Diversidade

A cidade receberá mais de 5 milhões de foliões e um de seus  mais tradicionais blocos, o Baiana Ozadas, promete ferver o carnaval belorizontino deste ano.

Por Gustavo Meira

O carnaval de 2023 acontece entre os dias 4 a 26 de fevereiro. O último de BH, realizado em 2020, teve 4,45 milhões de foliões. A expectativa para este ano é que 5 milhões de foliões encham as ruas da capital, o maior da história com 479 blocos.

Desde 2020, Belo Horizonte se consolida como a terceira maior folia do Brasil, ficando atrás apenas para os 15 milhões de São Paulo e para os 5 milhões do Rio de Janeiro. A marca foi atingida quando a capital mineira passou de Salvador e Olinda.

Multidão de foliões reunidos na Av. Afonso Pena, centro de BH. foto: redes sociais

De acordo com a Prefeitura de Belo Horizonte, a movimentação econômica prevista é de R$ 623 milhões. A previsão é que mais de 9 mil vagas de emprego sejam geradas, além dos mais de 15 mil ambulantes credenciados. Esta edição contará com dois patrocinadores, o Sistema Fecomércio-MG (R$1 milhão), entidade que representa o comércio no estado, e a Rede de Supermercados BH (R$250 mil).

O Carnaval de Belo Horizonte terá mais de 15 mil ambulantes nas ruas. foto: PBH
O Carnaval de Belo Horizonte terá mais de 15 mil ambulantes nas ruas. foto: PBH

 

Anna e seus adereços de carnaval produzidos por ela e sua mãe. Foto: Anna Pini
Anna e seus adereços de carnaval produzidos por ela e sua mãe. Foto: Anna Pini

Para a publicitária Anna Pini, proprietária da empresa de artesanato Pixua Ateliê de Linhas, o período pré-carnavalesco já tem dado retorno. Em comparação ao mesmo período do ano anterior, onde a empresária não conseguiu vender seus adereços, neste 2023 ela se mostra muito otimista. ‘’As vendas no pré-carnaval estão indo muito bem. A expectativa está a mil, estou unindo o útil ao agradável, indo a todos os bloquinhos. Eu vou, curto e aproveito pra vender. O público está bem aquecido, botando muita fé nesse carnaval de BH, que desbancou o de muitas cidades’’, diz.

 

Bloco Baianas Ozadas

A cantora baiana Daniela Mercury e seus 30 anos de carreira, é o tema do bloco Baianas Ozadas, um dos mais tradicionais de Belo Horizonte para o Carnaval 2023.  O evento de lançamento aconteceu na última quinta-feira (2), dia de Iemanjá, e contou com ensaios da Bateria Ozada e da Ala de Dança, show da banda Baianas Ozadas, além de convidados.

‘’Pela primeira vez o Baianas Ozadas está homenageando uma artista feminina, homenageando as mulheres. Junto com uma personalidade importante da música baiana, a força das Yabás, as orixás femininas, mas celebrando 30 anos do Canto da Cidade e de carreira’’, é o que disse Geo Ozado, fundador e vocalista do Bloco Baianas Ozadas.

foto: Instagram/Baianas Ozadas
foto: Instagram/Baianas Ozadas

O Baiana é um dos blocos mais tradicionais do carnaval de BH, fundado em 2012 pelo baiano Geo Ozado. O bloco desfila com saias, turbantes, balangandãs, e lavagem das escadarias da Igreja São José, trazendo um pouco da cultura baiana e arrastando milhares de carnavalescos pelas ruas. Em 2017, registrou a marca de 500 mil foliões no carnaval da época. E neste ano, o Baianas Ozadas sai na segunda-feira (20) de carnaval às 9h em frente a Igreja São José, na Av. Afonso Pena.

 

Cármen Valadares no evento de lançamento do Carnaval 2023 Baianas Ozadas - foto: Gustavo Meira
Cármen Valadares no evento de lançamento do Carnaval 2023 Baianas Ozadas – foto: Gustavo Meira

 

Cármen Valadares, 58, é considerada por muitos blocos capital a rainha de bateria, a que puxa a comissão de frente e a ala de dança por conta de sua animação, alto astral e requebrado. Ela está presente há cinco anos no carnaval de BH e já está comparecendo aos ensaios dos blocos. ‘’O carnaval é uma festa muito bonita, que recebe todo tipo de pessoa, gera emprego e renda. Minha expectativa é muita, estou muito feliz com o carnaval e não só esse ano, mas em todos os momentos. Eu sou uma pessoa muito alegre em estar viva, com saúde, em estar bem’’, declara.

Por Millena Vieira e Gabriel Almeida

Entender o sentido da existência de todos os seres vivos, pode ser uma das maiores questões do ser humano, ficando atrás somente do mistério da morte. Desde sempre, os povos ao redor do mundo buscam respostas sobre a existência da vida, pairando pelo tempo as famosas perguntas “de onde viemos?”, “para onde vamos?” e “qual é a missão de cada um de nós na terra?”. Parte da construção de uma resposta, nasce da necessidade de algo sobre além, desencadeada por diversas religiões e filosofias de vida. De contraponto, um dos principais desafios à convivência democrática está ligado à intolerância, por um sentimento de soberania dentro dessa multiplicidade religiosa.

“A religião é a maneira como a gente diz sobre as coisas, além da sua condição material, ou seja, há uma realidade por trás das coisas que é maior do que a sua condição imanente, há uma perspectiva transcendental, há um sentido, há algo de sagrado e de poderoso, místico, então é uma maneira de reler o mundo também”, explica Pedro Luiz de Oliveira Doche, bacharel e licenciado em Filosofia, com pós seguido em Ciência da Religião pela Puc Minas.

A orientação espiritual concebe ao indivíduo formas de compreender o mundo, a si mesmo, os seus valores morais e até mesmo suas decisões políticas. Com a manifestação das crenças religiosas, é preciso analisar a relação do indivíduo com a fé e seu comportamento perante ela. Tal comportamento religioso, na maioria das vezes, é induzido por crenças que perpetuam em uma mesma família por gerações, ou seja, nos seus primeiros anos, o indivíduo não escolhe a sua própria religião, ele já nasce nos berços da influência. A decisão passa a ser de cada um, a partir da autodeterminação das próprias escolhas e seu entendimento de posição no mundo.

A diversidade das religiões no mundo se dá pela identificação e evolução histórica e pelo desenvolvimento de vários povos, cada um com sua própria maneira de interpretar a criação da vida e o fim dela. Em tendência, a intolerância nasce a partir da incapacidade de conviver socialmente com as diferenças, é a ausência da vontade de lidar com o outro, assim como suas ideias, ocasionando atitudes ofensivas a crenças e práticas religiosas ou mesmo a quem não segue uma religião, é a deslegitimação da fé do outro a partir do próprio ponto de vista, porém a afirmação do que é a fé para si não deveria sobressair como é a fé para o outro.

No Brasil, segundo levantamento do Datafolha, a religião mais predominante é a religião Católica, com cerca de 50% da população, seguida pela Evangélica, com 31%, Espírita, 3%, e Umbanda, Candomblé ou outras religiões afro-brasileiras com 2 % dos brasileiros. Em teoria, a Constituição Federal prescreveu o Brasil como país laico, ou seja, garante o direito fundamental à liberdade de religião e o Estado deve prestar proteção e garantia ao livre exercício de todas as religiões.

Embora haja legislação, no último ano, o país obteve 545 denúncias de intolerância religiosa, três queixas por dia, sendo as religiões de matriz africana as que mais sofrem com o preconceito, segundo levantamento realizado pelo Disque 100, serviço para denunciar denúncia de direitos do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.

Terreiro de Umbanda Caboclo Pena Dourada. Imagem: Ana Clara Souza.
Terreiro de Umbanda Caboclo Pena Dourada. Imagem: Ana Clara Souza.

Mateus Araújo, de 22 anos, explica sua trajetória dentro da Umbanda, religião de matriz africana. “Eu cresci aqui… Desde pequeno, eu tive o livre arbítrio para escolher a religião que queria, meus pais foram muito flexíveis com relação a isso… Eu escolhi a Umbanda, porque eu senti que era o meu lugar.” Com a identificação desde jovem, Mateus mostra também como percebe a intolerância em sua forma velada: “O preconceito não está necessariamente na fala, mas sim em como essa fala é produzida e entonada… depende de quem está falando e como está falando.”

Em um país onde seus muros são construídos a partir do roubo, da exploração, da tomada de culturas e liberdades, como a escravidão dos povos negros e indígenas e a catequização, pense em uma realidade de respeito as reais liberdades democráticas, beira ao fictício.

Para cortar as raízes herdeiras da imposição e da importunação sobre a fé do outro, é preciso, antes, de um esforço social e, principalmente, governamental para a criação de medidas e novas políticas de segurança e educação que de fato saiam do papel e sejam subordinadas.

Religiões dos povos indígenas

Apesar da catequização, uma religião indígena resiste e se assemelha em diversos aspectos entre os diferentes povos. A relação com o mundo e a forma como é vista e interpretada é muito diferente do cristianismo, por exemplo. Os povos indígenas abraçam com fé as entidades e os grandes guerreiros que se manifestam através dos elementos da natureza. Eles acreditam que há um criador, chamado Tupã, responsável também pelas chuvas, raios e trovões. Além dele, há outros responsáveis ​​pela proteção do mundo em seus diversos aspectos, sobretudo ligados às matas e às florestas, bem como a crença de que alguns espíritos estão encarnados em animais, potencializando o poder da natureza e da relação dos povos com ela. Em sua relação com a crença e a vivência da fé, acredita-se que alguns possuem o dom de manter contato com os espíritos e as entidades. 

Religiões de matrizes africanas

Assim como algumas religiões indígenas, as religiões de matriz africana, como a Umbanda e o Candomblé, possuem em sua essência, a preservação aos ancestrais, a sabedoria dos mais idosos e a proteção de entidades poderosas e espíritos. Candomblé é uma religião afro-brasileira, que foi trazida pelas pessoas negras escravizadas. Umbanda é uma religião brasileira que mescla elementos do catolicismo, espiritismo e religiões afro-brasileiras. Uma das formas mais conhecidas no Brasil, é Iemanjá, guardiã das águas, e assim como ela, é possível encontrar outros tipos presentes nas duas religiões, onde os orixás são deuses cultuados representantes das forças elementares oriundas da água, da terra, do ar, faça fogo. Duas religiões monoteístas que apesar das semelhanças, não são iguais, uma é genuinamente brasileira. 

rock in rio

Por Keven Souza 

Aconteceu no último domingo (11) o encerramento do Rock In Rio 2022, na Barra da Tijuca no Rio de Janeiro. O evento que reuniu ​aproximadamente 100 mil pessoas no sétimo dia e contou a presença de mais de 36 artistas dos mais variados gêneros musicais, trouxe vida a Cidade Rock em 12 horas de música constante divididos em oito palcos. 

rock in rio
Dua Lipa, esbanjando talendo e brilho no palco mundo ( Foto: Keven Souza )

A atração mais aguardada da noite foi a cantora britânica de 27 anos, Dua Lipa. A artista era headliner do dia, onde, ao som de “Physical“, subiu ao Palco Mundo com todo um espetáculo de cores, luzes e hits. Esbanjando talento, apresentou o setlist com os sucessos de Future Nostalgia, seu segundo álbum de estúdio. Tudo muito bem pensado para quem estava presente no Parque Olímpico e também acompanhava de casa, pela transmissão do Multishow. 

Das músicas aos figurinos – quatro, ao todo – Dua Lipa brincou com cores e não dispensou brilho. Trouxe seu balé que performou garantindo um show à parte com coreografias. A cantora interagiu ainda com a plateia e finalizou, em português, dizendo: ‘obrigado gatinhos e gatinhas’.  

Megan Thee Stallion, Rita Ora e Ivete também foram outras cantoras que abrilhantaram o último dia de Rock In Rio, se apresentando no Palco Mundo. No Sunset, Liniker mostrou toda força da mulher trans preta juntamente com Luedji Luna. Logo após, Majur,  Agnes Nunes, Mart’nália, Gaby Amarantos e Larissa Luz uniram o samba, soul, blues, brega e jazz em um só espetáculo para homenagear Elza Soares.

Cidade do Rock é baile de favela

rock in rio
Toda a estrutura gigantesca do palco mundo. ( Foto: Keven Souza )

Já a cantora Ludmilla, de 27 anos, que também se apresentou no Palco Sunset, foi uma das artistas mais comentadas do mundo na internet após seu show. Isso porque, ela prometeu que faria algo grandioso e cumpriu. A dona do hit ‘Rainha de Favela” investiu em estrutura de palco, luzes e figurinos luxuosos. Além disso, não deixou de lado o funk!

Ludmilla construiu um setlist único, que privilegiava o gênero musical, fazendo com que a Cidade do Rock por um momento virasse baile de favela. Levou ainda a dupla Tasha e Tracie, MC Soffia, Tati Quebra Barraco e Majur para o palco. Como resultado, fez um show certamente histórico que trouxe questionamentos aos produtores do Rock In Rio sobre a participação de artistas brasileiros no Palco Mundo, que é o principal palco do festival. 

O Rock in Rio promoveu inclusão em seus shows deste ano, como intérpretes de Libras (Linguagem Brasileira de Sinais) e mais artistas negros e LGBTQIA+. Mas a principal crítica do público com os produtores foi colocar artistas femininas de grande público, que é o caso de Ludmilla e Avril Lavigne, em palcos menores, como o Sunset. 

A volta do Rock In Rio no Brasil 

Após dois anos desde a última edição do evento do Brasil, que aconteceu em 2019, a Cidade do Rock recebeu um público de 700 mil pessoas com o forte desejo de se reencontrar. Foram sete dias, 1.255 artistas, 300 shows e mais de 507 horas de experiência. 

As parcerias? Muitas! Stands do Globo Play, Tim, Itaú, TikTok, Coca-Cola, Doritos, Latam, Kit Kat, iFood, entre outros, decoraram o Parque Olímpico com cores e vida. E para mostrar que o Rock In Rio é um festival de números, esta edição foi recorde de turistas no Rio. Foram mais de 420 mil pessoas de outros estados do Brasil e uma estimativa de 10 mil de fora do país. 

O Rock In Rio é um festival que impacta diretamente na economia da cidade. É, ainda, patrimônio cultural imaterial do Rio de Janeiro que expande toda nossa brasilidade para o mundo. Que as próximas edições continue com ​​toda a energia e alto astral, pois o evento além de trazer grandes espetáculos para o Brasil, dá um show como festival de experiências!  

 

Festival promete trazer a heterogeneidade de estéticas como principal atração da Cidade do Rock

Por Keven Souza

A 37º edição do Rock In Rio está cada vez mais próximo do nosso Brasilzão! Durante os dias 2, 3, 4, 8, 9, 10 e 11 de setembro deste ano, a Cidade do Rock está prestes a receber mais uma edição histórica do maior festival do país.

O Rock In Rio foi criado em 1985 e mais do que quebrar recordes atrás de recordes desde sua estreia, o festival fomentou ao longo do tempo um estilo fashion influenciado pelo soft rock. Um subgênero da música rock que enfatiza ganchos pop, produção de estúdio impecável e estética sonora mais agradável.

Foram anos e décadas de edições que contaram com um público que priorizava tendências, como boho e athleisure, que aliam conforto e charme. O Parque dos Atletas, localizado na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, foi palco para as peças de couro, os chapéus de cowboy, as camisetas pretas, os acessórios em correntes e franjas e, claro, além das botas, os shorts jeans rasgados.

Imagem/Reprodução
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Mas será que essa estética ainda prevalece? Bom, o que mostra as últimas edições do festival, não tanto quanto antes!

O Rock In Rio embora ainda seja um espaço de shows para distintas faixas etárias, ele está, desde 2019, com uma grande parcela de pessoas da geração Z. Isso motivado pelo line-up diversificado que traz shows de cantores da atualidade, como Anitta, Demi Lovato, Beyoncé, entre outros, que são queridinhos da nova geração.

Hoje, o público que frequenta o Rock In Rio é diferente daquele presente na década de 90 que foi marcado pelo estilo soft rock, por exemplo. Há uma adaptação dessa estética “tradicional” para a atual realidade. Não digo que é difícil encontrar pessoas ainda com esse estilo na Cidade do Rock, mas não será comum tanto quanto antes.

Imagem/Reprodução

A heterogeneidade de estilos

A mudança de público é o fator principal para ocorrer esse choque na estética fashion do festival. As pessoas, e especificamente os jovens, estão preferindo looks e peças de forma mais subjetiva, colorida e menos temática. Sem aqueles limites e definições vistos nas décadas passadas. 

Esse comportamento demonstra uma junção de estilos pessoais de diferentes indivíduos em um só lugar. Hoje, ao invés do público se adaptar ao estilo de um festival e criar um certo padrão fashion, eles querem realçar suas particularidades e origens através de suas roupas e visuais.

A liberdade do ser, que é algo muito discutido atualmente, possibilita a heterogeneidade de estilos nos gramados da Cidade do Rock. E a moda, enquanto instrumento de personalidade que acompanha os costumes, ressalta a mistura de gostos no RIR. Que não só diz muito sobre o como é o Brasil, mas abraça as tendências tradicionais (soft rock) e inclui o que está chegando de novo.

Imagem/Reprodução
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De fato, quem for ao Rock In Rio 2022 poderá encontrar estilos do soft rock ao dopamine dressing, já que a criatividade e ousadia serão as atrações principais do maior festival do Brasil. Irá encontrar também looks monocromáticos, com uma pegada solar e mais descontraída.

Agora, se o festival irá quebrar mais recordes com este ano, não sabemos! O que tenho certeza é que daqui alguns anos teremos uma estética ou estilo patenteado pelo Rock In Rio, anunciado pelo universo da moda e abraçado novamente pelo público.

Por Keven Souza e Júlia Thais 

A moda é um documento que acompanha e registra a trajetória de um povo. Desempenha papéis importantes na sociedade. É por meio das indumentárias que realçamos significados que dizem quem somos e de onde viemos, sendo importante, ainda, expressarmos mediante ao que usamos. E na periferia essa premissa não é diferente! 

É por meio de origem, trajetória e estilo de vida que se evidencia a moda presente nas favelas da sociedade brasileira. O estilo periférico, como se nomeia as roupas vestidas por quem mora em uma área à margem da cidade, tipifica a vestimenta de quem vive ali e parte de um lugar singular e perene, da arte.

Esse estilo de roupa tende a valorizar narrativas e anseios de quem o veste, e, acima de tudo, dá palco para diversidade, acessibilidade e tamanha personalidade. O que o difere da alta moda e do universo fashion luxuoso. “O que é muito comum nas regiões periféricas é possuir algumas características que nos trazem a proximidade com o grupo ao qual estamos inseridos. O mais presente nas pessoas dessa região demográfica é o sentimento de pertencimento. Então, quando analisamos superficialmente, acreditamos que todas se vestem igual, mas na verdade elas criam suas próprias narrativas das suas vivências individuais e em grupos”, explica o stylist e fashion designer, Pedro Birra. 

Retrata, ainda, costumes e comportamentos de minorias e preenche, ao longo do tempo, lugar imprescindível na vida das pessoas do gueto. E é com esses pontos que o estilo está, também, presente no lugar mais alto da favela: na laje! 

A laje é símbolo que muito diz da força, dos laços e dos saberes dos moradores da favela. É um espaço onde se pode construir e reverberar costumes sociais, culturais e considerar ações pontuais no tempo ocioso.  E a partir daí surge o churrasco na laje. 

O churrasco na laje é uma forte tradição que se estabeleceu em todo o Brasil, especialmente em camadas mais pobres da sociedade, que caracteriza ideais e costumes dos moradores. Um evento que traz peças e estilos de roupas plurais que remetem a descontração, a alegria e o calor nesse momento de lazer. É o que afirma Pedro. “O churrasco na laje, assim como outros eventos presentes neste determinado grupo (moradores da periferia), é uma forma de diversão e para esse tipo de encontro a produção passa primeiro pelo conforto, então shorts, chinelos, são muito bem vindos”, diz. 

Pessoas no churrasco na laje. Foto: Jessi Goes.

Dito isso, listamos algumas peças comuns vistas no churrasco na laje. A primeira delas é a camisa de time de futebol. A periferia tende a valorizar a figura da celebridade do futebol, enxergando nesses indivíduos uma representatividade da comunidade, pelo simples fato do jogador de futebol ter nascido lá. 

Outra peça carimbada do estilo da periferia e no churrasco na laje é o short jeans. Não há uma peça que esteja mais presente na vida do brasileiro, do que os shorts jeans. Usado desde ocasiões mais informais, até em lugares que pedem algo mais elaborado.

Lado a lado ao short jeans, o chinelo Havaianas (que nem sempre é da Havaianas), possui sua relevância no momento de lazer. O calçado sintetiza a simplicidade, uma atitude de relaxamento, de verão, de praia, um estado de espírito do Brasil. Por isso, tem sempre alguém usando-o como parte de um look ousado no churrasco na laje. 

Falando de ousadia, o biquíni de fita já é, quase, a irmã do shorts jeans, devido sua grande participação nos churrascos da periferia! Coloridos ou não, tradicionais ou ‘diferentões’, a técnica de pregar fitas nas partes íntimas em forma de biquíni ou sunga já é uma trend nas lajes. E com a indústria musical, popularizado para além da favela por Anitta no clipe de ‘Vai, malandra’, tal técnica já é marca registrada na moda da favela. 

A cantora está entre os artistas brasileiros que saíram da periferia e continua mostrando com clareza, roupas e práticas que são comuns nas comunidades. Em Vai Malandra, clipe gravado em 2017 no Morro do Vidigal, podemos encontrar o famoso bronze na laje, que faz parte da rotina de muitos moradores da periferia. 

Ludmilla, Anitta e Mc Cabelinho. Arte: Jessi Goes.

Com referência e muita representatividade, Ludmilla é outra artista que aposta em looks baseados na moda periférica. Nascida e criada em Duque de Caxias, a cantora e suas bailarinas no clipe Rainha da Favela, gravado em 2020 na Rocinha, Rio de Janeiro, trouxeram peças de roupas bastante comuns em churrascos na laje. E já o cantor e ator, Mc Cabelinho em seu videoclipe da música Little Hair, gravado no Morro da Caixa d’Água, com Felp 22 e Xamã, faz uma releitura do churrasco na laje, além do estilo visto no gueto. 

O fato é que o estilo periférico conquistou o seu lugar tanto no universo da moda quanto no meio artístico, e, desde então, possui interferência na indústria musical graças às suas características. Da mesma maneira que a indústria possui lugar referencial para quem sempre teve tão pouco acesso. E é neste movimento de conversão de influências que se completa um processo cultural, rico e cíclico, que se sobressai e se pode ver perfeitamente no churrasco na laje.

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Capacitismo no ambiente acadêmico dificulta relacionamentos, aprendizados e vivências de pessoas com deficiência 

Por Milena Vieira

Ativista feminista, mestranda no programa de pós-graduação em Comunicação Social da UFMG e criadora do blog “Disbuga”, Fatine Oliveira tem distrofia muscular e é cadeirante desde os oito anos. Trata-se, hoje, de importante voz sobre a experiência da mulher com deficiência, assim como em relação às atitudes e aos comportamentos preconceituosos dentro e fora do ambiente escolar. Ao longo dos anos, houve momentos em que Fatine foi infantilizada, submetida a olhares curiosos e a excessos de elogios, por fazer atividades normais ou impedida de participar de exercícios coletivos por não serem aptos às suas necessidades. 

À forma de Fatine, milhões de brasileiros lidam, todos os dias, com situações capacitistas. O capacitismo pode ser definido como toda forma de discriminação contra as pessoas com qualquer tipo de necessidade especial, seja ela física, seja auditiva, visual, mental e/ou múltipla. Tal comportamento nasce de um sistema excludente, opressivo e preconceituoso, no qual se enxerga a diferença como tradução de indivíduos incapazes de pensar por si mesmos e de atuar em sociedade. Revela-se no cotidiano, sobretudo nos meios acadêmico e profissional, por vezes inconscientemente, como em falas ou atitudes que expõem sentimentos de pena, proteção excessiva e/ou inferioridade, o que afeta violentamente a vida desses cidadãos.

Em uma sociedade, tudo que está fora ao que é posto como “padrão normal” pode sofrer preconceito e discriminação. Pessoas que não aderem às “normas” costumam ser invisibilizadas, marginalizadas e pouco aceitas nos espaços sociais, seja de maneira óbvia e transparente, seja de forma velada e não explícita.

No ambiente acadêmico, onde muitos indivíduos passam grande parte de seu tempo, as pessoas aprendem, ensinam, trocam experiências, constroem laços e memórias, além de lidar com as diferenças. Para que isso aconteça, é preciso que tal espaço seja inclusivo e acessível a todos. 

Segundo Welder Rodrigo Vicente, líder do Núcleo de Apoio Psicopedagógico e Inclusão (NAPI) do Centro Universitário UNA, é determinado por lei que escolas e universidades tenham adaptações em seus ambientes, o que inclui materiais e metodologias, para que atendam às pessoas com deficiência (PCDs), tanto alunos quanto professores e funcionários.

“O NAPI foi pensado, inicialmente, para atender uma demanda de inclusão, a partir do movimento dos alunos com deficiência, principalmente auditiva, realizado no final de 2010, de forma mais intensa. A partir da necessidade do estudante surdo, viemos a olhar para outras necessidades. Se tenho 50 alunos com algum tipo de deficiência, tenho que atender aos 50; se não, não estarei incluindo”, destaca. 

De acordo com estudo feito pela plataforma QEdu, a partir de dados do Censo Escolar 2016, apenas 26% das escolas públicas e 35% das instituições particulares estão aptas, nas cidades brasileiras, à criação de ferramentas de inclusão e acesso, para que as pessoas possam ter um ensino de boa qualidade. 

Já para falar sobre processos inclusivos nas universidades, é preciso, antes, levar em consideração a desigualdade social, fruto do sistema capitalista e da falta de investimento nas áreas sociais, culturais, de saúde e educação. 

Fatine Oliveira, por exemplo, foi uma jovem estudante de baixa renda, e ressalta a importância de discutir o assunto: “Não posso, simplesmente, virar e falar que tive acesso, ou não tive. Quero que entendam que a deficiência não é o pior. Vários outros tópicos da questão social também são ruins. Não consegui entrar na faculdade por falta de acesso. A maioria das pessoas com deficiência pertence a classes baixas, o que interfere mais ainda em sua vivência. Muitas pessoas não conseguem ver a dificuldade estruturada na sociedade. É muito complicado não ter esse apoio político do governo” 

Além de todas as complicações para ingressar no meio escolar, as pessoas com deficiência são, por vezes, expostas a expressões capacitistas de todos os tipos, dos velados aos ostensivos. Uma das vertentes do capacitismo no ambiente escolar diz respeito ao momento em que as pessoas olham para aquelas com algum tipo de deficiência, enxergando-as como “coitadas”, “vulneráveis” ou “inocentes”.

No caso de crianças, aliás, todas são inocentes, e não só quando têm deficiência; no caso de jovens e adultos, eles acabam infantilizados. Deve-se pontuar que o capacitismo não acontece somente em situações ligadas ao corpo físico. Pessoas com deficiências não visíveis também são questionadas quanto à capacidade e à inteligência.

“Em minha vida acadêmica, só me incomodavam as pessoas que olhavam para mim fixamente. Às vezes, riam de mim e tiravam sarro, criticavam. A gente tem que passar por cima, mas havia coisas de que não gostava, mesmo. Eu ignorava, deixava para lá, pois tem coisas que precisamos superar”, conta Letícia Diniz, 22 anos, que tem Síndrome de Down e é estudante de Jornalismo no Centro Universitário UNA.

É possível que, em algum momento, qualquer um tenha presenciado ou feito declarações capacitistas. Frases do tipo “Dar uma de João sem braço”, “Você só pode ser retardado!”, “Está mais perdido do que cego em tiroteio”, dentre outras, são naturalmente usadas no dia a dia, sem que se considere o quanto reforçam a imagem da pessoa com deficiência como incapaz.

Outro gesto capacitista é tomar como superação os feitos de sucesso, esforços e conquistas realizadas por PCDs, a exemplo de frases como “Eu reclamando da vida e olha você aí, vivendo, apesar de tudo”, “Ela é tão inteligente, nem parece ser especial”, “Te acho tão guerreira por chegar até aqui”. A deficiência, porém, não impede a pessoa de alcançar seus objetivos. Exemplo disso são os Jogos Paraolímpicos, um dos maiores eventos esportivos do mundo a envolver PCDs, que mostram que qualquer indivíduo é capaz de descobrir (e superar) novos limites.

Em palestra sobre capacitismo, realizada na plataforma do YouTube, no canal TV FEC SC, Federação Espírita Catarinense, o pedagogo Eduardo Torto Meneghelli, mestre em educação, conta que, na Antiguidade, acreditava-se que os indivíduos que nasciam com alguma necessidade não agradavam aos deuses e não tinham alma. A deficiência era vista como castigo, e muitos acabavam abandonados, ou mortos, pelas próprias famílias.

Tal violência não acabou com o passar do tempo. No Brasil, em meio à pandemia, registrou-se crescimento de ataques contra pessoas com deficiência, sendo a maior parte vítima de familiares e conhecidos. Segundo Cleyton Borges, supervisor do Centro de Apoio Técnico da Delegacia de Polícia da Pessoa com Deficiência em São Paulo, o isolamento fez com que tais pessoas ficassem mais expostas. Ele reforça a necessidade de conscientização da população quanto às denúncias, que podem ser feitas, de qualquer parte do país, pelo Disque 100.

Discutir o capacitismo não é somente um dever das pessoas especiais. A conscientização é popular. Para cortar as raízes estruturais do preconceito, é necessário que todos estejam dispostos a se pôr em posição de escuta e aprendizado. Além disso, é vital cobrar do Estado a garantia dos direitos humanos, para que, então, seja construída uma sociedade em que todas as pessoas consigam viver dignamente. “Um caminho para aprender mais sobre as diferenças seria assumir uma postura de abertura, em que o olhar superasse os limites do conhecido e alcançasse a potência de novos aprendizados, que só o outro pode oferecer”, destaca Fatine Oliveira. 

Manifestação pelo direito das pessoas com deficiência em 2013, na cidade de São Paulo (foto: Danilo Verpa/Folha S.Paulo)

 

 

 

 

 

 

 

Conscientização nas redes

Desde o início da pandemia, nota-se crescimento de conteúdos produzidos nas redes sociais, em apps como TikTok e Instagram. Em consequência do isolamento social, o número de visualizações e engajamento tem tido aumento relevante, se comparado aos anos anteriores. Mais do que apenas conteúdos, alguns influenciadores têm conseguido abordar assuntos delicados e importantes por meio do humor.

É o caso da influenciadora digital e psicóloga Lorrane Silva, mais conhecida como “Pequena Lô”, diagnosticada com displasia óssea. Ela tem quase 10 milhões de seguidores em suas redes sociais, e, em vídeos humorísticos, aponta os problemas sociais enfrentados por pessoas com deficiência. Além de se divertirem, as pessoas acabam conscientizadas com o conteúdo. 

“O preconceito ainda está longe de acabar. Muitas pessoas têm um pensamento muito fechado. Estou na internet para mudar essa visão em relação a nós, pessoas com deficiência. Quando comecei, impactou muito. Uma pessoa com deficiência, que dança, faz humor, formada em psicologia, não é todo dia que a gente vê. As pessoas com deficiência não ficam reunidas em um só lugar, mas, hoje, conheço muitas que estão na internet, pondo a cara à tapa para apresentar essas informações”. 

Origem do “capacitismo”

A palavra capacitismo é a tradução do inglês “ableism”, que, em português, significa “capaz”. Segundo a BBC, o termo foi usado, pela primeira vez, nos Estados Unidos, na década de 1980, e era mais conhecido dentro de organizações políticas pelo direito à igualdade. No Brasil, apesar de também existirem movimentos ativistas de pessoas com deficiência pela reivindicação de seus direitos, desde os anos 1980, o termo se popularizou em 2016, quando um grupo de jovens com deficiência se reuniu nas redes sociais e criou a hashtag #ÉCapacitismoQuando, com o objetivo de ampliar a discussão sobre a discriminação contra pessoas com deficiência. É importante que exista a denominação do preconceito, para que ele seja exposto e confrontado. 

Nas telas

Confira dicas de filmes e seriados que retratam a vivência de pessoas com deficiência e os efeitos de uma sociedade capacitista 

The Good Doctor (O bom doutor)

A série tem como protagonista Shaun Murphy, jovem autista formado em medicina, que sonha em ser cirurgião e tem suas habilidades questionadas e postas à prova o tempo todo, por colegas e superiores, após começar a trabalhar em um hospital famoso.

Extraordinário
O filme narra a história de Auggie Pullman, garoto de 10 anos, que nasceu com uma deformidade genética no rosto e precisou passar por 27 cirurgias plásticas. Com o apoio da família, Auggie começa a frequentar a escola pela primeira vez. 

Hoje eu quero voltar sozinho

Um romance brasileiro. Conta a vida de Leonardo, jovem estudante do ensino médio com deficiência visual. Aborda os desafios para a inclusão e os questionamentos sobre a própria sexualidade, após o protagonista conhecer Gabriel, novo aluno da escola.