Literatura

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Arte Dreamstime

Já adoeci de amor, porém não me lembro de nada, bem verdade não me lembro dos detalhes de alguns ares, talvez fosse madrugada, devo ter sentido febre. Para tentar dormir tomei água gelada, mas de nada adiantava, o que era aquilo que comigo acontecia jamais me imaginava assim algum dia. Pior foi adoecer sem saber o que sentia, não falando da dor a dor era exata faltava o diagnóstico do que se passava.

Segui com o silêncio dos meus passos pela madrugada, caminhei até a janela nada que me distraísse passou por ela. Pensei em amenizar a dor tentando adormecer. Mas você sono, sim você fez o favor de desaparecer bem na hora que de você mais preciso.

Sono seu covarde deixou o papel de “ombro amigo” para o travesseiro, ele sim foi meu companheiro noite adentro até o amanhecer, corajoso escutava cada pensamento da minha cabeça em sintonia com as batidas no peito e com muito respeito me deu até uns conselhos, disse para não ter medo que na maioria das vezes o amor era cura, em outras a doença, dor, decadência, dependência, diversos adjetivos poderia ser dado a esse sentimento, que pelas pessoas é tão conhecido, entretanto nem sempre de vivido.

Não importa a dor ainda está batendo na porta do meu peito, já tentei não tem jeito me deixe descansar amanhã acordo ás 05h20hs para trabalhar. Já sei vou ligar a TV não quero dar audiência para você, com certeza essa minha velha amiga me fará adormecer.

Contudo, estava enganado, deitado e esgotado com as vistas cansadas por causa da tela de 21, mas sono que é bom nenhum.

Lembrei-me dos conselhos que escutei de pessoas que convivia que sempre me diziam –“Dor de amor? Não deixe ela te matar vá logo para um bar”. Beber era uma opção, parcialmente uma solução, até que o efeito passasse e chegasse de novo à solidão, junto com á dor de amor que saia supostamente do coração, “oh não que farei? Todos os antídotos tentei”.

Aquela noite foi difícil, aquela noite parecia eterna.

As memórias estão ficando mais fortes não sei se é bom ficar lembrando, tem coisas que na nossa vida a gente segue constantemente jogando pra debaixo do pano, como se fosse adiantar logo vem o vento e joga tudo para o ar.

Recordo que já estava enlouquecendo nem me preocupando com o fato de acordar cedo para trabalhar, apenas queria me curar daquele aperto, por não ter aquele alguém por perto.

Certo de que tudo que tentei foi em vão, diagnosticado com dor de amor resolvi então pegar um copo de vidro para me servir um destilado, enchi com vodca até a risca, levei-o perto do rosto, gosto de sentir cheiro de vodca com gelo, antes de sentir o gosto. Como quem sente o aroma do batom antes de embebedar-se com beijos.

Então sem pensar duas vezes com dois goles calmos seguidos sem intervalos, matei minha bebida tentando matar a dor.

Lembrei de que agora só queria dormir, e ao acordar, de nada me lembrar daquela noite que a dor do amor me encontrou.

Já haviam me dito que vodca gera amnésia usei dessa estratégia para esquecer que naquela noite começava a sofrer, por isso disse, que era fraca a lembrança de quando por amor vim adoecer.

Isso me fez pensar agora e refletir, já que me recordo um pouco mais dessa memoria da noite passada com nitidez, uma lembrança que como disse antes era vaga.

Então eis a questão o amor que era forte demais ou a vodca que era fraca?

Por Tiago Rodrigues

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Foto: tumblr

Eu o encontro todos os dias na Avenida Silviano Brandão. No ponto de ônibus. Nunca conversarmos. Mas me chama a atenção seu jeito triste. Sempre com um fone nos ouvidos. Sempre com um cigarro na boca. Sempre com um livro em mãos. Nunca ri. Nunca fala com ninguém. Ele é sozinho. Pelo menos é o que eu percebo nos minutos que ficamos juntos esperando o ônibus. Não posso evitar querer saber mais sobre ele.

Talvez este rapaz não seja triste. Talvez esteja apenas cansado do longo dia trabalho. Talvez não goste de conversar ou de sorrir depois de levar uma bronca de seu chefe por demorar a voltar do horário de almoço. Talvez ele seja feliz, muito feliz. Mas meus olhos o veem daquele jeito, e isso me faz pensar em como a tristeza está presente em nós.

Seus grandes olhos azuis não possuem um brilho, seus cabelos perfeitamente bagunçados ficam escondidos por um boné, sinto-me atraída por todo aquele mistério e solidão que o cerca.

Ele fuma para sentir um pouco de satisfação em algo. Mas isso só denuncia seu vazio, sua solidão. Talvez seja daí que venha sua tristeza: do desamparo, da rejeição por ter um emprego ruim, por fazer um curso no qual não se sente feliz. Talvez.

Meu rapaz solitário não ouve os sons do mundo. Ele está sempre com seus enormes fones nos ouvidos. Talvez ouça músicas alegres para espantar os pensamentos tristes que insistem em lembrá-lo o enfado do dia a dia. Mas talvez goste simplesmente de esquecer que a realidade emite sons desagradáveis. Talvez ele queira apenas fugir no barulho de um rádio ou em uma canção que a faça acreditar que a vida será melhor.

Continuo sentada no banco do ponto de ônibus. Ele entra no ônibus que o levará para casa ou até à faculdade. Não há despedidas, mas ele olha para trás uma ultima vez. Eu sei que o encontrarei no próximo dia e ele talvez saiba que irá me encontrar também.

Por Isabella Silmarovi

 

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Foto Divulgação Marvel

NOTA: ☆ ☆ ☆ ☆ ☆

 

Doutor Estranho não é um filme sobre um dos super-heróis mais amados e conhecidos pelo mundo todo, não é um filme que fez crianças e adultos arrancarem seus cabelos durante sua pré-produção e muito menos um filme de super-herói comum. Doutor Estranho é um filme que chegou para derrubar todos os outros e acabar definitivamente com o posto de seus colegas Homem de Ferro, Capitão América, Thor; em resumo: dos Vingadores tradicionais. Benedict Cumberbatch não é somente um ator fenomenal, é também o próprio Stephen Strange de corpo e alma.

O filme relata um incidente que muda totalmente a vida de um neurocirurgião bem-sucedido e egocêntrico chamado Stephen Strange, que após sofrer um sério acidente de carro, tem suas mãos seriamente atingidas, causando sua debilitação. Dr Strange apela para todas as técnicas possíveis da medicina tradicional, investindo toda sua fortuna, entretanto não obtêm êxito algum. Com isso, Stephen apela para um enclave chamado Kamar-Taj, que fica localizado em Katmandu, após descobrir um caso surpreendente de recuperação de um homem que havia ficado paraplégico que havia recorrido ao local. Uma vez lá dentro, o médico descobre que o local não se passa de um ambiente medicinal e sim de um ambiente que lida com forças míticas. Stephen tomado pela vontade de obter suas mãos de volta começa a treinar e com isso acaba adquirindo um completo fascínio pela mágica e com isso se envolve em uma luta contra antigos membros do enclave que utilizam a parte negra da magia, seguidores do vilão mítico chamado Dormammu.

O longa é completamente surpreendente, seus efeitos especiais são completamente impecáveis, nenhum mísero errinho passa percebido, foi tudo levemente bem cuidado, planejado e realizado, transmitindo uma perfeição para a finalização que deixa o espectador numa vibe alucinógena e bastante enérgica. Tal cuidado e excelência na construção dos efeitos colocou os Estúdios Marvel entre uma das apostas para o Oscar 2017 não somente como indicação, mas também como vencedora de sua primeira estatueta. Além dos efeitos, a maquiagem e o figurino encontram-se impecável, digno de aplausos devido a tamanho cuidado e realidade imposto. Se você não saiu da sessão de cinema com a sensação de ter ingerido algum tipo de entorpecente você com toda certeza não viu o filme direito e com toda a atenção necessária.

A história solo do doutor Stephen Strange virou nada mais, nada menos que o melhor e mais bem feito filme de super-herói dos últimos tempos, é um deleite para todos os fãs do quadrinho obter algo tão bem feito, uma vez que por mais que a Marvel tenha sempre sucesso em seus filmes, todos possuem uma mesma linha e uma mesma composição que prejudica muito a sensação de filme novo, história nova, novidade. Doutor Estranho foi exatamente a dose de novidade que a era dos super-heróis precisava para mostrar a todos os amantes de cinema que a era ainda está bem longe de acabar, uma vez que estão caminhando lado a lado com a tecnologia, usando-a de forma bem necessária a seu favor, com isso, as histórias jamais ficarão em suma ultrapassadas. O quê de Strange nos próximos filmes causará a recuperação de uma sensação gostosa e empolgante perante os próximos filmes, uma vez que em alguns momentos os mesmos adentraram uma fase crítica perante a mídia, deixando até mesmo no ar a chance de estarem próximos ao fim.

Os Estúdios Marvel obtiveram também um enorme sucesso ao fechar contrato com Benedict Cumberbatch que parece ter nascido unicamente para viver o personagem dos quadrinhos nas telonas, o gosto de quero mais que ele consegue impor em seu personagem é surpreendente e deixa todos os fãs antigos, novos e até mesmo os que ainda não são completamente extasiados e com os ânimos a flor da pele. Agora apenas resta torcer para muitas doses de Strange nos próximos filmes e que a produtora não deixe que o mesmo caia na mesmice igual com os demais filmes, o que causou um fim deprimente de um dos heróis mais amados, o Homem de Ferro.

Stephen Strange acaba de encontrar seu lugar ao sol, se tornando oficialmente um dos heróis mais amados não só pelos leitores de quadrinhos mais também pela mídia. Doutor Estranho obteve as melhores críticas do ano quando comparado aos demais filmes de herói tanto dos estúdios Marvel quanto dos estúdios da DC Comics, que varia de 3.6 a 4.6. A você que ainda não viu esse colírio para os olhos e deseja uma bela dose de emoção, ação e empolgação para o final de semana, o longa é com toda certeza a escolha certa e merece impreterivelmente ser visto tanto em 3D quanto em IMAX, uma vez que novamente, o estúdio superou diversos filmes destas tecnologias, já que o efeito realmente é bem colocado e causa o desejado, não estando lá somente para encarecer o ingresso e causar dores de cabeça.

Por Isadora Morandi

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Foto Divulgação

NOTA: ☆ ☆ ☆ ☆ ☆

Na quinta-feira, 17, estreou um dos filmes mais esperados do ano, o primeiro longa da nova saga do universo bruxo da escritora britânica J.K. Rowling: Animais Fantásticos e onde Habitam. O filme que teve sessões esgotadas durante toda a quinta-feira, levou milhares de fãs do bruxo mais famoso do mundo, Harry Potter, a completa loucura. É claro que nós do Jornal Contramão fomos assistir na íntegra esse “não tão novo assim” sucesso.

O longa conta a jornada de Newt Scamander (Eddie Redmayne), um magizoologista britânico que chega à cidade de Nova York carregando sua preciosa maleta magica repleta de animais fantásticos. Scamander está realizando viagens por todo o mundo em busca de novas criaturas, com o objetivo de estuda-las, acolhê-las e até mesmo salvá-las, uma vez que o bruxo encontra-se escrevendo um livro para mostrar a toda a comunidade bruxa que tais bichos, não são perigosos e sim preciosos aliados. Entretanto, o bruxo não obtém facilidades para sua pesquisa junto à comunidade americana, onde os bruxos temem muito mais a sua exposição perante os “no-majs” do que os britânicos perante os “muggles”.

O filme que se passa anos antes da história do “garoto que sobreviveu” trata diversos assuntos com tamanha delicadeza que não te faz desconectar de um para ligar a outro, sem contar que a todo momento retoma a personagens e a fragmentos já retratados anteriormente nos filmes de Harry, como o famoso bruxo Alvo Dumbledore, o temido Gerardo Grindelwald, a tão amada Hogwarts e obviamente, todos os feitiços usados. Sem contar pelo fato de que o próprio Newt Scamander já havia sido citado nos outros filmes e livros, uma vez que seu livro (que contém o mesmo título do longa) é usado pelos alunos de Hogwarts. Além dos fragmentos antigos, são apresentados novos fragmentos, como a escola norte-americana Ilvermony, o conselho bruxo chamado MACUSA (Magical Congress of the United States of America) e obviamente, as criaturas que Newt leva em sua bagagem.

Escrito por J.K. Rowling e dirigido pelo mesmo diretor dos últimos filmes de Harry Potter, David Yates Animais Fantásticos retrata as diferenças, o preconceito, a hierarquia, superações, conquistas, medos, inseguranças e obviamente, a amizade. O filme consegue ser sombrio e completamente engraçado ao mesmo tempo, contendo cenas de ação hipnotizantes e cenas humorísticas nada forçadas que consegue arrancar gargalhadas de todas as pessoas que degustam do filme. A forma sombria e hilária não é separada somente pelos diálogos e sim também pela fotografia. Nos momentos em que temos Newt perambulando por Nova York, com um jeito meio sapeca e culposo e nos momentos em que o temos juntamente a seus novos amigos a fotografia é amarelada ou até mesmo acinzentada, que torna o ambiente frio e quente ao mesmo tempo, antigo e até mesmo calmo. Com quente e frio ao mesmo tempo podemos caracterizar em relação ao que nos é passado da cena e no que os personagens sentem; na frieza podemos dizer no próprio clima da cidade, que relata como sendo bastante gelado e como quente podemos dizer ser em relação à parceria que Newt consegue conquistar com os novos personagens, as duas bruxas Queenie e Tina e o no-maj Jacob. Nas cenas dentro da maleta temos um misto de cores que consegue com muito louvor despertar uma certa paixão no espectador que logo se apega com o carisma de cada animalzinho carismático que se encontra ali, sem contar na forma como o amor de Scamander pelos mesmos parece saltar da tela. Já as cenas no MACUSA, no orfanato e principalmente nas cenas com os personagens Credence e Percival Gravez temos uma fotografia bem escurecida e pesada, passando uma tensão e uma atenção maior, uma vez que tais cenas possuem uma tremenda carga de mistério que deixa qualquer um que vê bastante curioso com a situação.

O filme consegue ser surpreendente do início ao fim, principalmente com a revelação no finalzinho que absolutamente ninguém esperava e que foi muito bem escondido. É importante ressaltar também a química e a fluidez dos atores com a câmera, o que deixa o ambiente do filme bastante natural, confortável e descontraído, os movimentos são sutis e os cortes leves. O fato mais surpreendente do filme inteiro com toda certeza é seu efeito especial, fator que toma conta de todo filme por si só, fato que foi feito com uma agilidade impressionante, uma vez que dentre toda a proporção do filme apenas uma cena bem rápida consegue incomodar e passar de forma totalmente perceptível aos olhos de quem vê. Os animais e os duelos de feitiços possuem claramente o mesmo padrão realizado nos filmes de Harry Potter, o que faz com que consigam suportar a demanda sem deixar a desejar, é absolutamente como se fosse uma versão mais tecnológica, elaborada e ousada dos demais filmes, fator que funcionou com excelência.

Animais Fantásticos é de aplaudir de pé. O longa não decepcionou fãs, a imprensa e nem a crítica, uma vez que sua nota possui a média 4 em 5, sendo a nota mais baixa 3,3. J.K. Rowling provou mais uma vez que criou um universo tão enorme e excelente que por mais que realize inúmeras coisas sobre o mesmo, jamais ficará maçante e jamais decepcionará ou desanimará os fãs, apenas conseguirá mais amantes e mais pessoas completamente fascinadas pelo grande universo bruxo. O Jornal Contramão recomenda o filme a todos, se você quer aproveitar seu tempo livre, por que não se deleitar em um mundo encantador nos cinemas? Animais fantásticos é a escolha certa! Nox.

Por Isadora Morandi

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Divulgação Rede Globo

Sentado na mesa fumando um cigarro (algo que prometi que ia parar), me pergunto quantos minutos de vida perco somando aquele a minha mão. É um estranho devaneio pensar na morte em si, quanto mais pensar na própria morte!  Pois aí se torna o dobro de devaneios mais um puta epitáfio.  O decorrer dos pensamentos cresce enquanto no seu auge o cigarro se apaga em minha mão.
A mesa estava lotada e envolta de fumaça dos diversos cigarros das pessoas que ali estavam, mas parece que ninguém notou o barulho que fiz na minha mente. Fui lembrando de coisas decorrentes da minha vida. Algumas boas, outras nem tanto. Tive nostalgia e medo, e com certeza umas boas gargalhadas mentais, me peguei pensando no primeiro beijo e enfim em uma pergunta que me fizeram na última sexta feira.

A verdade que na última sexta, em um encontro de amigos e conversa furada, me pegaram de surpresa com a seguinte questão:

“Como era a Capitu para você? “

Ela, a moça que fez a pergunta, tentou explicar melhor me dizendo até como seriam suas duas versões de Capitu, sim duas! Uma como ela realmente era e outra de como ela seria na visão de Bentinho. A pergunta não parava de me martelar desde então, ia crescendo como o burburinho do barulho da geada que se transforma em tempestade!

 Misturado aos pensamentos que já me assombravam por conta do cigarro assassino, a pergunta sobre minha Capitu me atormentava mais! Como seria ela? Como? Seria ela alguém que me aparece sem eu esperar numa tarde qualquer, e faz todo dia 27 ser diferente, ou o beijo roubado no estacionamento em dia de chuva? Seria então o primeiro beijo do lado da igreja ou o primeiro encontro que se tornou namoro por puro impulso?

Minha Capitu! Quem seria ela? Poderia muito bem transitar entre aquela Capitu que surgiu em uma conversa ou outra nos corredores da escola até me conquistar, em uma grande hipótese ela seria forte o suficiente para me fazer apaixonar mesmo não estando por perto!

Ah, pergunta maldita que não me sai da cabeça!  Se não foi a do primeiro beijo na escada rolante, com certeza será a que me abraçou na festa! Que seja! Que seja a que tiro o boné para ela rir ou a Capitu quieta que com olhar, tanto me questiona na mesa ao lado.

Seria eu, louco de imaginar uma Capitu que nunca aparece e me deixa sempre esperando, aonde eu insisto mesmo sabendo que um dia ela vai me deixar? Quem sabe rebelde o meu coração seja suficiente para dizer que no fim minha Capitu nunca existiu que morra eu sem amor com o cigarro assassino que me acalma e assim me trai!

No fim, em defesa de Capitu, seja ela como e qual for, só penso que ela não traiu Bentinho, ele só era um alienado!

Mas para que você leitor não tenha que ficar se perguntando, são onze minutos, onze minutos de vida é o que perdemos a cada cigarro.

Por Daniel Reis

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Foto Reproduão

Todos os chamavam de Sô Zé, depois de alguns dias apenas Zé ou Zé do Suco, era um senhor que estava mais para rapaz, era o único com disposição para ir do primeiro ao último andar, parecia estar sempre perseguindo sua borboleta amarela, menos na hora do futebol na TV, assistia com atenção e ao mesmo tempo parecia não se importar, mas na hora de me contar sobre a partida, qualquer jogo se transformava em uma emocionante final de campeonato. Zé tinha um hábito diferente, uma gaveta destinada apenas para sucos, que poderiam ser preparados a qualquer momento, às vezes mais de cincos sucos por dia.

Zé carregava em seu peito seu amuleto, na primeira esbarrada em alguém, já ia todo orgulhoso, e como um pavão, mostrava seu amuleto que vinha sempre acompanhado da história de como o conseguiu. Em todos os corredores, só se ouvia falar em política, até que Zé aparecia, e não havia sequer uma pessoa que não se espantava ou se encantava com seu amuleto, sua história e sua gaveta de sucos. Em alguns dias ele parecia ser uma atração turística, desde médicos a policiais, de estudantes a professores, sempre apareciam novos grupos, querendo ver o amuleto e ouvir sua história. Mais interessante que sua história, era o próprio Zé, seu carisma era reconfortante, era satisfatório saber que ele continuava ali, com seu amuleto, conversando qualquer fiado quando ninguém mais parecia querer falar.

Era primeiro de maio, Zé estava distribuindo simpatia, desejando feliz dia do trabalhador a todos, principalmente na hora do querido almoço, nesses dias mais queridos ainda. Estava bem mais feliz que em outros dias, foram mais sucos que o habitual, até esqueceu-se de falar do seu amuleto, só me falava que finalmente ia embora em breve. No inicio da noite desse mesmo dia, Zé fechou as janelas e começou a reclamar da frente fria, que a maioria não sentia.

Mas foi pela madrugada que a situação piorou, Zé parecia estar de calundu, mas na verdade uma parte de seu amuleto desprendeu-se, talvez isso explicasse o frio exagerado. Só tive tempo de ver Zé saindo às pressas, não sei em que direção, acho que sabia, mas preferia continuar sem saber. Só tive noticias dele no outro dia, até que mais tarde ele reapareceu, mas não era mais o Zé do Suco. Ficava quase que todo o tempo em silêncio, sua gaveta ficava intacta e o papo antes trocado parecia improvável.

Alguns eternos dias se passaram, e Zé parecia a cada instante mais distante de todos. Até que recebi a mesma notícia que tanto o empolgou, eu iria embora. O mesmo entusiasmo que o atingiu, chegou até mim, mas não tinha graça. Fui até Zé, para dar o meu adeus e o agradecer pela companhia dos difíceis dias, mas não o encontrei. Não sei ao certo, parece que seu amuleto continuou se desprendendo, e ele foi novamente às pressas para outro lugar. Nunca mais o vi, até tentei, mas não consegui. Zé do Suco não é desses que carrega um telefone no bolso. De qualquer forma, me fiz necessário em dizer, mesmo que nunca ouça, adeus e obrigado Sô Zé!

Por João Victor Castro