10, sua mãe levou ao cabeleireiro e as duas foram persuadidas a fazer progressiva e assim ter o cabelo liso, sendo mais fácil de cuidar, de acordo com a profissional. Nesta mesma época, o cabelo estava estranho, vivia com ele preso e se comparando às meninas da sala. Mas continuava ouvindo a cabeleireira e de 3 em 3 meses passa no cabelo um produto que fazia seus olhos arderem. Sua tia elogiou o cabelo, disse que o outro dava a impressão de mal cuidado, selvagem, agora a menina ficava linda e delicada. Essa mesma tia começou a fazer comentários sempre que visitava a sobrinha. “Está engordando” disse uma vez “se cuida enquanto ainda é nova porque depois fica mais difícil perder essa barriga”. 

No seu aniversário de 13 anos, a tia perguntou para sua mãe, na sua frente, se não ia olhar uma academia. A menina começou a fazer natação na semana seguinte. Um dia qualquer, uma amiga da escola, que tinha o cabelo claro e liso até a cintura, levou uma revista mostrando uma modelo parecida com ela. A menina começou a reparar, não via o seu tipo em lugar nenhum.

Neste mesmo ano foi para outra cidade, e por conta da mudança e sem conhecer nenhum salão, ficou um tempo sem alisar o cabelo. A menina que estava se transformando em adolecente não estava se importando com o cabelo diferente que crescia, até na escola nova chegar um menino e a chamar de Simba. Comparada com um leão, ela odiou o volume do cabelo novo, chegou chorando e marcou um horário o mais rápido possível. Até chegar o dia teve que aguentar os novos apelidos, Simba foi o mais usado, às vezes era chamada de cabelo ruim, duro. Quando voltou ao liso tradicional, foi uma surpresa quando pararam de falar do seu cabelo e começaram a falar do seu corpo. Afinal, se ela tinha resolvido o problema anterior para que achar outro? 

Ficou um ano ouvindo o que todos os colegas de sala tinham a dizer e fazendo o melhor para melhorar. Ela “tinha barriga” então toda manhã fazia abdominal antes das aulas, ela tinha “bunda grande” então usava calça larga para disfarçar, era “muito alta” e não usava nada além de tênis e chinelo, “sobrancelha muito fina” e antes de sair de casa passava um lápis para engrossar.

Com 14 anos, pediu à mãe para fazer descolorir os cabelos escuros em loiros para parecer as mulheres que admiravam. Neste mesmo ano, de presente, a tia deu um sutiã com espuma, que dá a impressão que tinha mais seios e a jovem adorou, usava sempre que ia sair. Ela e a tia ficaram mais próximas, faziam algumas dietas que via na internet e a tia perguntava se ela não ia colocar silicone igual as mulheres da família tinha mania de fazer. A jovem tinha medo de fazer qualquer procedimento, então dizia que iria olhar só para a outra não ficar perguntando. 

Até meus 22, a adolecente que virou mulher, ia rigorosamente ao salão para manter a cor clara e as mechas lisas. Acordava mais cedo para ir na academia antes do trabalho, montava o cardápio da semana, não ia em festinha porque sabia que ia furar a dieta, não saia com os amigos para não ficar na tentação de beber uma cerveja.

Perdida tanto tempo, tanto sono, tanta coisa, se perdia, e mesmo sendo igual as mulheres das propagandas se sentia diferente. Perdeu a vida, a emoção, e depois de muita terapia viu que teria que perder a voz da tia na sua cabeça. Decidiu se encontrar, sem se forçar além do necessário, sem se procurar em outras pessoas, sem ouvir o que os outros tinham a dizer. 

Procurou ajuda de médicos e especialistas, conversaram e ela tirou uma pressão de viver todos os segundos do dia sendo “saudável”. Comeu pizza em uma terça, saiu do com os colegas de trabalho na sexta e bebeu, passou o sábado chorando, no domingo recordou que o progresso é trabalhoso e se vive um dia de cada vez. 

Demorou a tomar coragem, olhou salões, marcava e desmarcava horários, só de pensar chegava a chorar. Um dia qualquer mexendo no Instagram, apareceu uma postagem da Shakira, em que a cantora ainda era adolescente, antes da fama. Os cachos eram diferentes mas a cor era tão escura quanto a sua. A mulher voltou a sentir uma menina, que não sabia o que fazer com o cabelo. 

Ela, sozinha em casa, decidiu ser livre. Se livrou da progressiva, das mechas claras, da pressão, do medo. Sentiu o vento na nuca e riu. Finalmente ouvindo sua voz.

Buscou na internet inspirações, produtos para cuidar, pessoas que pareciam com ela. E aos 26, comemorando seu aniversário, a mulher cantava em um karaokê, e imitava a Shakira sabendo que era tão única quanto ela

Encontrou a sua voz depois de tanto tempo, de tanto ouvir as vozes dos outros. 

A mulher que se encontrou em uma confusão de cachos cacheados e nas curvas de seu corpo.

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Por Daniela Reis

Edy Rios é considerado o “Reis dos Cachos” no estado da Bahia. Queridinho de muitas famosas, se especializou em cabelos cacheados e crespos. Recentemente lançou sua própria linha de cosméticos e essa semana ele chega a Belo Horizonte para fazer a cabeça das mineiras. 

O Contramão conversou com o cabeleireiro e hair stylist, confira a entrevista!

Conta pra gente, quando começou a trabalhar com cabelos cacheados e por que focar nesse tipo de fios?

Eu já trabalhava com outros tipos de cabelos, mas focar nos cabelos cacheados foi uma surpresa do destino. Uma grande foi fazer mechas com outro profissional e o resultado não ficou positivo, ela me pediu para corrigir. No início fiquei um pouco receoso, pois não tinha experiência em cabelos crespos, mas quando coloquei a mão na massa, foi uma surpresa! A cor ficou linda, perfeita. Ela começou a me indicar para outras pessoas e o processo foi acontecendo, fiquei reconhecido pelo meu trabalho. 

Como surgiu a referência “Rei dos Cachos”? 

Não foi de um dia para o outro. O mercado dos cabelos crespos e cacheados não tinha um nicho específico. A minha maior propaganda foi boca a boca, as pessoas começaram a me conhecer através das indicações, daí surgiu o “Rei dos Cachos”. 

Muitas mulheres alisavam os cabelos e eram reféns de chapinha e processos químicos. Hoje, elas querem assumir a identidade cacheada como você analisa esse processo? 

A dependência química capilar é como qualquer tipo de dependência química.  Ela limita as pessoas, faz com que as pessoas fiquem na inerência de ter sempre alguém ou alguma coisa. Com relação ao cabelo, a busca pela independência foi o que deu início ao  movimento de libertação. E mesmo com o movimento, me lembro que quando as meninas vinham atrás de mim para cortar o cabelo e retirar a  química, era uma sensação muito estranha, porque eu sentia dor junto com elas.  São muitas as questões que envolvem um processo de mudança, de sair da zona de conforto e mudar a sua textura. Mas no final, esse processo delicado tem um resultado lindo e é  emocionante poder participar desse momento único, em que a mulher consegue se redescobrir, se rever.  Muitas delas não se lembram nem qual é o tipo de cabelo que tinham antes da química e que naturalmente é maravilhoso. 

Quais os cuidados essas mulheres devem ter no processo de transição? 

O processo de transição é bem delicado e difícil. Para algumas pessoas chega a ser doloroso, mexe muito com a pessoa e com a autoestima. Mas quem se propõe, tem que iniciar já pensando no final da transição, no resultado.

Qual a dica você dá para quem quer iniciar esse processo de transição? O ideal é procurar um profissional para manter a saúde dos fios? 

A primeira dica para quem vai iniciar a transição é procurar um profissional especializado antes de começar. Hoje, o acesso às redes sociais ajuda muito. As pessoas conversam sobre o assunto, trocam ideias, pegam indicações de profissionais. Outra dica é ter persistência e paciência, entender que você é o responsável pela sua vida, pelas suas escolhas, então não deve dar ouvidos para alguns comentários durante o processo. Realizar a transição em um espaço que trabalha e foca em cabelos naturais, como o meu, é excelente, pois a pessoa vai ter contato com outras que querem e optam pela mesma coisa que ela.  Recentemente, você lançou sua própria linha de cosméticos, conta um pouco pra gente sobre essa novidade e o que as cacheadas podem esperar dos produtos. 

O lançamento da minha linha aconteceu em um momento bem legal. Eu já estava estudando a possibilidade de trabalhar em cima disso há dois anos. A minha experiência de quase uma década com cabelos naturais me fez entender o que de fato os fios necessitam.  Eu  tentei juntar todos os  produtos em uma linha totalmente liberada pelos órgãos competentes e que foram desenvolvidas com tudo que há de melhor. O resultado ficou surpreendente. Elas podem esperar muito, pois o que eu quero é que o produto cuide dos cabelos assim como eu, com carinho. 

Edy, você passou por um grande susto quando contraiu a Covid-19. Agora recuperado, conta para gente sobre esse período e qual a lição você tirou disso tudo? 

Foi há exatamente um ano atrás que eu contraí o vírus, fiquei em estado grave. Foram dez dias entubado, fiquei com sequelas bem delicadas, tive que realizar a amputação dos dedos dos pés. O que mais aprendi é que nós somos dádivas divinas e que Deus é só amor. Entendi que Ele me ama, que sou capaz de superar qualquer tipo de dificuldade. Enfrentar a Covid foi o momento mais difícil da minha vida, e posso garantir, já enfrentei muitos obstáculos complicados. Eu quero aproveitar para agradecer a Deus e a todas as pessoas que oraram por mim nesse momento tão delicado que venci. 

Você é uma grande referência quando o assunto são os cabelos cacheados. Atualmente você atua em Salvador na Bahia, qual a motivação para vir atender as mineiras? Você já tem uma relação com BH?

Então, eu sou baiano e sair de Salvador para ir em outra cidade, como Belo Horizonte, para mostrar o meu trabalho é uma grande satisfação. Isso é a prova da empatia e reciprocidade que as pessoas têm pelo meu trabalho. É uma forma de carinho! BH foi a primeira cidade que eu vim pra fazer atendimento fora do meu estado. Já tenho uma relação muito legal com a capital mineira, são mais de cinco anos,  então eu me sinto em casa. Quero aproveitar a oportunidade para agradecer Belo Horizonte,  que sempre me recebeu muito bem. 

O cabeleireiro estará na cidade nos dias 12 e 13/03, sábado e domingo. Informações e agendamentos (31) 99957- 6775 (Gaby). Para saber mais sobre o trabalho de Edy Rios acesse seu perfil no Instagram.